Os ciclistas e as escadarias do Metrô de São Paulo (e do mundo)

No Metrô de São Paulo, os ciclistas são obrigados a carregar a bicicleta nas costas por vários lances de escada. Não é permitido usar as escadas rolantes, nem os elevadores. Veja o que têm a dizer os ciclistas e o presidente do Metrô – e saiba como são as regras em outros países.

Cinco anos atrás, comemoramos com surpresa a notícia de que o Metrô de São Paulo e a CPTM passariam a permitir a entrada de bicicletas em determinados dias e horários. Logo no primeiro fim de semana, mais de 600 ciclistas utilizaram os vagões das duas companhias.

De 2007 para cá, pouca coisa mudou. Os dias e horários continuam basicamente os mesmos (veja: Metrô/CPTM). Ainda há problemas eventuais com dobráveis em qualquer horário, dependendo mais da boa vontade do funcionário do que de um regulamento claro. E, principalmente, a unânime reclamação entre os ciclistas: ter que carregar a bicicleta nas escadarias intermináveis.

O pagador de promessas

Agora, com a estação Butantã, dá para ir de Metrô até a Ciclofaixa de Lazer nos finais de semana. Resolvi aproveitar e ir com meu filho, de 9 anos. Saímos da estação Praça da Árvore (linha azul) e seguimos até a Luz para pegar a Linha Amarela. Na teoria, tudo muito bonito, mas tem um problema: eu tinha que carregar as bicicletas nas escadarias.

Infrator na esteira rolante.

Meu filho não aguenta o peso da bicicleta dele, que tem quadro de aço, e a minha é bastante pesada por causa do alforge. Mas tive que me virar para carregar as duas. Ele carregando o alforge na escada rolante e eu com uma bicicleta em cada braço, rezando pra não tropeçar na escadaria. O peso somado das duas bicicletas ficava em torno dos 30kg.

E como as estações da Linha Amarela tem escadas, hein? Na Luz já tive que descer umas três ou quatro escadarias para chegar na plataforma, mas nem imaginava o que me esperava na estação Butantã. Devem ter sido uns cinco lances bem longos.

Eu tinha que parar para descansar no final de cada trecho. Cheguei na saída do Metrô transpirando. Sem exagero: suei e me cansei bem mais carregando as bicicletas na ida e na volta do que pedalando os mais de 30km que percorremos naquele dia. No total, entre subir e descer, carreguei as duas bicicletas por mais de vinte lances de escada. VINTE. Com 30kg nas costas. E se eu desequilibrasse?

Reclamação unânime

Carregar as bicicletas nas escadas não é nada fácil. E quanto mais pesada a bicicleta, maior o sofrimento. Inúmeras vezes preferi pedalar um trecho longo, mesmo cansado, tarde da noite, para não ter que ficar carregando a bicicleta nas escadas.

O Maurício Alcântara, do projeto Coletivas, contou quantos degraus teve de subir com a bicicleta nas costas, em seu trajeto no Metrô: o equivalente a 15 andares. É pra desanimar qualquer um.

E o problema se agrava em situações como a de David Rissato Cruz, de 35 anos: “Tenho desvio de coluna. Subi a escada do metrô uma vez com a bike nas costas e fiquei 4 meses detonado. Meu tratamento de RPG regrediu praticamente 8 meses por conta desse incidente”. David precisou até se afastar da bicicleta por algum tempo depois disso, mas já voltou a pedalar para o trabalho.

Muitos ciclistas já sugeriram ao Metrô a instalação de canaletas nas laterais das escadas  (como as da passarela que dá acesso à Ciclovia Rio Pinheiros, na estação Vila Olímpia da CPTM). Mas ao Waldson Gutierres, por exemplo, a companhia respondeu que as escadas foram projetadas para dar vazão às pessoas em situação de emergência e não poderiam ter sua largura diminuída.

Pesquisando um pouco no Google é possível encontrar muitas reclamações de outros ciclistas. Teve até quem já foi obrigado a carregar a dobrável nas escadarias, mesmo dobrada. Depende do tamanho da síndrome de pequeno poder do funcionário responsável no momento em que você entra na estação.

A justificativa do Metrô para nos obrigar a carregara bicicleta nas costas é que levá-la na escada rolante é perigoso. Mas, como disse a Sabrina Duran: “É difícil acreditar que quem instituiu essa norma tenha experimentado fazer o teste entre a escada rolante e a comum para mensurar os riscos entre uma e outra. A escada comum é, sem sombra de dúvidas, a que oferece maior probabilidade de acidentes”.

Como funciona lá fora

Muitos sistemas de Metrô nos Estados Unidos permitem o uso dos elevadores. Em Washington, por exemplo, os ciclistas são proibidos de usar as escadas, sejam normais ou rolantes, sendo obrigatório o uso dos elevadores.

Em San Francisco, os ciclistas também podem usar os elevadores. As escadas rolantes são proibidas, mas essa proibição pode estar com os dias contados, já que a companhia BART (Bay Area Rapid Transit) realizou um estudo há alguns anos e concluiu que “escadas rolantes e escadarias são igualmente seguras para uso dos ciclistas”.

Madrid (Espanha) permite transportar a bicicleta em elevadores, escadas rolantes e passarelas móveis. Tudo pode, tudo funciona e todo mundo fica feliz. Países como Alemanha, Áustria e República Tcheca permitem o uso de elevadores ou possuem canaletas/rampas nas laterais das escadas, algumas com esteiras automatizadas.

Na Holanda e na Dinamarca, canaletas nas escadarias são comuns:

Em Tóquio e Kyoto, essas canaletas são automatizadas, carregando a bicicleta por você escada acima. Basta segurá-la enquanto você acompanha andando ao lado dela:

Para passar por esse túnel em Roterdam (Holanda), dezenas de milhares de ciclistas usam escadas rolantes convencionais diariamente, para subir e para descer, desde os anos 40!

Há muitas soluções para subir e descer com bicicletas nos Metrôs de todo o mundo. Mas obrigar os ciclistas a carregá-las nas costas, mesmo tendo as opções de elevadores e escadas rolantes, é algo que só se vê aqui. O ponto em comum é o uso de elevadores.

Com a palavra, o presidente

A Sabrina Duran, do blog Na Bike, entrevistou o presidente do Metrô, Sergio Avelleda. A entrevista – ótima, por sinal – segue abaixo, em vídeo.

Antes, cabe um comentário. Como Avelleda conta na entrevista, não é de hoje que ele usa a bicicleta como transporte. Em 2009, quando presidente da CPTM, ele me convidou para conhecer a Ciclovia Rio Pinheiros, que ainda não havia sido inaugurada. Conversei com ele ao longo de todo o trajeto de 14km, ambos pedalando. Junto conosco, dois ciclistas da polícia ferroviária – parte de uma equipe que faria rondas em bicicleta pela ciclovia o tempo todo, mas hoje não vejo mais por lá.

Naquela época, ele estava começando a usar a bicicleta em seus deslocamentos. Algumas vezes por semana utilizava a ciclovia em toda sua extensão. O André Pasqualini o acompanhou nas ruas diversas vezes, ajudando a estimular o hábito e passando dicas de condução segura. O cara realmente usa a bicicleta, não é papo para cativar ciclista. Mesmo que não use todos os dias, usa com frequência suficiente para saber as dificuldades e as delícias que passamos com a bicicleta por aí.

Avelleda parece disposto a resolver a questão, mas depende de pareceres técnicos que comprovem a questão da segurança para poder atuar. Espero que os responsáveis por essa pesquisa técnica percebam as soluções adotadas com sucesso em outros países e resolvam com rapidez essa situação, pela qual estamos literalmente cansados de passar.

Ajude a mudar essa situação

O que podemos fazer? O melhor caminho, nesse momento, é entrar em contato com a Ouvidoria do Metrô. Envie sua mensagem, dizendo o quanto é cansativo, dolorido e arriscado carregar a bicicleta nas escadas. Explique por que não dá para ficar carregando 15, 20, 30kg nas costas escada acima por vários andares.

Entre em contato com a ouvidoria do Metrô, registre sua queixa e dê suas sugestões para melhorar o atendimento ao usuário ciclista. A mudança que queremos ver no mundo depende cada um de nós.

Já sofreu carregando a bicicleta na escadaria do Metrô? Conta pra gente aqui nos comentários.

65 comentários em “Os ciclistas e as escadarias do Metrô de São Paulo (e do mundo)

  1. Eu posso utilizar as estacoes como passarela? Em um horário q não seja permitida a entrada? Tipo a estação Belém, tamanduateí etc?
    Lembrando q não vou passar da catraca pra dentro, só vou ultiliza-las como passarelas de um lado da linha férrea para outro lado.

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    1. Eu acredito que sim, Carlos, se você não passar pela catraca e embarcar, você não é propriamente um usuário, mas mais um pedestre (desmontado da bicicleta) se deslocando de um ponto a outro, mesmo que as passarelas façam parte e sejam de responsabilidade do Metrô.

      Mas não custa nada se precaver, né?, tendo certeza disso, ou através da Central de Informações (tel. 0800-7707722) ou, melhor ainda, conversando com funcionários das estações que você mencionou.

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  2. Adoro esse tipo de matéria: http://vejasp.abril.com.br/materia/bike-bicicleta-no-metro-de-sao-paulo Serviço de utilidade pública com todas as letras, principalmente praaquele que “nunca esteve lá” mas que precisaria ou gostaria de estar. Tá, talvez um ou outro senão no conteúdo, mas nada que comprometa.

    Olha… invariavelmente penso nisso, em como pecam nossos sistemas de informação. Eles parecem ser concebidos pra quem não precisa informar-se, e não pro marinheiro de primeira viagem. Ou praqueles com algum distúrbio nato de orientação como eu…rs. (Putz, por isso que tenho horror a shopping, a falta de uma sinalização mais ostensiva, aliada àquela arquitetura proposital de te obrigar a circular de olho nas vitrines… é de me dar náusea.)

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  3. Não entendi uma coisa: por que essa conversa sobre não deixarem usar a escada rolante para subir com a bike? Cito o Regulamento do Metrô para Ciclistas, disponível aqui (http://www.metro.sp.gov.br/pdf/pedalar-sp/pedalar-sp-regulamento-metro-ciclista.pdf) e achado nessa página (http://www.metro.sp.gov.br/sua-viagem/bicicletas/index.aspx).

    Na segunda página, lê-se claramente que “nas escadas rolantes o transporte é permitido [embora] somente para subir.” Acho que isso já deve facilitar muito o transporte da bike, já que é mais fácil descer com a bike pela escada fixa do que subir…

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  4. Vamos fazer um projeto de lei autorizando os ciclistas a usarem o elevador, claro que mantendo a prioridade aos deficientes, gestantese cadeirantes, que tal?

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