Manobra de vereadores “revota” projeto que garantia recursos para Plano Diretor Cicloviario de Porto Alegre

Vereadores tentam impedir que a prefeitura de Porto Alegre utilize cerca de R$ 6 milhões anuais para tornar a vida dos ciclistas mais segura. Saiba como ajudar a pressioná-los.

Dezessete vereadores da base aliada da Prefeitura de Porto Alegre votaram contra o projeto que garantia recursos para o PDCI. Crédito: reprodução/facebook
Dezessete vereadores da base aliada da Prefeitura de Porto Alegre votaram contra o projeto que garantia recursos para o PDCI. Imagem: reprodução/facebook

Na segunda-feira, 12 de maio, a Câmara de Vereadores de Porto Alegre votou novamente o projeto de lei 035/12, de autoria do vereador Marcelo Sgarbossa (PT), que previa a criação de um fundo gestor para os recursos do Plano Diretor Cicloviário Integrado (PDCI) da capital gaúcha. Esse mecanismo permitiria administrar os recursos advindos de um dispositivo que obriga a prefeitura de Porto Alegre a aplicar 20% do montante arrecadado em multas na construção de ciclovias e na realização de campanhas educativas. O projeto também determinava que a constituição do conselho responsável pelo fundo seria paritário, ou seja, teria o mesmo número de representantes da sociedade civil e do Poder Executivo.

Há um mês, em 14 de abril, o projeto teve votação simbólica e foi aprovado, mas o vereador João Carlos Nedel (PP), da base aliada ao governo, não concordou com a votação, e já na discussão de outra pauta disse que havia pedido que a votação fosse nominal e não foi ouvido pelo presidente da Câmara, Professor Garcia (PMDB), também da base aliada. A situação foi analisada pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, que permitiu que o projeto fosse novamente votado. Como dessa vez havia ampla maioria governista presente na sessão, o projeto não foi aprovado.

A prática vai contra o próprio regimento interno da casa, pois permite que qualquer grupo de vereadores descontentes com determinado resultado de votação peça que o projeto seja votado novamente, com tempo para que haja manobras e novas discussões e lobbies para defender determinadas ideias. No caso desse projeto, isso pode representar o fim dos recursos assegurados para a construção de infraestrutura cicloviária e investimentos em educação para um trânsito menos letal.

Agravante

Na próxima segunda-feira, 19/05, o golpe dado nos usuários da bicicleta de Porto Alegre terá um novo capítulo: poderá ser votado outro projeto, dessa vez do Executivo, o PLCE 010/13, que também cria um fundo gestor do PDCI, porém suprimindo o uso de 20% das multas como fonte de recursos para o plano e fazendo com que seu conselho gestor seja formado por apenas dois representantes da sociedade civil e outros cinco da própria prefeitura. Isso aumenta as chances de que qualquer discordância com o destino dos recursos presentes no fundo – nesse caso derivado apenas de contrapartidas financeiras à realização de grandes obras que requeiram alterações viárias – seja rechaçado pelos representantes da prefeitura sem perigo de serem minoria.

Por causa dos constantes conflitos com cicloativistas e entre os próprios vereadores da base – dos quais alguns representantes, como o peemedebista Valter Nagelstein, já anunciaram que votarão contra o governo -, o projeto da prefeitura já conta com 17 emendas, sendo uma delas a indexação do valor de investimentos a 20% das multas, mas com recursos retirados do orçamento municipal, o que a própria prefeitura já alegou ser inconstitucional quando brigou (e perdeu), na justiça, pelo não cumprimento da lei vigente.

Prefeitura nunca cumpriu sua própria lei

A questão dos 20% das multas é um dos pontos mais polêmicos entre a prefeitura e grupos de cidadãos em Porto Alegre. O dispositivo que garante esses recursos foi resultado de uma emenda apresentada em 2009 pela própria base governista, de autoria do então vereador Beto Moesch (PP), para se certificar da realização da recém-aprovada lei que instituía o Plano Diretor Cicloviário. No entanto, a lei nunca foi cumprida integralmente.

A prefeitura de Porto Alegre deveria ter destinado um total de R$ 10.865.138,20 somente nos primeiros três anos, mas utilizou, respectivamente, apenas 5,71%, 8,71% e 8,98% do montante devido. Boa parte dos 20,5 km de ciclovias já implantadas na cidade, além de outros quase 30 km prometidos até o fim de 2014, vem não de recursos gerados pelo município, mas de contrapartidas privadas e recursos do PAC Copa, que complementariam a aplicação dos 20%.

Além de não utilizar o montante devido, a Prefeitura chegou a alegar na Justiça que a própria lei que criou era inconstitucional, mas perdeu duas vezes, pois, tecnicamente, recursos de multas não fazem parte do orçamento.

A segunda ocorrência vitimou a jovem Daise Lopes, atropelada depois de ser derrubada pela lateral do ônibus. Foto: reprodução/internet
A jovem Daise Lopes morreu em março de 2014 em Porto Alegre, atropelada depois de ser derrubada pela lateral de um ônibus na zona Norte da cidade. Foto: reprodução/internet

Menos educação, mais mortes

Além de não utilizar integralmente os recursos devidos na construção de ciclovias, desde a criação do PDCI a prefeitura nunca realizou uma campanha massiva voltada à educação no trânsito para a convivência entre pedestres, ciclistas e motoristas. Essa negligência tem custado vidas, algumas delas tiradas pelos próprios motoristas de ônibus que prestam serviço à prefeitura e que só agora estão recebendo formação voltada à convivência com ciclistas nas ruas. Para que isso ocorresse, precisou haver as mortes das estudantes Patrícia Figueiredo e Daise Lopes.

A pressa dos vereadores que querem impedir que a prefeitura deixe de utilizar cerca de R$ 6 milhões anuais (valor quase insignificante em um orçamento que beira os R$ 6 bilhões, mas que ainda assim pode evitar tragédias) pode custar a vida de quem insiste em ter a liberdade de escolher seu próprio meio de transporte.

Mobilização

Há meses, diversos grupos e coletivos de usuários da bicicleta na capital gaúcha, como a Mobicidade e a ACPA, estão mobilizando a população, veículos de comunicação e os vereadores para a importância do cumprimento do PDCI não só na questão das ciclovias, mas também pelo uso dos recursos disponíveis para a realização de campanhas educativas, que poderiam ter poupado as vidas perdidas e humanizado o violento trânsito de Porto Alegre.

Se você quiser participar dessas reivindicações, pode escrever para os 17 vereadores que votaram contra o PL 035/13 e conclamá-los a não aprovar o projeto do Executivo sem que haja a garantia dos 20% vindos diretamente das multas de trânsito. Afinal, ser contrário a essa aplicação significa contribuir indiretamente para que ciclistas continuem morrendo nas ruas da cidade.

São eles:

Airto Ferronatoferronato@camarapoa.rs.gov.brPSB
Alceu Brasinhabrasinha@camarapoa.rs.gov.brPTB
Any Ortizanyortiz@camarapoa.rs.gov.brPPS
Cassio Trogildocassiotrogildo@camarapoa.rs.gov.brPTB
Delegado Cleitondelegadocleiton@camarapoa.rs.gov.brPDT
Elizandro Sabinoelizandrosabino@camarapoa.rs.gov.brPTB
Guilherme Socias Villelavillela@camarapoa.rs.gov.brPP
Idenir Cecchimidenircecchim@camarapoa.rs.gov.brPMDB
João Carlos Nedeljoaocnedel@camarapoa.rs.gov.brPP
Kevin Kriegerkevinkrieger@camarapoa.rs.gov.brPP
Marcio Bins Elybinsely@camarapoa.rs.gov.brPDT
Mario Manfromariomanfro@camarapoa.rs.gov.brPSDB
Mônica Lealmonicaleal@camarapoa.rs.gov.brPP
Nereu D’Avilanereudavila@camarapoa.rs.gov.brPDT
Paulo Brumpaulobrum@camarapoa.rs.gov.brPTB
Reginaldo Pujolpujol@camarapoa.rs.gov.brDEM
Waldir Canalwaldircanal@camarapoa.rs.gov.brPRB

3 comentários em “Manobra de vereadores “revota” projeto que garantia recursos para Plano Diretor Cicloviario de Porto Alegre

  1. logico que nao assinaram
    somos nos que estamo morrendo
    quando morrer um parente filho deles a eles vao aprovar qualquer leis que protejam os ciclistas

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  2. Um verdadeiro absurdo. O atual presidente da EPTC pode enfrentar problemas pela não aplicação dos 20% das multas que ainda é lei (improbidade administrativa). A solução que ele encontrou é revogar a lei ao invés de tentar cumpri-la.

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