Foto: Willian Cruz

Como passar as marchas da bicicleta

As marchas ainda são um mistério para muita gente, que acaba sofrendo desnecessariamente nas subidas. Veja como utilizá-las, de forma simples e esclarecedora.

Foto: Willian Cruz
Foto: Willian Cruz

Uma dúvida que assola os iniciantes é como passar as marchas de forma correta. Este artigo tenta esclarecer essa questão, em linguagem simples e clara.

Nas bicicletas que têm engrenagens de marchas apenas na roda traseira – ou marchas internas, dentro do cubo (eixo) – não há muito segredo: um único passador é responsável pela mudança e é fácil perceber se a bicicleta está ficando “leve” ou “pesada”, o que torna a passagem de marchas bastante intuitiva.  Entretanto, quando há passadores dos dois lados do guidão, muita gente acaba se confundindo. Não se preocupe, isso é normal. Estamos aqui para te ajudar.

A explicação contida neste artigo é detalhada. Se não tiver paciência de ler tudo, pule direto para o box azul escrito Resumo, ali no meio da página.

Passador Revoshift. A parte bojuda é rotacionada com a mão para fazer a passagem de marcha.
Passador Revoshift. A parte bojuda é rotacionada com a mão para fazer a passagem de marcha.

Passadores

Em bicicletas que tenham apenas câmbio traseiro, há um único passador, geralmente no lado direito do guidão. Quando a bike tem câmbio dianteiro e traseiro, há dois passadores: um no lado esquerdo do guidão e outro no lado direito. Na esquerda, você tem sempre duas ou três posições; no lado direito, a quantidade varia de acordo com a quantidade total de marchas que você tiver (multiplique um número pelo outro para saber o total de marchas da sua bicicleta).

Sistema rapid-fire. Em destaque, a alavanca utilizada com o indicador. A alavanca do polegar fica embaixo do conjunto.
Sistema rapid-fire. Em destaque, a alavanca utilizada com o indicador. A alavanca do polegar fica embaixo do conjunto.

Os passadores podem ser de alavanca simples, duas alavancas (rapidfire,  EZ-fire, trigger shifter) ou de girar (grip shift, Revoshift).

Nos de alavanca simples, há uma única alavanca pequena que, conforme movida para um lado ou outro, aumenta ou diminui de marcha. Algumas bicicletas de estrada mais antigas têm essa alavanca no quadro, mas é um modelo pouco comum hoje em dia.

Os de alavanca dupla ou rapid-fire/EZ-fire têm alavancas separadas para aumentar e para diminuir, dispostas estrategicamente perto dos dedos indicador e polegar, de forma que você suba a marcha com um dedo e desça com o outro, tornando a passagem mais simples, rápida e eficiente.

O sistema Revoshift ou grip-shift  é formado por uma cobertura giratória próxima à manopla, que envolve parte do guidão e aumenta ou diminui a marcha conforme girada.

Simples ou indexado

O sistema de câmbio pode ainda ser simples ou indexado. Os sistemas rapid-fire/EZ-fire são sempre indexados; os outros sistemas podem ser indexados ou não.

No câmbio indexado, conforme você troca de marcha nos passadores, a corrente “passa” para o lugar exato onde ela deve estar para que a próxima marcha entre e ouve-se um “clique”.

Já nos sistemas mais simples, é você quem tem que acertar o ponto da corrente para ela entrar na posição correta. Você saberá que ainda não está na posição correta se estiver fazendo barulho, enroscando, etc. A experiência de usar um sistema desses costuma ser bastante ruim.

O sistema indexado geralmente é mais vantajoso, mas precisa estar sempre regulado. Quando o câmbio desregula, ainda que milimetricamente, a passagem de marchas se torna difícil e às vezes a marcha não entra. O sistema se desregula com o uso, isso é normal, mas os conjuntos mais modernos levam mais tempo para desregular e tem a regulagem simplificada, podendo ser ajustados sem ferramentas e até mesmo sem parar a bicicleta, com dispositivos junto aos passadores.

Quando o mecanismo desregula, as marchas não passam corretamente e ficam “arranhando”, ou ficam pulando de uma posição para outra enquanto você pedala, o que pode até ocasionar uma quebra da corrente.

A maioria das mountain bikes tem três coroas, o que significa três posições possíveis para o câmbio dianteiro.
A maioria das mountain bikes tem três coroas, o que significa três posições possíveis para o câmbio dianteiro.

Passando as marchas

O passador do lado esquerdo move o câmbio dianteiro, que são as marchas das coroas – engrenagens que ficam no pedivela (onde se pedala). Elas têm esse nome porque se assimilam a uma coroa. A semelhança é remota, admito: parecem-se mais com coroas de espinhos do que com coroas de jóias. 🙂

No lado direito, move-se o câmbio traseiro, que chamamos também de catraca ou cassete (pronuncia-se K7). Há uma diferença técnica entre esses dois termos, mas ela não importa agora: qualquer dos dois que você usar, será entendido. Alguns ciclistas mais antigos chamam também de pinhão.

A ordem da passagem das marchas não é sequencial. Há uma sequência lógica, mas parece ser meio misturado mesmo. Para os exemplos abaixo, usei uma relação típica de 21 marchas, a mais encontrada no mercado, mas mesmo que sua bicicleta tenha uma quantidade diferente de marchas, você entenderá os exemplos.

A ordem correta para passar as marchas em um bicicleta de “21 velocidades”, em termos de esforço crescente, é a que está listada abaixo. Considere o primeiro número de cada par como a marcha da frente (a da coroa, geralmente do lado esquerdo do guidão) e o segundo como a de trás (catraca). Em ambos os casos, a marcha 1 é a mais leve (em algumas bicicletas, vem marcada com um L, que representa “low” – baixa).
1-1 / 1-2 / 1-3 / 2-2 / 2-3 / 2-4 / 2-5 / 2-6 / 3-5 / 3-6 / 3-7

Mas não tente decorar! Você vai perceber aos poucos qual a melhor passagem de marchas. Vai entender, por exemplo, que a 2-2 é realmente mais “pesada” para pedalar que a 1-3. Você pega isso na prática e acaba se tornando instintivo, por enquanto é só entender que elas são um pouco “misturadas”.

Resumo

O melhor mesmo é entender que marcha leve de um lado combina com marcha leve do outro!

1 na frente, 1 ou 2 atrás
2 na frente, 2 até a penúltima marcha na direita
3 na frente, duas últimas marchas atrás

É bem mais fácil de lembrar e funciona bem. Você usa a 1 e a 2 na direita com a 1 na esquerda, depois passa a esquerda pra dois e vai subindo a direita até a 6, depois muda a esquerda para 3 e depois usa a última na direita. Aos poucos você vai fazendo as variações, conforme pegar o jeito.

Se ainda assim estiver muito complicado, coloque a corrente na coroa do meio e mantenha ela ali, trabalhando apenas com o câmbio traseiro, até se acostumar.

Devo me preocupar com isso?
Segundo a Shimano, não. Se estiver com um grupo de componentes de sua fabricação, bem regulado e devidamente montado na bike (compatível, ajustado, etc.), o ciclista pode utilizar todas as marchas de sua bicicleta, sem se preocupar com o câmbio cruzado. O importante é evitar as marchas pesadas nas subidas e as marchas leves nas descidas.

Câmbio cruzado

Existem algumas combinações de marchas que evitamos, para não forçar o mecanismo: repare que se você colocar a 3 na esquerda e a 1 na direita, ou a 1 na esquerda e a 7 na direita (ainda no nosso exemplo de 21 marchas), a corrente fica muito esticada e um pouco torcida, desalinhada em relação ao quadro. Em alguns casos, ela fica até fazendo barulho, por roçar no mecanismo do câmbio dianteiro. Isso é o que chamamos de câmbio cruzado.

Essas posições forçam o conjunto todo e exercem uma pressão lateral para a qual, em muitos casos, a corrente não foi projetada para suportar. Como resultado, há desgaste prematuro do conjunto e em alguns casos até quebra da corrente. Evite as seguintes combinações: 1-6, 1-7, 3-1 e 3-2 (novamente tendo como base 21 marchas), ou seja, as duas combinações mais extremas de cada ponta. Se puder evitar também o 2-1 e o 2-7, também ajuda.

Quer dizer então que eu comprei uma bicicleta com 27 marchas mas não devo usar todas? Exatamente. A quantidade total de marchas representa apenas a quantidade de combinações possíveis, mas na prática não é recomendável usar todas. E, sinceramente, você não sentirá falta alguma dessas combinações. Não porque 27 ou mesmo 21 marchas sejam demais, mas sim porque o que importa são os limites máximo e mínimo de esforço/velocidade na pedalada. A combinação mais pesada em uma relação de 27 permitirá velocidade maior que a combinação similar de uma de relação de 18 – e a mais leve é *bem* melhor para as subidas em uma 27 do que em uma 18.

Passando mais de uma marcha por vez

Alguns sistemas permitem ao ciclista passar mais de uma marcha por vez. Isso deve ser feito apenas no passador da direita (câmbio traseiro), tanto para diminuir quanto para aumentar a marcha. Alguns câmbios indexados do tipo rapid-fire permitem fazer a mudança de duas em duas ou até de três em três marchas na relação traseira, com uma pressão mais forte do polegar.

Não é recomendável fazer isso na marcha dianteira (esquerda), senão a corrente pode enroscar no mecanismo ou até cair para fora das coroas.

Subidas

Nas subidas torna-se mais difícil passar a marcha, porque você está fazendo uma força de tensão maior na corrente ao pedalar. Isso dificulta ao mecanismo passá-la para outra posição, principalmente no câmbio dianteiro. A corrente “gruda” na coroa em que está: se estiver na frente, vai ficar fazendo barulho sem sair do lugar; atrás, mudará com um estalo, com impacto prejudicial na corrente.

Para facilitar essa passagem, pedale um pouquinho mais forte antes de fazer a passagem e, então, diminua a força que você está aplicando na pedalada enquanto faz a passagem, para fazê-lo girando mais leve, sem muita tensão na corrente. Para quem dirige automóveis, é mais ou menos o mesmo conceito da passagem de marchas em um carro, em que para subir a marcha você primeiro acelera um pouco, para então aliviar a aceleração enquanto pisa na embreagem e faz a passagem. Na verdade, usando essa técnica em um bom e velho Fusca você consegue até passar a marcha sem pisar na embreagem! 🙂

163 comentários em “Como passar as marchas da bicicleta

  1. O médico recomendou que eu ande de bicicleta! Estou com 58 anos! No meu tempo de garoto usava muito aquelas bikes sem câmbio. Agora, além de ter que reaprender a andar de bike, comprei uma bicicleta com 18 marchas, daquelas de supermercado, para começar a aprender. E ficou a dúvida, como usar tudo isto? Encontrei este site que me esclareceu bastante e nos próximos dias farei meus primeiros testes com câmbio. Obrigado, após esta leitura, creio que será bem mais fácil. Parabéns pelo texto e abraço a todos os ciclistas. Nunca pensei que voltaria a me interessar por este assunto, nunca é tarde para ser feliz, rs…

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  2. Eu estou com dificuldades quando eu baixo as marchas. Eu sou iniciante e entendi todo o texto acima, mas eu falo assim: e estou com a 3-6, por exemplo, como eu devo fazer depois pra ir pra 1-2 ou 2-2? Qual a melhor sequência pra baixar? Sempre que eu baixo fica fazendo zoada na bike… Daí quando eu subo de novo respeitando a sequência que vocês indicaram aqui o barulho vai embora, mas quando eu reduzo, volta a zoada de novo!

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  3. Achei muito bom esse artigo, eu tenho uma Houston de 21 marchas, entretanto do lado esquerdo não existem apenas 3 marchas, mas várias sem numeração, que vao de “L” a “H”. Nesse caso, como utilizar as marchas dessa bike?

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    1. Nesse caso, o passador não é indexado e depende da sensibilidade e ouvido do ciclista! Ele funciona na base da fricção: se baixar marcha (Low – mesmos esforço)o câmbio empurra a corrente até que um elo encontre os dentes da próxima catraca. Se aumentar marcha (High – maior esforço) o câmbio traz a corrente para a catraca menor, aumentando a velocidade e esforço!

      Se durante a pedalada estiver ouvindo a corrente passando pelas catracas (como se arranhasse)ou “relando” no câmbio dianteiro, mexa nos passadores a fim de fazer pequenos ajustes! Um dos grandes problemas desse sistema é o possível descarrilamento da corrente, acontecendo de ela ser empurrada para os aros ou cair da coroa maior. Precisa ser sempre verificado!

      Por essas e outras e se seu bolso permitir, prefira investir em câmbios indexados! Esse sistema foi criado pela Shimano e cada passador possui internamente um anel dentado movimentando o câmbio de passo em passo: todos aqueles passadores que fazem um som de “tec-tec” mudam a marcha num limite determinado. Cada “tec” corresponde a uma troca de marcha. Dessa forma vc fica livre de ficar ajustando o passador “no ouvido”.

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  4. Comprei uma CALOI Elite 10 ontem e quando fui sair pra ser batizada entrei em desespero. São 24 marchas para uma pessoa que nunca teve ideia de como usar nenhuma. Resultado: não consegui subir nenhuma ladeira! 🙁
    Seu texto foi excelente, muito claro e os comentários tb ajudaram bastante.
    Obrigado pela ajuda, salvou meu dia e logo mais coloco suas dicas em prática. 🙂

    Abraço!

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  5. Olá. Comprei uma bicicleta da marca shimano, e por não entender nada de marcha, acho que quebrei algo. O pedal gira em falso, depois de um estalo enquanto meu filho pedalava. As marchas não mudam mais, o que devo fazer? Comprei tem uma semana. Detalhe, aqui em Orlando não se arruma nada, se joga no lixo e compra outra.

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    1. Como essa pergunta é de 2015, é claro o problema já foi resolvido.

      Pelo relato, estou considerando que todo o sistema (pedivela, cassete e roldanas) gira, porém sem tração para frente. Para quem está com problema parecido é o seguinte:

      quando o pedal simplesmente passa a girar em falso, significa que o cubo traseiro precisa de conserto. Dentro desse cubo há uma mola circular que pressiona pequenos dentes a girarem contra uma parede externa também dentada (em alguns modelos, cada dentinho tem sua própria mola). Ou essa mola quebrou (o que já aconteceu comigo) ou os pequenos dentes que fazem a roda movimentar-se para frente, podem ter ficado presos para dentro! Pode ser por sujeira, graxa endurecida impedindo o livre movimento deles, ou mesmo a quebra deles! Enfim, só abrindo o cubo para saber. Mas são probleminhas simples de se resolver e o pessoal de bicicletaria cobra mais pela mão de obra mesmo.

      Só não entendi o relato sobre as marchas! Problemas nos câmbios e giro em falso têm causas diferentes. Não vejo relação direta.

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  6. Sou mais um a elogiar a forma como você descreveu o artigo com informações precisas para quem quer aprender a trocar de marcha numa bike.
    Há uns oitos anos atrás comprei uma Caloi MTB de 21 marchas para substituir alguns treinos de corridas por umas pedaladas. Ocorre que a bike veio com o equipamento de manoplas para as trocas de marchas. Resultado: andei umas oito vezes e desisti por que, primeiro não sabia trocar as marchas e quando aprendi a porcaria parou de funcionar.
    Concluindo, acabei de mandar instalar um cambio Shimano 3×7 e depois de ler este seu artigo estou só esperando amanhecer para ir colocar em prática tudo que aprendi lendo o seu artigo.
    Um grande abraço e obrigado pela ajuda.

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  7. boa tarde,parabens muito boa sua explicação,con certeza vai ajudar muita gente……obs:adoraria ler um post a respeito de tamanho de quadro com relação a altura do ciclista.

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  8. Quanta gentileza, suas explicações…Muito obrigada.Eu estava passando errado as marchas da minha bike e meu marido tentou me explicar ontem me mostrando a tais coroas…kkkk VALEU!!!

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  9. Olá William, tudo bom? Valeu mesmo pelo post, agora eu entendo (alguma coisa) de bike! Mas eu tô com um probleminha… eu estou usando a bike de uma amiga, é uma Mormaii Full Max, só que no passador da esquerda não existem 2 ou 3 posições, mas 14! Eu fui conferir e, de fato, existem apenas 3 coroas, e na internet a bicicleta consta como 21 marchas (ela possui 7 posições na direita, como de praxe)… como proceder nesse caso? Sou totalmente leigo no assunto. =/
    Desde já MUITO obrigado pela ajuda!

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    1. André, provavelmente os passadores estão invertidos. O da esquerda deve estar trocando as marchas traseiras e o da direita, as dianteiras. Já veio assim? Vai funcionar, o problema é que você vai se habituar com isso e no dia em que migrar para uma bicicleta de qualidade terá problemas de adaptação. Acione a garantia, eles têm que corrigir isso.

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