São Paulo criará mais 400 km de ciclovias removendo vagas de estacionamento

Conheça a proposta apresentada pela CET para proteger os ciclistas paulistanos com 400 km de vias segregadas, com imagens de como serão implementadas.

Modelo de ciclovia "padrão CET". Imagem: CET/Reprodução
Modelo de ciclovia “padrão CET”. Imagem: CET/Reprodução

Por Daniel Guth

Ontem, 4 de junho, o Secretário de Transportes da cidade de São Paulo, Jilmar Tatto, anunciou um ousado plano que atualiza a Meta 97 do Programa de Metas da Prefeitura: implantar 400 km de ciclovias na cidade de São Paulo, até o final da gestão Haddad.

Trata-se de uma atualização muito bem-vinda, uma vez que a Meta 97 original se ancorava no termo “vias cicláveis”, que podem significar ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas, calçadas compartilhadas e etc. Ou seja, qualquer tipo de infraestrutura cicloviária. Isto sem contar o erro conceitual, pois todas as vias são “cicláveis” – exceção feita às vias consideradas de “tráfego rápido”, uma situação bastante específica detalhada no glossário do Código de Trânsito Brasileiro.

A proposta prevê uma rede cicloviária ampla e integrada. Imagem: CET/Reprodução
A proposta prevê uma rede cicloviária ampla e integrada. Imagem: CET/Reprodução

Sempre há o temor pelo descumprimento da Meta. Mas antes havia o temor pelo que se consideraria meta alcançada, pois 350 km de ciclorrotas + 50 km de ciclovias poderiam significar cumprimento integral da meta.

OK, mas qual a diferença entre 400 km de ciclovias, ciclofaixas, ciclorrotas e outras “ciclo alguma coisa”? Recomendo este post do Willian Cruz sobre as características de cada infraestrutura. Mas gostaria de destacar que o grau de complexidade e custo de cada uma delas também está relacionado com o grau de conforto e segurança ao ciclista quando está pedalando por uma destas infraestruturas. Não há nada mais aprazível do que um sistema de ciclovias interligadas, que sejam funcionais e atendam à demanda e à cultura do ciclista na cidade.

No entanto, ciclovias nunca serão suficientes, pois São Paulo possui 17 mil km de ruas e avenidas. Eis que surgem outras medidas e as demais infraestruturas cicloviárias, trânsito compartilhado e medidas urgentíssimas de acalmamento de tráfego. Por esta razão, se você for um leitor motorista, que alguma vez já tenha gritado para um ciclista “ir pedalar na ciclovia”, entenda que isto NUNCA será possível na totalidade do trajeto, pois a bicicleta é um modal porta a porta e, portanto, nunca haverá ciclovias que levem o ciclista de um ponto A ao ponto B o tempo todo de forma segregada. Implantar ciclovias, por conseguinte, não isenta a cidade de garantir conforto, segurança e condições mínimas para os ciclistas trafegarem nos demais 16.600 km de vias da cidade.

Voltemos ao anúncio do Plano de 400 km de ciclovias em São Paulo. Uma das diretrizes apresentadas pelo Secretário Jilmar Tatto para a implantação desta rede foi a não remoção de faixas de rolamento do viário. Para viabilizar, portanto, serão removidas vagas de estacionamento no viário – rotativas e permanentes.

Esta medida não é novidade nenhuma, apesar do espanto de muitos. Durante as muitas vindas do ex-prefeito de Bogotá Enrique Peñalosa a São Paulo, inclusive em algumas das conversas que pude ter com ele, uma frase constantemente repetida em suas argumentações sempre me chamou a atenção: “Estacionamento na via não é um direito constitucional”.

O documento divulgado também tem uma prévia da sinalização que será adotada. Imagem: CET/Reprodução
O documento divulgado também tem uma prévia da sinalização que será adotada. Imagem: CET/Reprodução

Se o direito de ir e vir (art. 5º da Constituição Federal) é tão massacradamente vociferado por motoristas irritados com o trânsito causado por manifestações, intervenções urbanas e festas populares, o mesmo argumento não pode ser usado para estacionar os carros na via pública. A diretriz apresentada pelo Secretário é, portanto, correta. Porém insuficiente.

Não são todas as vias que possuem vagas para estacionamento. Especialmente as avenidas, em São Paulo, que possuem ou corredor de ônibus ou faixa exclusiva, onde os estacionamentos já foram corretamente removidos para dar lugar ao transporte coletivo. Como será feito nestes casos, já que a remoção de faixas de rolamento está descartada? Como garantir a implantação de infraestrutura cicloviária em avenidas, vias historicamente usurpadas para o tráfego de automóveis desde o Plano de Avenidas do Prefeito Prestes Maia?

Para vias secundárias, parece-me que o planejamento desta rede é correto. Com baixo custo de implantação de R$ 200 mil por km, conforme anunciado pelo Secretário Tatto, e com um pouco de compreensão sobre origem-destino, acessos, centralidades e pontos de interesse, a cidade de São Paulo poderá ter uma rede de 400 km de ciclovias num piscar de olhos.

Na avaliação de muitos ciclistas que estiveram presentes no lançamento deste Plano, será preciso acompanhar pari passu a implantação destas infraestruturas. Seja pelos embates que suscitarão na sociedade e na imprensa, seja para indicar soluções frente a eventuais equívocos de implantação.

Será que São Paulo está preparada para colocar em prática o velho bordão cicloativista “menos carros, mais bicicletas”?

Daniel Guth é consultor na área de mobilidade urbana
e diretor de Participação da Ciclocidade
(Associação de Ciclistas Urbanos de São Paulo)

Veja aqui a apresentação do plano cicloviário da CET

Análise do Vá de Bike sobre a estrutura proposta,
com detalhes sobre a implementação.

Entrevista com o superintendente da CET, Ronaldo Tonobohn,
sobre a proposta dos 400km de ciclovias

39 comentários em “São Paulo criará mais 400 km de ciclovias removendo vagas de estacionamento

  1. Tá ai ! Muita gente mete o pau na hora que a Globo não fala sobre ciclismo, desta vez falou e falou bem, os dois apresentadores, apontando os erros e os acrertos desta ciclovia, e cobrando uma solução e uma sinalização melhor, e ainda alertando para todo mundo ficar de olho porque depois da Copa muito destas promessas podem acabar sumindo para debaixo do tapete como sempre!

    Parabéns ao Jornal,e a matéria, pois nem sempre se vive só de reclamar, mas também reconhecer ! Seja na emissora que for, dou meus parabéns quando vejo alguma matéria a favor do ciclismo urbano!

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  2. Pessoal do Vá de Bike,
    finalmente começaram as obras do tão esperado corredor de ônibus na avenida Luís Carlos Berrini (Zona Sul de SP). Eu acho que seria bacana se o Vá de Bike pudesse investigar se a obra incluirá também ciclovia na avenida (lembrando que o Haddad prometeu que toda nova obra de corredor de ônibus incluiria ciclovia).
    Alguém tem alguma notícia sobre isso?

    Sei que a obra começou porque passo lá diariamente, mas a única notícia que encontrei sobre o assunto foi essa: http://noticias.terra.com.br/brasil/transito/vc-reporter-por-obra-acesso-a-berrini-e-bloqueado-em-sp,36412fd44c786410VgnVCM3000009af154d0RCRD.html

    Abraços

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  3. Olha ! Prometer é uma coisa ! Agora cumprir é outra, tomara que seja verdade, pois o que a cidade mais precisa é de Ciclovia mesmo que de mais proteção e liberdade a nós ciclistas para podermos cruzar a cidade em paz.

    Espero que caso isto seja realmente levado a sério, nossos direitos também sejam garantidos, pois como a maioria dos motoristas são mal educados, mal informados e egoistas, não me admira ver caroo e moto invadindo a faixa para bicicletas, carros estacionados na faixa e coisas tipicas destas pessoas.

    Tomara que o projeto saia do papel e seja lgo realmente bem feito e planejado e não apenas um remendo paliativo, e sim algo definitivo e muito bem sinalizado junto com uma boa fiscalização.

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  4. Eu dei uma olhada no pdf, e não tem nenhum mapa mais detalhado com as vias onde serão implementadas as ciclovias. Quando ela vai sair?

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  5. Desculpe a minha falta de otimismo, mas o exemplo da ciclo-faixa de Moema tira de mim qualquer possibilidade de credibilidade nessa notícia. Moro próximo ao CEU Butantan e trabalho perto do shopping Ibirapuera. A ciclo-faixa de Moema é meu caminho diário. Pois bem, me parece que foi feito aqui o mesmo que esta previsto nesse novo plano, ou seja tirar área de estacionamento e basicamente, pintar uma faixa vermelha no chão. Até ai, tudo lindo.
    Só que não.
    Qualquer um que passa por aqui vê que em uma grande parte da rota, a cor vermelha do chão praticamente não existe mais. Em um ano e meio, eu vi duas vezes um agente do CET fazendo o trabalho de fiscalização. Todos os dias – e aqui não entra nenhum exagero – eu tenho que me indispor com taxistas estacionados na faixa esperando por clientes nos prédios. Caminhões de mudança, de delivery, de água, de pão, de tudo, estacionados na faixa. Motoqueiros que utilizam a faixa como faixa de ultrapassagem sem nenhuma preocupação, 3 bares, estacionamentos, buffet e lojas, na Av Pavão, que fazem serviço de Vallet em cima da faixa e até, como já publiquei até no Facebook, carros da CET e da Polícia estacionados lindamente naquela pequena faixa vermelha.
    Ou seja, não adianta nada esse estardalhaço todo se depois da construção essas vias não forem conservadas, fiscalizadas e principalmente, infratores não forem multados. Desculpem mais uma vez meu pessimismo, mas é que depois de quase dois anos nessa a gente acaba ficando assim mesmo. Descrente, pessimista e duro.

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    1. Infelizmente sou obrigado a concordar com o Fernando. Quando passo pelas ciclofaixas de Moema tenho de fazer um esforço pro sangue não esquentar, principalmente à noite ou finais de semana. Uma vez quase fui derrubado delas pq um carro veio estacionar na ciclofaixa no local em que eu estava passando. Sobre a nova ciclovia do centro, já vi hoje vídeos na página do Otávio Bicicreteiro um vídeo com uma fila de carros nela.

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    2. Tive oportunidade de conversar com uma pessoa que trabalha na prefeitura, e a pessoa me garantiu que as novas ciclovias teriam sempre algum tipo de isolamento físico (criando de fato uma ciclovia e não uma ciclofaixa), embora na maioria das vezes esse isolamento não seria feito com uma guia de concreto e sim com pequenos postes metálicos e coisas do tipo, o que já serviria para os carros não invadirem a ciclovia nem estacionarem sobre ela.

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    1. Como toda demanda reprimida tem esses problemas de falta de serviços/produtos. É o caso de ficar lado a lado com a prefeitura, cobrando a expansão e melhorias. Pode parecer trabalho de formiguinha, mas isto é trabalho de gente !

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  6. Até que fim começaram a pensar melhor nas bicicletas, em relação a Av. Paulista gente lá tem uma calçada gigante, já faz um tempo que não passo por lá mais acho q da pra tirar meio metro de cada lado se tiver errado me desculpem.

    Polêmico. O que acha? Thumb up 3 Thumb down 6

    1. Não vejo motivo para não tirar uma faixa de carros. Acredito que eles congestionem duas faixas com a mesma eficácia com que congestionam três… e a calçada não é ‘larga’, eu gostaria que você reparasse no uso da mesma a qualquer hora do dia. A calçada da Paulista é feita num padrão que deveria ser copiado no resto da cidade.

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  7. Parabens a todos que fizeram e fazem tanto barulho e conquistaram mais esta vitória. Não cheguei a estudar a fundo a proposta da prefeitura, mas concordo plenamente com o Daniel Guth no sentido que outras medidas, de acalmamento de tráfego, por exemplo se fazem necessárias. Falo isso pois a implementação de uma rede cicloviária deve garantir a segurança e o conforto dos ciclistas, logo deve ter padrões estabelecidos não apenas com base no custo e na facilidade de implementação, mas ´principalmente numa rede eficiente e sustentável. Em países que possuem uma grande quantidade das viagens diárias realizadas de bicicleta (mais de 20%) como a Holanda e a Bélgica a lógica é bem simples e eficiente: nas vias com limite de velocidade superior a 30km/h são construídas ciclovias, pois oferecem risco aos ciclistas. Nas vias de velocidade reduzida (cujo número deveria aumentar em Sâo Paulo, tanto na região central quanto em zonas residenciais dos bairros) não haveria a necessidade de ciclovias, mas apenas a demarcação da ciclorota e a preferencial da bicicleta sobre os demais veículos.
    Há que se cuidar, portanto,se a cosntrução das ciclovias obedece uma lógica de segurança/conforto ou será feita sem nenhum planejamento, com base apenas no que é possível.

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  8. A matéria chamou a atenção para uma contradição do plano: se foi dito que não haverá remoção de faixas de rolamento (somente espaços de estacionamento), como poderá ser implantado na Paulista, como foi divulgado?

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    1. Alex, talvez estreitando as faixas de rolamento. A ver. O que não se pode é obrigar o ciclista a sair da via principal quando ela representa o caminho mais curto e plano, senão a infra não será utilizada.

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  9. Alex e Willian, realmente esta questão ficou em aberto. Uma das diretrizes do plano apresentado era: “Prioridade para vias secundárias”. Ou seja, talvez as avenidas (como a Paulista, citada pelo Alex) fiquem pra depois ou para um outro Plano (pois há necessidade, na maioria dos casos, de licitação de projetos e obra).

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