São Paulo deve fazer mais e melhores ciclovias em vez de removê-las, defende urbanista
“Estamos retroagindo e isso é muito sério para a cidade”, alerta Valter Caldana, diretor e professor adjunto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie
Ciclovias e ciclofaixas são importantes para a cidade? A proposta de substituir trechos por ciclorrotas está correta? Para responder a essas questões, o Jornal da Câmara de São Paulo entrevistou nessa quinta-feira o Diretor e Professor Adjunto da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Mackenzie, Valter Caldana, que defendeu a permanência das estruturas.
“As ciclofaixas têm uma função didática muito grande”, defende o urbanista, que afirma que “São Paulo precisa atualizar a sua agenda e se requalificar como metrópole”, destacando que os modais de transporte fazem parte dessa requalificação e que “a bicicleta é um deles e um dos mais importantes”. “É claro que isso tira as pessoas da zona de conforto e gera uma certa confusão num primeiro momento”, esclarece.
E para essa requalificação da cidade, “não se trata de desmanchar o que está feito, mas de fazer mais e fazer melhor. Eu não preciso desfazer, porque trata-se de uma política correta. O que precisa é fazer mais, corrigir erros de percurso que possam ter acontecido, mas fazer mais, indo pra frente. O que me parece é que desta forma estamos retroagindo e isso é muito sério pra cidade.”
Pouco uso
“A questão do pouco uso, você entra numa discussão que é uma discussão estéril do ovo e da galinha: ‘eu não uso porque não tem a ciclofaixa, se não tem a ciclofaixa eu não uso’. Quem tem que vir primeiro, o uso ou a ciclofaixa? Na verdade se você não oferece a possibilidade e se você não vem com uma campanha de incentivar o uso, você nunca vai ter o uso. Então o que está em jogo é saber se o uso é desejável ou não. Essa é a discussão preliminar.”
“Se o uso é desejável, então você não tem que desmanchar o que tá feito, você tem que incentivar o uso. O prefeito Gilberto Kassab por exemplo iniciou um belíssimo trabalho de distribuição de bicicletas pras crianças em escolas, que pudessem ir pra escola de bicicleta. Ou seja, você tem essas experiências espalhadas no mundo inteiro e algumas até em São Paulo, que foram abandonadas ou não foram melhoradas.”
Periferia
“A bicicleta na periferia é um modal que nunca deixou de existir. É um complemento, porque você tem um deslocamento até os grandes troncos de transporte público de alta capacidade. Na periferia de São Paulo as pessoas primeiro andam, depois pegam uma condução de pequeno porte, pra depois chegar no terminal de grande porte. E só nesse percurso você perde quase 40, 50% do perverso e inadmissível tempo de deslocamento das pessoas da periferia para o centro.”
Faltaram estudos?
O apresentador, Felipe Brosco, pergunta se houve estudos para implantar a rede cicloviária. “Olha, certamente houve esses estudos, a CET fez vários deles, outras entidades fizeram. O Instituto Cidade em Movimento, que por acaso sou conselheiro, fez também.”
e isso é muito sério
para a cidade”
“O que se passa é o seguinte: o projeto de aceleração da implantação das ciclovias foi um projeto importante, na direção correta, mas ele pecou por dois problemas. O primeiro, uma falha de comunicação com a sociedade muito grande. Ou seja, não se explicou pra sociedade a completa estratégia do projeto, dando a impressão de que apenas se estava criando uma faixa para bicicletas. O projeto é muito mais que isso, é uma reeducação de como se mexer na cidade, onde a ciclovia é muito importante, por exemplo eliminando vagas de automóvel e coisa assim. E o segundo problema é que, de fato, apenas instalar a ciclovia ou a ciclofaixa, ou mesmo a ciclorrota, não basta”, explica Caldana, referindo-se a campanhas de incentivo ao uso.
“Além dessa questão educacional, você tem paralelamente uma questão de equipamentos complementares. Pontos de parada, pontos de estacionamento, pontos de manutenção, locais onde as pessoas depois de um determinado tempo de percurso possam tomar um banho, ou se arrumar para ir para o seu destino final. Uma infraestrutura, que inclusive pode ser uma possibilidade de novos comércios, de novos pontos comerciais, de novos serviços, que a cidade e a sociedade ainda não perceberam que podem criar. Então, o ponto de ônibus, ele passa a ser um ponto intermodal, e ele passa a ser um novo ponto comercial e de serviços que a cidade ainda não conhece, mas que já existe em n outras cidades do mundo e é um sucesso.”
Ciclorrotas
“De novo está se incorrendo no mesmo erro estranhamente. Não adianta fazer ciclorrotas se a prefeitura não tiver a coragem de implantar as chamadas zonas 30 e zonas 20. São zonas da cidade, pedaços inteiros de bairros onde a velocidade do automóvel é de 30 ou de 25 quilômetros por hora. Se você implanta a zona 30 – e leva a sério – tudo bem a ciclorrota. Na verdade ela é quase dispensável, porque aí qualquer rua é ciclorrota, né? Mas vá lá, vamos pintar bicicletinha no chão e tudo mais, porque o carro tá no máximo a 30 km/h, aí você tem a convivialidade, a possibilidade do compartilhamento. Agora, você fazer a ciclorrota a 50 km/h, aí é perigoso.”
Ciclorrota na Consolação
Colocar uma ciclorrota na Consolação seria uma boa ideia? “É mais perigoso”, responde de pronto o diretor da FAU. “Na verdade a Consolação tem outras questões muito mais graves. Por exemplo: tem sentido uma avenida com aquela largura, com aquele fluxo, ter uma calçada daquela largura? Tem sentido você sair de uma estação do metrô numa calçada que tem um metro e meio? Então o problema não é a ciclofaixa, o problema é que tá tudo errado! O desenho urbano inteiro está todo errado. Não é resolvendo a ciclofaixa sem resolver a calçada que você vai resolver, se tem esse mesmo problema na Boa Vista, na Líbero Badaró…”
política discutível,
o que precisa
é fazer mais
O que se precisa é fazer mais ciclovias
“Desfazer é uma política discutível, o que precisa é fazer mais. Se nós admitirmos que São Paulo tem que mudar o modelo de desenvolvimento urbano – e tem que mudar, porque o atual entrou em colapso -, se nós admitirmos que a questão dos modais, andar a pé, andar de bicicleta, é fundamental pra mudar esse modelo, então se nós concordamos com isso vamos fazer mais e melhor. Se nós não concordamos com isso, e achamos que a cidade tem que manter esse modelo que está em colapso, então tem que vir a público e dizer: ‘nós queremos manter esse modelo’. O que não dá é pra ficar com um pé em cada barco.”
A estrutura está pronta, agora é só aprimorar e principalmente, fazer uma campanha maciça de conscientização. O problema é: Terei coragem de fazer isso? Terei coragem de esquecer nem que seja por um momento, minhas convicções e rivalidades políticas e fazer o que é melhor para a cidade e o cidadão? Eu duvido, mas espero estar redondamente enganado.
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Olha sinceramente na minha humilde opinião, eu acho complicado qualquer tipo de obra ou infraestrutura em nisso pais, a cidade de São paulo te um trânsito completamente caótico e super lotado, com certeza melhorar e até mesmo aumentar as ciclovias seria sem dúvida uma ótima opção de transporte para a população, a questão é será que os “políticos” seriam tão bons assim a esse ponto, espero que sim!!! Excelente matéria…Parabéns!!!
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As entidades internacionais que premiaram Haddad por sua gestão progressista, deviam dar o troféu abacaxi para o mimadinho dolynho!!!!!
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Perfeito posicionamento! Coerente e realista. Primeiro vem a estrutura, depois a evolução dessa estrutura e então as pessoas a utilizarão! Retirar qualquer metro de ciclovia ou ciclofaixa, não faz sentido algum. A população de São Paulo não precisa disso, a cidade não precisa disso. Milhares de pessoas presas no trânsito e lotando o transporte público só geram prejuízos, para as pessoas e para a cidade. Até economicamente, manter e melhorar a estrutura cicloviária é mais interessante. A bicicleta trás um infinidade de benefícios e possibilidades para a cidade e seus cidadãos… Torço para que o prefeito acorde para a realidade do mundo e mude de postura, se é realmente um gestor, que faça o melhor para toda “sua equipe/cidadãos”, não apenas para os “puxa sacos/eleitores”. Parabéns Willian!
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