Bicicleta mais rápida que helicóptero, no Desafio Intermodal de 2009
Que a bicicleta é mais rápida que o carro, já não é novidade. Mas chegar antes do helicóptero foi uma surpresa até para mim.
O maior objetivo do Desafio Intermodal é mostrar que existem outras opções além do automóvel para se deslocar numa grande cidade como São Paulo. Ir de ônibus ou Metrô até algum lugar não é tão mais demorado que o carro (imagine então se tivéssemos corredores de verdade e o mesmo investimento em transporte público que temos para o uso do automóvel). E o conforto oferecido pelo carro é relativo: eu prefiro ficar uma hora em pé num ônibus do que uma hora dirigindo em um trânsito travado. E nem vamos falar aqui sobre poluição, nem sobre o custo da viagem: quem tem e mantém um carro sabe o quanto ele custa ao longo de um ano.
Há opções que as pessoas nem cogitam, às vezes sequer imaginam. Com o advento do Bilhete Único, você pode pegar mais de um ônibus (ou integrar com metrô e trem) para chegar onde quer. Você pode pegar um ônibus qualquer que vá mais ou menos para o lado onde você precisa ir, descer numa grande avenida e pegar outro por lá.
Há também a bicicleta dobrável, que pode ser utilizada para chegar até um ônibus ou metrô. Você então a dobra e leva com você até desembarcar, quando ela pode ser montada novamente para chegar ao destino final. E também é possível até mesmo ir a pé por todo um trajeto ou por parte dele, integrando com transporte coletivo. Numa época em que eu morava a 3,5km do trabalho, era comum eu ir a pé, fazendo o percurso em cerca de meia hora.
Tudo é questão de tentar, fazer um teste, começar aos poucos. Às vezes uma pequena mudança, uma experiência que você faz num dia sem pressa, faz você começar a ver as coisas de outro modo e enxergar opções que antes estavam escondidas atrás da cortina do hábito e da rotina.
A bicicleta vencedora
Ricardo Bruns usou uma bicicleta do tipo conhecido como “fixa”. Ao contrário das bicicletas convencionais, os pedais de uma fixa giram junto com o eixo da roda, de forma que se movimentam durante todo o tempo em que a bicicleta está se movendo. São as preferidas dos bikeboys de Nova Iorque.
A bicicleta tinha outra diferença: o guidão mais estreito. Eu já tentei utilizar com a minha bicicleta a Av. Nove de Julho, caminho que o Bruns fez, mas o espaço entre os carros parados é muito estreito e acabei desistindo. E o caminho que eu fiz, subindo a Brigadeiro Luís Antônio, foi mais fácil para mim do que seria para a fixa, já que uma bicicleta desse tipo não possui marchas.
O caminho feito com a bicicleta fixa tinha praticamente a mesma distância do caminho que fiz. Mas era plano e Bruns pegou algumas ruas mais tranquilas pelo Itaim, onde foi possível desenvolver mais velocidade que em meio aos carros parados, desviando dos retrovisores (sem bater neles – até porque isso para um ciclista significa queda) e aguardando as motos que entopem os corredores. Sim, a bicicleta passa onde moto não passa, principalmente com um guidão mais estreito como o da bicicleta que ele pedalava e às vezes as motos entupidas nos corredores impediam minha passagem na Brigadeiro e na JK.
Parabéns ao Ricardo Bruns, que soube escolher bem o caminho e chegou em dois terços do tempo do helicóptero (22 min), inteiro e sem desrespeitar as leis de trânsito. Da minha parte, fiquei satisfeitíssimo em chegar apenas três minutos e meio depois do helicóptero e por ter melhorado o tempo do ano passado em cerca de cinco minutos (nesse ano, completei em 37 minutos).
O bikeboy
O bikeboy – ou bike courier, bike messenger, ciclista de entregas, como queiram – Neto, da Ecobike, chegou apenas 30 segundos depois do motociclista que ficou em segundo lugar e bem antes do motoboy. Isso faz cair por terra a idéia de que não valeria a pena usar um bikeboy para os serviços pessoais e da empresa, porque teoricamente levaria mais tempo. Entregas feitas por bicicletas, com entregadores profissionais, levam o mesmo tempo que as entregas feitas por moto, podem custar menos e não poluem o ar que todos nõs respiramos. Experimente.
O helicóptero
Ponto a ponto, o helicóptero é inegávelmente mais rápido. Mas há mais coias envolvidas no uso do helicóptero do que apenas voar daqui até ali.
Como relata em um ótimo post o jornalista Milton Jung, da rádio CBN, é preciso subir até o heliponto, aguardar o pouso do helicóptero, aguardar autorização para decolagem (pois há congestionamento até de helicópteros em São Paulo!) e respeitar os corredores de tráfego aéreo que existem na cidade. O tempo total foi de 33:30.
Outras surpresas
André Leme, o corredor, completou o percurso bem antes do carro. Sabe quando dizem que “dá vontade de largar o carro e sair correndo”? Pois é: funciona. Leme teve o tempo de 1h06, enquanto o carro levou 1h22 para chegar. Mesmo Laércio Muniz, que foi andando, chegou apenas 10 minutos depois do automóvel. Deixe seu carro em casa e vá a pé.
A bicicleta dobrável integrada com ônibus levou 1h08 para chegar, mostrando uma alternativa interessante para quem não quer pedalar longas distâncias. Ele pedalou até o ônibus, dobrou a bicicleta (o que é feito rapidamente), embarcou com ela numa sacola destinada a isso e, depois de descer do ônibus pedalou mais um pequeno trecho.
Mas o mais inusitado nessa competição foi um PATINETE chegar antes do automóvel. Lucien Constantino fez o tempo de 58 minutos, chegando antes do carro e até mesmo do corredor. E o motorista do automóvel viu o patinete ultrapassá-lo, mas não podia fazer nada para evitar, já que muitos outros carros impediam seu deslocamento.
Transporte público e cadeirante
Não precisamos nem considerar a bicicleta dobrável como transporte público (e poderíamos: afinal, parte do trajeto foi feito de ônibus). Ricardo Toshio utilizou apenas ônibus e teve um tempo de 1h11, contra o 1h22 do carro. Quem utilizou trem e metrô levou 1h24 e trêm e ônibus 1h29.
A cadeirante Flávia Maria Paiva Vital, animadíssima, chegou em 1h48 minutos. Considerando a falta de acessibilidade de São Paulo (poucos trajetos de ônibus adaptados, calçadas intransitáveis, travessias difíceis), não foi tão pior que o carro. Mas a cidade precisa evoluir muito no trato a quem tem restrições de mobilidade, passando a ser mais inclusiva e viável para quem precisa se locomover numa cadeira de rodas.
Resultados
A tabela completa de resultados pode ser conferida no site do CicloBR, clicando aqui. Além dos tempos, há informações sobre o custo e o CO2 emitido por cada participante para completar o percurso. Com o custo da viagem de helicóptero, por exemplo, daria para comprar várias bicicletas…
Mais bicicletas pelo caminho
Uma coisa que notei esse ano é que havia bem mais bicicletas ao longo do caminho. E não estou falando de quem resolveu me seguir não: eram pessoas voltando do trabalho, pedalando sua bicicleta pelas ruas da cidade. A bicicleta tem sido cada vez mais utilizada como meio de transporte em São Paulo, mesmo que não tenhamos iniciativas de larga escala para integrar a bicicleta ao fluxo viário da cidade e aumentar a segurança de quem utiliza esse “modal”. E não precisa ir longe: algumas pequenas iniciativas fariam a maior diferença.
Tá com pressa? Vá de bike, de patinete, correndo, de metrô, de ônibus…
Maravilha!
Eu percebo que surpreendo os meus alunos da Unir quando digo que pedalo da minha casa à universidade em meia hora. Quando digo que são 13km, acham muito longe. Quando digo que dá meia hora, acham pertinho.
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