João Doria e as ciclovias – o que foi conversado com os ciclistas de São Paulo (com fotos e vídeos)

Veja um resumo do que foi conversado com o próximo prefeito de São Paulo sobre mobilidade a pé e com bicicletas – com fotos e vídeos.

O próximo prefeito de São Paulo abriu diálogo com representantes da mobilidade a pé e com bicicleta. Foto: Willian Cruz
O próximo prefeito de São Paulo abriu diálogo com representantes da mobilidade a pé e com bicicleta. Foto: Willian Cruz

No domingo 9 de outubro, o prefeito eleito em primeiro turno na cidade de São Paulo, João Doria Jr. (PSDB), fez uma pedalada com cicloativistas e representantes da mobilidade a pé na região da avenida Faria Lima. Segue um resumo com os principais pontos discutidos, pontuados com os vídeos que publicamos ao longo da semana. No final da página, uma galeria de fotos do encontro.

O encontro

Na quarta-feira que antecedeu o encontro, ocorreu um protesto de ciclistas preocupados com as declarações de Doria – que davam a entender que mais de metade das ciclovias da cidade poderia vir a desaparecer, uma situação diametralmente oposta ao que estava previsto em seu Plano de Governo. Um grupo de mais de 100 pessoas se deslocou de bicicleta (e até de patinete) da Praça do Ciclista até sua casa, para pedir que as ciclovias e a redução de velocidade fossem mantidas (veja relato, vídeo e fotos).

Em sequência à manifestação, cidadãos interessados na mobilidade a pé e com bicicleta se encontraram na manhã do sábado, 8 de outubro, para discutir o cenário e debater estratégias. Participaram ciclistas de diversas partes da cidade e pessoas de diversos coletivos, tanto relacionados ao deslocamento de bicicleta como também a pé. Veja aqui o que foi deliberado.

Na noite do mesmo sábado, chegou a informação de que João Doria queria pedalar e conversar com lideranças do movimento cicloativista, já na manhã seguinte. Uma comissão foi montada às pressas com participantes da plenária, representando ciclistas e pedestres, para dialogar com o futuro prefeito da cidade mais populosa do continente americano e de todo o hemisfério sul.

Após uma breve conversa em frente ao comitê de campanha na Avenida Europa, um grupo com cerca de 30 pessoas saiu pedalando pela ciclovia da Avenida Faria Lima, com alguns acompanhando a pé em ritmo de corrida leve, tendo como destino o Largo da Batata. Chegando lá, fizemos uma rápida parada em uma lanchonete, onde Doria tomou um suco de laranja e ofereceu água aos ciclistas e jornalistas que o acompanhavam, antes de retornar para o ponto de saída pela mesma ciclovia. O Vá de Bike transmitiu a pedalada e parte da conversa ao vivo no Facebook (veja um dos vídeos no final do texto).

Retirada de ciclovias

Para o prefeito eleito de São Paulo, mesmo quem não utiliza as ciclovias precisa compreender sua importância para a cidade. “Ciclovia é pra cidade. Para os usuários e para os não usuários também. O não usuário tem que entender que aquilo é um equipamento também que ele precisa ajudar a preservar, mesmo não usando”, afirmou.

Um pouco depois, Doria confirmou a uma jornalista que ainda mantém a intenção de rever as ciclovias que considera “inúteis”, dando o exemplo de subidas íngremes. No entanto, agora ele começa a falar em “redesenho” em vez da simples retirada.


Comerciantes contrários às estruturas

Informado que muitos comerciantes reclamam da ciclovia em frente ao seu estabelecimento por não terem mais espaço para estacionar um automóvel na via pública, João Doria afirmou: “Sobrepor, ainda que no direito, o individual pelo coletivo, tá errado. O coletivo se sobrepõe ao individual”. O futuro prefeito de São Paulo recebeu livros e publicações relacionados à bicicleta e colou um adesivo “bicicleta é bem vinda” na fachada de seu comitê.

Publicaremos nos próximos dias um artigo esclarecendo que as ciclovias são benéficas ao comércio e que a crença de que lojas são prejudicadas pelas estruturas não se sustenta frente a números, estudos e exemplos práticos.


Expansão e manutenção só com a iniciativa privada

João Doria não pretende investir em novas ciclovias, a não ser que empresas se interessem em financiar essa expansão em troca de publicidade. A manutenção também deve acontecer apenas com dinheiro da iniciativa privada. Mas Doria está confiante de que haverá muitos interessados, garantindo que isso ocorra. “Não é preciso plano B”, garantiu aos cicloativistas presentes.

Questionado se as ciclovias da periferia e de regiões menos valorizadas também atrairiam o interesse de empresas, afirmou que será necessário fazer pacotes mesclando as áreas, para garantir investimentos em regiões com menor visibilidade. “Como em toda privatização, concessão ou PPPs [parcerias público-privadas], você tem que fazer um mix entre áreas nobres e áreas menos nobres, porque senão todo o investimento irá para áreas mais nobres em detrimento das menos nobres. E a gente fazendo isso com equilíbrio, implica que você pode ter duas áreas nobres mas você fica com duas áreas periféricas. É dentro desse processo que nós vamos construir esse programa”, explicou.

Daniel Guth, da Ciclocidade, perguntou se as ciclovias não merecem investimento público, citando que o valor investido pela atual gestão para chegar a 400 km de ciclovias foi de apenas 0,07% do orçamento municipal. Doria desconversou, afirmando que o papel da prefeitura será trazer as empresas para fazerem esse investimento.

Mas por que as ciclovias dependerão de empresas para sua construção e manutenção, enquanto o viário para automóveis, com um custo muito mais alto, continuará contando com investimentos públicos? A impressão é que as ciclovias continuam sendo consideradas um “gasto”, não um investimento que traz retornos em termos migração de modal, saúde, meio ambiente, segurança viária e, principalmente, vidas salvas.


Na periferia, estrutura de lazer terá prioridade

Durante as conversas com João Doria, pudemos perceber que ele é bastante simpático às Ciclofaixas de Lazer, que já têm apoio da iniciativa privada. Essa preferência pode resultar em sua priorização em relação às estruturas permanentes, que atendem ao ciclista diário protegendo-o no trânsito.

Nesse vídeo, questionado sobre as ciclovias da periferia, o próximo prefeito afirma que primeiro levará as estruturas dominicais às regiões mais distanciadas do centro para só depois pensar em expandir as ciclovias.


Aumento nos limites de velocidade

Questionado sobre limites de velocidade, o prefeito eleito da capital paulista afirmou que nos locais das Marginais onde há maior fluxo de pessoas o limite pode permanecer o mesmo. A declaração se deu após ser informado pelos presentes que, nas pistas locais, a maioria das mortes é de pedestres, que circulam pelas calçadas cruzando as esquinas e principalmente as alças das pontes, que precisam acessar para conseguir atravessar o rio.


Pedestres e ciclistas unidos

O futuro prefeito afirmou ainda que pretende eventualmente utilizar a bicicleta e fazer “outros passeios” como o realizado naquele dia. Disse ter gostado das conversas, que classificou como tranquilas, positivas e agregadoras. “Gostei muito e queria cumprimentar esse espírito de integrar os pedestres com os ciclistas, ou seja, não há incompatibilidade”, comentou João Doria, com bastante ênfase.

Representantes da mobilidade a pé também estiveram presentes, levando sua visão de cidade a João Doria. Foto: Willian Cruz
Representantes da mobilidade a pé também estiveram presentes, levando sua visão de cidade a João Doria. Foto: Willian Cruz

“Ficou uma manifestação muito boa, muito boa mesmo. Não vou dizer que foi uma surpresa, mas foi gratificante verificar que essa integração se faz sem conflito. Como eu desejo realmente. A cidade sem conflito é uma cidade melhor. Você tem que resolver, buscar soluções pros conflitos. Vocês estão dando soluções aqui para aquilo que potencialmente poderia ser um conflito.”

Essas declarações (e as demais que se seguem nos próximos itens) podem ser vistas no vídeo ao final do texto, a partir dos 17 minutos.

Participação popular

Daniel Guth, da Ciclocidade, comentou ser importante apresentar um cenário da mobilidade ativa para a equipe de transição. João Doria respondeu que há uma equipe de transportes e que é possível, sim, fazer isso. Disse que as conversas devem ocorrer com a equipe, pois pretende fazer uma gestão descentralizada, e que devem iniciar em novembro, com o secretário já nomeado.

Guth reforçou a importância de manter os Conselhos, as Câmaras Temáticas de mobilidade a pé e com bicicleta, o Conselho Municipal de Trânsito e Transporte (CMTT), ao que o prefeito eleito respondeu não haver razão para não se manter. “É importante só um pouco de renovação”, explicou, mas ao ser informado que uma eleição havia ocorrido há pouco tempo, reiterou que os eleitos devem cumprir seu mandato integral.

O integrante da Ciclocidade perguntou ainda se seria mantido o departamento de planejamento cicloviário da CET, hoje com 14 integrantes, entre técnicos e arquitetos. “Não vejo razão para não manter”, respondeu João Doria, “Se está funcionando bem, será mantido.”

Secretaria de Transportes e Mobilidade

Doria disse que o próximo secretário de transportes ainda não está definido, mas que essa escolha se dará até novembro. Respondendo a Renata Falzoni, declarou que a pessoa a ocupar o posto precisa ter “sensibilidade, capacidade de ouvir, capacidade de entender a cidade e frequentar a cidade”. “Todos os secretários vão ter que frequentar a cidade, não dá pra você fazer administração só em gabinete”, completou.

Vera sugeriu que a Secretaria de Transportes tivesse Mobilidade no nome. Doria aceitou. Foto: Willian Cruz
Vera sugeriu que a Secretaria de Transportes tivesse Mobilidade no nome. Doria aceitou. Foto: Willian Cruz

Vera Penteado Borges, ciclista que tocou a campainha de Doria na manifestação do dia 8, sugeriu que a Secretaria de Transportes passasse a se denominar Secretaria da Mobilidade, “para as pessoas não enxergarem transporte como só os motorizados”. João Doria sugeriu então Transporte e Mobilidade, assumindo compromisso com essa mudança na denominação, “porque você agrega a mobilidade e dá uma demonstração clara de respeito por ela”.

Andrew Oliveira, da Cidade a pé, destacou a importância de haver “um planejamento integrado e articulado entre as várias empresas municipais, privadas e terceirizadas para pensar o pedestre”, citando o exemplo de Brasília, que criou recentemente um grupo intersecretarial para pensar na mobilidade a pé. “Mobilidade a pé é a mobilidade da maioria”, declarou, explicando que “um terço da população se desloca a pé, juntando com o transporte público dá dois terços – e é a mais esquecida”. Doria respondeu ser simpático à ideia, pois pretende fazer quase tudo na prefeitura transversalmente.

Bikes vs Carros

Por fim, Willian Cruz, do Vá de Bike, sugeriu ao próximo prefeito que assista ao filme Bikes vs Carros, “que documenta a luta por espaço para as bicicletas nas cidades”. Apesar da dicotomia “bicicletas versus carros”, a produção não explora a guerra por espaço, mas destaca como a indústria automobilística influencia nas políticas públicas das cidades e como a bicicleta começa a mudar uma parte desse jogo.

São Paulo tem um papel importante no documentário. Gravando entre 2012 e 2014 na cidade, o diretor sueco Fredrik Gertten registrou a eleição do prefeito Fernando Haddad (PT) e o início das transformações pelas quais a capital paulista passou. Também compõem o documentário as cidades de Los Angeles (EUA), com sua luta por mais espaços para bicicleta; Toronto (Canadá) e o seu prefeito que está tirando algumas das ciclovias; e Copenhague (Dinamarca), referência internacional em mobilidade por bicicleta. É possível assistir o filme através do serviço online Netflix (siga este link).

Doria prometeu assistir.

Vídeo

Fizemos diversas transmissões ao vivo durante o encontro com o prefeito, com direito a tombo do celular enquanto transmitia e incluindo a última conversa em frente ao comitê, na íntegra e sem cortes. A conversa se inicia por volta dos 17 minutos do vídeo abaixo (o tombo está no 1:20).

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17 comentários em “João Doria e as ciclovias – o que foi conversado com os ciclistas de São Paulo (com fotos e vídeos)

  1. Não votei no Doria e nem votaria,até porque não foi ele ou seu partido que trouxe ou potencializou as ciclovias na cidade, mas custo a acreditar que ele vá cometer a estupidez de retirar “Ciclovias que não funcionam” ao invés de modernizá-las. Agora, me parece muito claro, que no mínimo, não expandirá o sistema.Pelo menos a equipe dele já sabe que estamos de olho. Dedos bem cruzados aqui.

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  2. “Doria tomou um suco de laranja e ofereceu água aos ciclistas e jornalistas”

    Esse trecho ficou bem emblemático. Esperemos que esse carinha faça algo decente, mesmo que seja por motivações hipócritas. Veremos.

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      1. Ele não teve o cuidado esconder a marca do capacete. Foi Patrocinado ? Por coincidência a marca é de uma rede de artigos esportivos. Poderia se passar por hipster … :-).

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      2. Outra coisa que perturba na bike-etiqueta é a plaquinha na bicicleta dele, está querendo implementar placas na bicicletas ? Não consegui ver uma imagem da placa claramente, se é de algum lugar do mundo ou apenas decorativa.

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  3. [Comentário oculto devido a baixa votação. Clique para ler.]

    Esse comentário não tem feito muito sucesso. Thumb up 5 Thumb down 14

    1. O velho chavão…não sou contra ciclovias, existem outras coisas mais prioritárias…

      Mais prioritárias que preservar a vida?

      ALIAS, UM É EXCLUDENTE DO OUTRO?

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      1. Caro Tiago, os ônibus são usados por mais de 70% dos deslocamentos na cidade. Se isso não for prioridade…
        A verdade é que não há dinheiro para atender a TODAS as demandas da cidade. Nesta situação, óbvio que as mais importantes para a maioria devem ser atendidas em primeiro lugar; melhoria nos sistemas de ônibus/metrô/trem, creches, escolas, enfim, é uma infinidade de coisas, e as ciclovias não estão entre as primeiras.
        Aliás, você sabia que o uso da bicicleta em muitos países da Europa é devido também ao alto preço das passagens urbanas? Em Amsterdam, quando você embarca no transporte público, o sistema desconta 4 Euros do seu cartão, e você paga a tarifa de 0,88 Euros + 0,15 por Km. percorrido, e os sistema te devolve a diferença não usada quando você desembarca…fora que para levar a bicicleta no metrô, é cobrado adicional.É este alto valor que mantém o transporte funcionando.

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        1. ERRADO!

          Segundo a pesquisa de mobilidade urbana da rede nossa São Paulo, apenas 29% utilizam o carro. Os 71% restantes se deslocam a pé, de transporte publico e bicicleta. A atual gestão priorizou tanto os onibus, qto a mobilidade a pé (ciclistas e pedestres).

          A maioria dos deslocamentos é feito a pé, seguindo de ônibus, depois metrô e trem e por fim a bike, nessa sequencia.

          4,2 milhões no metrô
          3,0 milhões na CPTM
          300 mil de bike

          Os custos para implantação de ciclovias custaram 0,07% do total de orçamento total da cidade. Porém, o que se economizou com menos acidentes em custos na saude pública, esse gasto com os 400km de ciclovias já se pagou e agora está gerando economia aos cofres públicos da cidade.

          Antes de sair falando o que não sabe apenas baseado em achismos, deveria pesquisar e se informar bem antes.

          http://www.nossasaopaulo.org.br/portal/files/apresentacao-mobilidade-ibope-2014.pdf

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          1. Mas então, rapaz! Esse estudo concluiu exatamente o que eu dizia; existem outras prioridades mesmo: segurança, transporte público, etc. Sugiro que você leia a página 75 do mesmo artigo que você me sugeriu.

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            1. Metrô é CARO e a prefeitura do Dória já disse que só vai ceder terrenos.

              Além disso, a necessidade de metrô não tira a necessidade de ciclovias, nem de corredores de onibus. A prefeitura tem que priorizar o que é de sua competência.

              Deixar 300 mil ciclistas sem segurança, correndo o risco de serem atropelados por falta de um espaço seguro e segregado é uma IRRESPONSABILIDADE.

              Vamos colocar esses 300.000 ciclistas no saturado metrô ou 300 mil novos carros nas ruas para ver o transito ficar ruim de VERDADE!

              Então sinto muito, mas o investimento em Metrô não é EXCLUDENTE as ciclovias/ciclofaixas.

              E assim que tem que ser, e é assim que será e ponto final!

              Até o Dória concordou com isso, em declaração dada nos videos.

              Aceita que dói menos kkkkkkkkkkkkkkkkk

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  4. Minha preocupação com a falta de informação da equipe do prefeito eleito ainda existe. Eles continuam com o mesmo discurso carrocrata de antes, mesmo depois de nossa conversa com o Doria.

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  5. Adorei essa manifestação! Desde quando vi que o Doria se candidatou, torci por ele! Embora eu não more em sampa, amo essa cidade porque vivi os melhores tempos da minha vida, nela! Doria é um cidadão equilibrado,inteligente, articulado e muito educado. Boa sorte a todos.

    Comentário bem votado! Thumb up 9 Thumb down 4

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