Ciclovias prejudicam o comércio? Na verdade, aumentam o faturamento
No Brasil e no exterior, números mostram que comerciantes que recebem bem os ciclistas atraem mais clientes e aumentam suas vendas
Quando a Prefeitura de São Paulo anunciou a construção de 400 km de ciclovias, em 2014, a reação de alguns comerciantes foi bastante negativa. Diziam que São Paulo não era Amsterdam, que “ninguém anda de bicicleta por aqui”. E previam que o comércio iria “quebrar”, pois “os clientes” não teriam onde estacionar seus carros.
A resistência que o então prefeito Fernando Haddad (PT) encontrou naquele momento se refletiu na eleição seguinte. Todos os demais candidatos, de esquerda e direita, questionavam as estruturas de proteção. Eleito, João Dória (PSDB) não expandiu a rede cicloviária. Pelo contrário, removeu trechos. Vereadores se elegeram com a promessa de “acabar com as ciclovias”. E tentaram fazer isso, felizmente com pouco sucesso.
A ciclovia da R. Luis Góis talvez seja o caso recente mais emblemático. Após uma manobra política, a obra iniciada por Bruno Covas (PSDB), já em fase avançada, ficou parada por meses. Veio a ser concluída já na gestão Ricardo Nunes (MDB).
No entanto esse tipo de reclamação não é exclusividade de São Paulo: ela se repete em outras cidades do Brasil e do mundo. Mesmo em Copenhagen (Dinamarca), cidade referência na mobilidade por bicicleta, já houve resistência semelhante. Mas, aos poucos, moradores e comerciantes foram percebendo que as ciclovias não diminuíam o movimento do comércio, Ao contrário: aumentavam.
Muito mais vendas
Nova York é uma das maiores cidades do mundo, comparável a São Paulo em volume e densidade de pessoas. A construção de ciclovias por lá enfrentou as mesmas reclamações que aqui, mas também retorno econômico para o comércio. Retorno que também ocorre por aqui, mas os empresários estão de olhos fechados.
Um estudo do Departamento de Transportes de Nova York mostrou que vias com ciclovias e boas calçadas aumentam o volume de negócios, mesmo em tempos de recessão. Depois da construção de ciclovias na 9th Avenue, negócios locais registraram aumento de 49% em vendas. Em outros pontos de Manhattan, que continuaram sem estrutura cicloviária, o crescimento foi de apenas 3%.
Já na avenida Vanderbilt os resultados foram ainda melhores. Após três anos de ciclovias, comerciantes registraram um aumento de 102% nas vendas. No restante da região, o volume máximo atingido foi de 18%. Quem não quer um crescimento de 102% em seu negócio?
O mesmo efeito é notado em vias que foram fechadas para carros e transformadas em áreas apenas para pedestres. Após a conversão de uma área de estacionamento no Brooklyn em boulevard, houve aumento de 179%! Em locais próximos, onde carros ainda trafegam, o crescimento das vendas foi de apenas 18%.
Ciclistas consomem mais
Ah, mas quem vai de carro gasta mais porque pode carregar mais coisas, certo? Errado. Pesquisadores da Portland State University questionaram consumidores em diferentes tipos de comércios, restaurantes e bares. Avaliaram quanto gastavam, com que frequência consumiam e qual o tipo de transporte utilizavam para fazer compras.
O resultado mostrou que quem chega de carro gasta mais por visita, mas quem vai de bicicleta visita o local mais vezes. Na média total, essas pessoas consomem mais. Os clientes iam ao mercado de carro 9,9 vezes por mês, em média, gastando cerca de US$ 7,98 por visita. No total, US$ 79,73 mensais. Já quem estava de bicicleta visitou mercados 14,5 vezes e gastou US$ 7,30 por viagem, em média. Isso dá um total de US$ 105,66 por mês, gastando 32,5% a mais nesses estabelecimentos.
Um estudo feito em uma rua comercial de Melbourne (Austrália), apontou que quem chegava de carro gastava em média AU$ 65 por hora. Um ciclista consumia menos, AU$ 47/h, o que a princípio pode parecer uma desvantagem. No entanto, onde caberia um único automóvel é possível estacionar pelo menos seis bicicletas, somando AU$ 283/h. Mais que quatro vezes o retorno de uma vaga para carros. O levantamento foi feito pela planejadora urbana Alison Lee, em sua tese de mestrado para a University of Melbourne.
Aumento também em São Paulo
Você, caro leitor, pode estar pensando que esse números são bem legais, mas não se aplicam à realidade de São Paulo, certo? Pois bem, vou lhe mostrar o contrário.
A lanchonete Hooters da Vila Olímpia é um bom exemplo disso. Ela fica em um trecho onde hoje há ciclovia permanente, mas mesmo quando havia apenas uma Ciclofaixa de Lazer, funcionando somente aos domingos e feriados, já perceberam uma mudança.
Após a instalação de suportes (paraciclos) para atrair os clientes que passavam de bike, o faturamento aumentou 15% em média, nos dias de ativação da estrutura de lazer. Foram oito suportes na calçada, em um total de 16 vagas (2 bikes por suporte). “Tem dia que não sobra vaga. Para as novas unidades, já planejamos investir em paraciclos”, afirmou à época o CEO da Hooters, Marcel Gholmieh. Ele conta que em dias de semana, mesmo antes da ciclovia ser implantada, o espaço já vinha sendo aproveitado por clientes. Uma clara demonstração de que o veículo de duas rodas vem ganhando status de meio de locomoção e não apenas de lazer, há muitos anos.
Também na Vila Olímpia, na rua Funchal, o The Fifties seguiu o mesmo caminho e instalou paraciclos para melhor receber o público de bicicleta. Foram instalados sete suportes em U invertido (14 vagas) e a demanda gerou uma ação diferente. “A procura é tão grande que o gerente comprou corrente e cadeado para os clientes que queriam prender a bicicleta ali e não tinham o equipamento”, relatou em 2015 o gerente de marketing, Paulo Henrique.
Clientes potenciais passando na porta
Empresa especializada em fornecer estruturas para o estacionamento de bicicletas, a Ciclomídia foi a responsável por ajudar as duas marcas. “Os comerciantes que estão reclamando das ciclovias em frente aos seus estabelecimentos estão olhando apenas para o lado vazio do copo. Deixam de ver a ótima oportunidade de atender uma demanda que existe e que hoje não atendem. Ciclistas também são consumidores”, afirma o proprietário, Eduardo Grigoletto.
Por outro lado, há uma série de comerciantes que mesmo antes da implantação das ciclovias já perceberam o retorno positivo que elas trazem. “Eles nos procuraram para adequar seus comércios para receber bem quem chega pedalando. E estão faturando com isso”, conta Grigoletto.
Em agosto de 2015, com a iminência da abertura da Avenida Paulista às pessoas aos domingos, havia a preocupação de que o comércio teria prejuízo. A presidente da Associação Paulista Viva à época, Vilma Peramezza, chegou a declarar que haveria “de 30 a 40% de prejuízo” com a medida. Entretanto, os comerciantes da região rapidamente perceberam que as vendas aumentavam com mais pessoas passando a pé e de bicicleta, no lugar dos automóveis.
Local para estacionar e descontos
A tradicional Confeitaria Vera Cruz, localizada no Tatuapé, é outro estabelecimento que disponibiliza suportes para o cliente ciclista. Um espaço para o cliente amarrar seu cão era utilizado por ciclistas, gerando conflitos pela falta de espaço para os pets e atrapalhando o fluxo de entrada e saída.
O proprietário, João Orlando Junior, optou então por instalar paraciclos na calçada em frente à confeitaria. “O número de pessoas que frequentam a padaria de bicicleta triplicou aos finais de semana”, diz Orlando Junior, também ciclista. “Queremos instalar mais dois em um futuro breve.”
Há locais que, além de terem local adequado para estacionar as magrelas, ainda oferecem descontos e vantagens para os adeptos das pedaladas. É o caso do Twin Burger, que dá 5% de desconto para quem for de bicicleta.
“O sucesso está em saber aproveitar as oportunidades e se adaptar. Enquanto uns reclamam, outros transformam o ‘problema’ em oportunidade“, conclui Grigoletto.
Ótima notícia! De qualquer forma, mesmo que não fosse verdade, seria igualmente importante a implantação de ciclovias e paraciclos para o cidadão que deseja usar a bicicleta como meio de transporte.
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Aqui em Curitiba, como quase todos tem carro, quando chego em um comércio com a minha magrela, nem me olham na cara. ” Essa é dura!” Como não ligo, vou em frente. Em frente ás farmácias, nunca tem um paraciclo; então, entro com ela. Levo bronca, mas digo: Se a roubarem, a farmácia paga? Diante da negativa, aceita…
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Isso de comerciante dizer que “sem as vagas, vão perder clientes” é exagero e até terrorismo! Muitos não querem é perder as vagas para pararem os próprios carros! Isso acontece muito aqui em Ribeirão! Como pode um comércio que acabou de abrir as 8 horas e já ter carro parado? Muitas vezes são os próprios comerciantes e funcionários que deixam os veículos durante todo o horário de expediente!
Dai se um cliente precisar estacionar, não vai conseguir!
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O link para o artigo de Melbourne não está mais funcionando 🙁
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Até as ciclofaixas poderão ser alvo de publicidade, como é demonstrado neste graffitti em bike Lanes.( e lá as bike lanes, ou ciclofaixas, não são pintadas de vermelho, o que torna o graffiti em ciclofaixas muito mais interessante ). http://www.muxu.cc/blog/mario-kart-bike-lane-in-portland/
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Os bancos também deveriam se atentar a isso e colocar paraciclos em frente aos caixas eletrônicos. Sempre que ou em algum banco amarro a bike em alguma grade ou corrimão.
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Acho bom mandar uma carta ou e-mail para o gerente geral da agência do banco prõximo ou de preferência para instalarem paraciclos, ou reservarem vagas ( se tiverem estacionamento ) com paraciclos. Assim, os paraciclos estarão mais disponíveis. Recentemente, implementaram uma ciclofaixa, na avenida próxima á minha casa, em que há vários bancos. Não preciso de ir de bicicleta, mas em prol de gente que anda de bicicleta ( porque vejo muitos parando nas grades dos bancos ), e, há carros demais parados em lugares indevidos, vou fazer uma campanha pessoal, começando pelo Banco do Brasil.
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Aliás, creio que a prefeitura deveria priorizar áreas de comércio da periferia que foram afetadas pela ciclofaixas. Seria uma forma de compensação, por perda de clientes que vem de carro, por clientes que andam de bicicleta.
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Gostaria de saber se dispoe de mais dados a respeito do impacto das ciclovias para o comércio paulistano, pois para a afirmação que faz a matéria, acredito que se basear em 3 depoimentos nao seja suficiente… O debate é interessante e muito me interessa…
Se houverem mais dados gostaria de conhece-los…
obrigada…
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Isso é fato, por exemplo no Starbucks da berrini já deixei de ir varias vezes pq eles tem 5 vagas de carro e sempre esta cheio, entao percebi que eles tem paraciclos e percebi que sempre tem de 2 a 4 bikes e comecei a ir de bike tambem, mas o legal é que ocupa um cantinho menor que 1 carro e tem capacidade para mais clientes, aos domingos devido a ciclofaixa já cheguei a ir e ter 10 bikes e 5 carros.
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