Foto: Willian Cruz/Vá de Bike

Os motivos da greve dos entregadores de aplicativo

O que leva os entregadores de app a fazerem uma paralisação nacional? Entenda aqui

De chinelos e na chuva, ciclista entregador corre atrás de seu sustento. Foto: Willian Cruz/Vá de Bike

Os trabalhadores que fazem entrega por aplicativo, tanto com motocicleta quanto pedalando, realizaram uma paralisação nacional no dia 1º de julho de 2020 e pretendem repetir a mobilização no dia 25 desse mês (julho). Para entender as reivindicações da categoria e o que os motiva a realizar essa greve, é preciso entender as condições em que trabalham.

Condições precárias, remuneração baixa

A Associação Brasileira do Setor de Bicicleta, Aliança Bike, realizou uma pesquisa em 2019 para entender a realidade dos entregadores ciclistas. Divulgamos um vídeo recentemente com um apanhado geral desses números e entrevistas com alguns entregadores – entre eles uma mulher. Assista aqui.

“A alimentação é a coisa
que mais dói,
ter que trabalhar
com fome carregando
comida nas costas”
Galo, Entregadores Antifascistas

O estudo apurou que a maioria desses ciclistas são negros, moradores da periferia e jovens de até 22 anos, trabalhando de 9 a 10h por dia e todos os dias da semana, sem descanso. A média dos rendimentos é de R$ 936 mensais. Muitos optam pelas entregas por ser um trabalho sem processo seletivo e por permitir, ao menos em tese, flexibilidade de horário.

Esses números podem ter sofrido alguma variação com o aumento de entregadores durante a pandemia, mas servem como norte para traçar um perfil de quem faz entregas em bicicleta através dos apps.

Já naquele momento, um ano antes da greve de agora, a pesquisa indicava que as principais demandas desses trabalhadores era um “local de apoio com água, banheiro, tomada e oficina”e um “seguro de invalidez temporária” que garantisse alguma remuneração caso tivessem que parar de trabalhar por algum tempo, por questões de saúde ou em consequência de acidente.

“Tem entregador que pedala,
pedala, pedala o dia inteiro.
O cara está tão preocupado
em sobreviver, que quando
chega 23h ele esquece que
tem que voltar pra casa.
Sabe o que ele faz? Ele
dorme na rua, porque não
aguenta pedalar 30 km
pra voltar pra casa!”
Galo, Entregadores Antifascistas

Queda de ganhos durante a pandemia

Com muita gente praticando o isolamento social, as entregas aumentaram e os entregadores devem estar ganhando mais com isso, correto? Bem, talvez não.

Uma pesquisa recente, feita pela Rede de Estudos e Monitoramento da Reforma Trabalhista (Remir Trabalho), trouxe algumas informações adicionais – e preocupantes. 60,3% dos entrevistados afirmam ter havido queda na remuneração com a pandemia de coronavírus, comparando com o momento anterior.

“A Rappi em março teve um aumento de 300% do número de cadastros. Provavelmente aumentou o contingente enquanto está rebaixando o valor da hora de trabalho sem deixar isso claro. Inclusive não há nenhuma pré-determinação do valor mínimo da hora de trabalho desses motociclistas”, afirmou à BBC Brasil Ludmila Costhek Abílio. Ela é professora da Unicamp e uma das coordenadoras do estudo.

“A gente sabe que as empresas estão ganhando muito mais, tanto é que elas pararam de divulgar o faturamento. Sabemos que a Rappi em fevereiro tinha tido crescimento de 30% na América Latina, mas depois não temos mais dados”, relata Abílio. “O mais importante pra gente pensar agora é que os motofretistas [e os ciclistas entregadores] viraram trabalhadores de serviço essencial e precisam ser valorizados”, completa a pesquisadora.

Reivindicações

De acordo com o perfil @tretanotrampo, que tem divulgado a paralisação nacional e trazido esclarecimentos e informações em linguagem simples e direta, as reivindicações são:

1 AUMENTO DO VALOR POR KM
Motociclistas e ciclistas reclamam do valor por quilometragem, que resulta em necessidade de trabalhar por tempo acima do aceitável.

2 AUMENTO DO VALOR MÍNIMO
É a taxa mínima por entrega, que precisa ser um valor “que compense ligar a moto ou subir na bike”.

3 FIM DOS BLOQUEIOS INDEVIDOS
Os trabalhadores acusam as empresas de bloquear ou desligar entregadores “sem motivo”. Alguns alertam para o que chamam de “bloqueio branco”, que é quando o entregador continua cadastrado, consegue acessar o sistema, mas pode rodar o dia todo que não vai receber nenhum chamado. Pedem ainda que as empresas coloquem de volta no sistema quem teria sido bloqueado injustamente.

4 FIM DA PONTUAÇÃO E RESTRIÇÃO DE LOCAL
Segundo a pauta divulgada pelos trabalhadores, alguns sistemas como o da empresa Rappi possuem um sistema de pontuação, na prática os obrigaria a trabalhar nos finais de semana para consigam juntar pontos que os tornam aptos a trabalhar nos outros dias.

5 SEGURO DE ROUBO, ACIDENTE E VIDA
Caso aconteça um acidente enquanto se está trabalhando para a empresa, o ciclista ou motociclista fica descoberto e, além de arcar com possíveis custos de tratamento, ainda fica sem nenhum rendimento enquanto se recupera.

6 AUXÍLIO PANDEMIA (EPIs E LICENÇA)
Pede-se também que as empresas dos aplicativos ajudem com equipamentos de proteção contra o coronavírus. A demanda também inclui alguma forma de auxílio-doença caso contraiam a Covid-19 e precisem parar de trabalhar para se recuperar.

Como ajudar?

Não é entregador, mas quer manifestar apoio à causa? O que o pessoal pede nesse dia:

1Não peça nada pelos aplicativos nesse dia: aproveite para fazer uma comida em casa e postar nas redes com as hashtags de apoio.

2Avalie os apps negativamente nas lojas de aplicativo e poste comentários em apoio à paralisação

3Apoie e divulgue a paralisação nas redes sociais, usando as hashtags #BrequedosApps e #ApoieoBrequedosApps

Publicamos algumas imagens nas nossas redes sociais esclarecendo os motivos da paralisação do dia 1º, que ajudam a entender a situação e as demandas:

Quem são os ciclistas entregadores?


1 comentário em “Os motivos da greve dos entregadores de aplicativo

  1. Interessante post. Discordo da pesquisa sobre serem negros os entregadores. Aqui em Curitiba já recebi literalmente centenas de entregas. Com muito esforço dá para considerar alguns dos entregadores Negro de cor bem clara, se é que existe isso. Deve refletir a realidade aqui da cidade que é muito raro ter pessoas realmente negras. Quantos aos pontos pedidos, se pedir mais caro por KM muitas pessoas irão fazer o pedido e buscar no local. Quanto ao seguro o entregador pode fazer por conta própria, mas concordo que o aplicativo deveria ter um “convênio” com seguradoras para o entregador contratar o seguro direto no app a cada entrega.A empresa não tem que dar auxilio doença, isso já tem no INSS é só o empregador pagar. Eu sou autônomo e só tenho isso porque pago INSS. Essa questão de bloqueios brancos é uma sacanagem se existir, mas difícil de provar e não entendo qual seria a vantagem para a empresa fazer isso? No Final acho justo eles fazerem o protesto. Espero que alguns dos pontos possam ser achados um meio termo.

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