Ao pedestre, com carinho
Como os carros se preparam para causar menos danos em caso de atropelamento
Por Cristiano Hickel (*)
Não é piada, é a capa da revista Quatro Rodas de abril.
“(…) Mas o tempo em que a vida do atropelado dependia só da ação dos médicos e dos socorristas está ficando no passado. Hoje, a sobrevivênvia do pedestre num choque também está nas mãos de engenheiros automobilísticos.”
Nunca na mão do motorista.
“(…) Numa colisão frontal, o joelho é o primeiro a sofrer o impacto contra o pára-choque, uma fração de segundo antes de a cabeça encontrar a resistência do capô ou do pára-brisa. (…) Outra parte dos ferimentos é causada pelo choque da pessoa contra chão. Isso não tem jeito. O que dá para fazer é minimizar o impacto do veículo com o pedestre.”
Educar os motoristas não tem jeito. O que dá para fazer é tirar pedestres de circulação.
Não sei se dou risada. Será que não entendi a ironia? Estou pasmo.
Prossegui minha leitura, duvidando que pudesse piorar, tentando ser otimista e encontrar o tom do texto, mas eis que:
“(…) Muitos fabricantes largaram na frente e já adotam novas soluções e tecnologias para tornar o golpe menos desleal. A maioria se concentra no capô e no pára-choque e funciona bem para acidentes com velocidades urbanas, de no máximo 50km/h. Soluções não faltam. A mais empregada é o uso de materiais mais maleáveis que o aço, como o alumínio…”
AAAAAHAHAHAHAHA! HHEHEHEHEHEHAHAHAHA! Cof! Cof! Coff! Hehehehe. Agora entendi! Trata-se de uma bricadeira, assim como essas “pegadinhas”.
A partir de agora vou andar com um daqueles martelos de borracha preso ao quadro da bicicleta. Precisa explicar pra quê?
Por mais radical que eu tenha me tornado nesses últimos anos, convenhamos, isso não é sério. É?
Ainda não acabou:
“Enquanto os fabricantes estudam maneiras de minimizar o impacto de um atropelamento, algumas montadoras já pensam em como evitá-lo. (…)”
Óh! Li o início desse parágrafo e recuperei esperanças! Alguém lúcido no mundo automobilístico. Vamos ver o que diz o resto:
Veja aqui um estudo da Rede Sarah de hospitais de reabilitação sobre a dinâmica dos atropelamentos. A uma velocidade de 32km/h, 5% dos acidentados morrem. |
“Em parceria com a DaimlerChrysler, a Volkswagen desenvolveu um Passat que vê o pedestre, prevê o acidente e faz de tudo para que ele não aconteça. (…) Se a pessoa corre risco, os freios ABS são acionados automaticamente (…) se o carro estiver a 40km/h, o dispositivo reduz a velocidade em menos de 1 segundo para até 11,2km/h, número quase inofensivo para um atropelado.”
Pffff. Bem que eu tentei… O indivíduo que considera 11km/h quase inofensivo é porque, certamente, só tira a bunda de dentro do carro pra ir ao banheiro – completamente sem noção. Se eu acelerar uma placa de aço a 10km/h em direção à cabeça dele, será que machuca?
Já perdeu a graça, não é? Estou quase no fim:
“(…) “É difícil adaptar um modelo às normas. Materiais bons para o pedestre nem sempre protegem os ocupantes.””
Se o condutor ganhasse uma descarga elétrica proporcional à intensidade da batida no pedestre e a dor causada, estaríamos de igual para igual. Porque não invertemos essa lógica?
Por fim, reservei essa pérola de depoimento, o qual testemunha o caráter individualista e irracional intrínseco ao motorista padrão:
“(…) “É difícil fazer o consumidor pagar mais para proteger o outro,” diz Jean-Marie Mortier, diretor da Euroconsummers, uma associação européia para o direito do consumidor.”
Ou seja, os outros que se danem.
Fazendo uma análise mais criteriosa, se juntarmos outros fatos recentes (o comercial da Fiat, por exemplo, entre muitos outros) podemos observar que trata-se de uma ação desesperada e covarde da indústria automobilística em resposta à reação que o mundo está dando à esse padrão insustentável.
Em outras palavras, podemos perceber como a indústria está se defendendo para justificar a venda de automóveis em meio a uma discussão mundial muito forte, que trata de mudanças climáticas, combustíveis, saúde pública, etc., onde o automóvel é o protagonista.
Será que estou ficando louco?
(*) Cristiano Kern Hickel, estudante de Engenharia Ambiental, pesquisa fontes alternativas de energia e atualmente tem debatido a temática Mobilidade Urbana dentro dos preparativos da Conferência Municipal do Meio Ambiente em Porto Alegre. É representante da Transporte Ativo no RS.
Fabuloso seu artigo!
Ainda há vida inteligente e que consegue distinguir o lado negro da força por trás do marketing e da simulação surreal vinculada pelas empresas e mídia!
Parabéns!
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Estudo sério, esse da Quatro Rodas? Nem aqui nem lá na PQP!!!! Mande o autor dessa asneira rasgar o diploma do primário, porque nem à educação básica que tem ele faz jus!
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Sim, você está ficando louco. Loucura é exatamente isso.
Mas se vc quer q alguém te ajude a amarrar a camisa de força, vai ter que desamarrar a minha primeiro.
É, cara… também fiquei indignado com essa propaganda da FIAT que minha mãe acha “tão bonitinha”. Já tô até contrariando minha mãe. Tô maluco mesmo.
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Putz esse “estudo sério” doeu meus ossos!!!
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