Ciclovia do Rio Pinheiros será inaugurada com apenas dois acessos
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No dia 11 de fevereiro, o Vá de Bike foi convidado, junto com outros cicloativistas e entidades, para uma reunião na Secretaria de Esportes do município de São Paulo em que foram apresentadas as ciclovias do Autódromo de Interlagos e do Rio Pinheiros. Quem nos acompanha pelo Twitter teve informações em tempo real sobre a apresentação.
Nessa reunião foram apresentadas várias informações sobre a Ciclovia Rio Pinheiros, inclusive a de que ela seria aberta ao público ainda esse mês. Nessa semana, chegou através do Instituto CicloBR a notícia de que a data prevista é dia 27, próximo sábado.
Faltam acessos
Como todos já perceberam, a Ciclovia Rio Pinheiros tem como principal (e grave) problema a falta de acessos para que o ciclista possa utilizá-la. Só há acessos nas duas pontas da ciclovia, distantes 14km uma da outra. Se você não estiver próximo de uma das pontas e se dirigindo a algum lugar perto da ponta oposta, a ciclovia não servirá para NADA em seu deslocamento e você continuará tendo que pedalar na Marginal, ou fazendo caminhos bem mais longos e cheios de desvios e subidas para evitar a via “expressa” e assassina.
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Já em setembro, quando percorremos o percurso completo da ciclovia a convite da CPTM, chamamos atenção para a falta de acessos, apontando a adaptação das pontes como possível solução. Em 5 de outubro, ao listar sugestões para a nova ciclovia, alertamos que “se só tiver um [acesso] em cada ponta, ou se mesmo tendo vários eles não forem fáceis de usar, a ciclovia não terá muita utilização, os ciclistas vão preferir ir por fora, mesmo correndo risco”. E no dia seguinte, ao comentar a uma reunião de apresentação do projeto da ciclovia (em que se notou a ausência da Secretaria de Transportes e da CET, que DEVERIAM estar presentes já que se trata de mobilidade), dissemos textualmente que “sem acessos, não funciona para o transporte, só para passear“, reforçando que por mais que sejamos simpáticos ao projeto, não há como negar isso.
O ideal seria fazer acessos em TODAS as pontes do percurso, integrando a ciclovia ao fluxo viário. Mas, por mais que a CPTM e a Secretaria de Esportes se esforcem, por questões POLÍTICAS e POR PURA MÁ VONTADE outros órgãos do município dão a desculpa de que não podem incentivar a presença de ciclistas na rua porque haveria mais acidentes (CET), ou de que isso seria uma descaracterização das pontes (SIURB), não permitindo que se faça isso.
A má vontade, o preconceito e a falta de visão do todo de algumas pessoas em cargos medianos na administração municipal não seria empecilho para um projeto desse porte e importância, se tivéssemos um prefeito firme e bem intencionado em relação à mobilidade, ou um Secretário de Transportes que levasse a sério seus próprios e raros discursos pró-bicicleta e sua posição como coordenador do grupo Pró-Ciclista. Mas eles preferem fazer vista grossa e se ausentar das discussões sobre o assunto (que não foram poucas), restando à Secretaria de Esportes e à CPTM tentar convencer empresas particulares a patrocinar a construção de acessos, ou solicitar projetos mirabolantes de pontes exclusivas para bicicletas a um custo unitário em torno de R$ 1 milhão, quando poderiam resolver de forma rápida e barata com rampas feitas com estruturas tubulares ligando a ciclovia a cada ponte. Essa situação chega a ser ridícula, para não dizer ofensiva, e mostra a falta de seriedade com que a bicicleta é vista pelo prefeito Kassab e, principalmente, pelo uber secretário Alexandre de Moraes.
A verdade é que a Secretaria de Transportes e seu órgão que deveria tratar de mobilidade, a CET, não querem oficializar apoio ao uso da bicicleta nas ruas da cidade de São Paulo e tentam restringi-la a ciclovias, ciclofaixas de lazer e parques. Provavelmente a opinião pessoal do secretário é que as bicicletas atrapalhariam os carros. Como se 50 bicicletas na faixa direita de uma avenida de três pistas, por exemplo, causassem o mesmo congestionamento de 50 carros espalhados por todas as faixas dessa mesma avenida. Não é preciso ser especialista em trânsito para perceber que não (teoricamente, o secretário é – ou já deveria ter se tornado – um especialista no assunto). Os carros JÁ atrapalham uns aos outros e a todo mundo e dificultar o uso da bicicleta, o pedestrianismo e o uso de transporte público é trabalhar para colocar mais carros na rua, complicando cada vez mais a situação.
Omissão
Outra restrição que fica cada vez clara para nós cicloativistas é que esses mesmos órgãos não querem adotar postura oficial de apoio ao uso da bicicleta nas ruas porque temem se tornar responsáveis pela segurança dos ciclistas. Sem apoiar esse tipo de uso, podem fechar os olhos e virar as costas à atual situação, dando a entender que o ciclista sabe o risco que está correndo ao usar uma avenida. Mas os órgãos de trânsito JÁ SÃO responsáveis pela segurança dos ciclistas, conforme o Art. 21 do Código de Trânsito. A LEI já diz isso. Esses órgãos têm sido omissos com a maior parte da população, como se sua obrigação fosse trabalhar apenas para a fluidez do tráfego de automóveis, tirando de seu caminho caminhões, ônibus fretados e de linha, pedestres e ciclistas.
Hoje, muita gente já utiliza a Marginal Pinheiros, assim como a Tietê, para seus deslocamentos diários de bicicleta. São caminhos retos e planos, geograficamente ideais para os ciclistas. E sem acessos em todas as pontes dessa nova ciclovia, esses ciclistas continuarão circulando na pista local, pois precisam e tem esse direito – inclusive nas Marginais, que também se enquadram no art. 58 do Código de Trânsito. Acessos em todas as pontes economizariam tempo e dinheiro da administração pública, mas principalmente vidas de ciclistas. Porém, algum assassino indireto acredita que as ruas são para os automóveis, o ciclista que compre um carro se quiser utilizar a via.
Vantagem ou desvantagem?
Apesar da ciclovia só atender à demanda de mobilidade de alguns poucos sortudos como nosso leitor Roberto, que tem no traçado da ciclovia exatamente a rota que precisa percorrer para chegar ao trabalho, ela é importante por ocupar um espaço que poderia ser perdido para outros fins e que merece ser usado para deslocamentos por bicicleta. Melhor reservar esse espaço agora, implementar como for possível nesse início e melhorar depois.
Se desconsiderarmos todo o blá blá blá teórico e pouco prático sobre mobilidade que sempre acompanha os comentários e anúncios sobre essa obra, o que nos resta é o uso para lazer. Apesar da urgência que a cidade tem de iniciativas a favor do uso da bicicleta como meio de transporte, a criação de espaços de lazer continua importante. Essa seria, portanto, outra vantagem dessa ciclovia.
Ônus e bônus
Toda ciclovia e ciclofaixa tem seus ônus e seus bônus. Como ônus, temos a segregação e o aumento do “apartheid veicular” que rege a cidade: quanto mais ciclovias, mais aumenta a idéia preconceituosa e anticidadã de que as ruas foram feitas para os carros e lugar de bicicleta é na ciclovia e no parque. Eu mesmo já levei uma “fina” assassina de um taxista que se justificou dizendo que “a ciclofaixa é só de domingo”, como se isso, mesmo que fosse um argumento válido, servisse de motivo para ameaçar minha vida apenas para me “educar”. Agora imagine como serão tratados dentro de pouquíssimo tempo os ciclistas que se utilizam da pista local da Marginal Pinheiros: maus motoristas se sentirão no direito de ameaçá-los com seus carros, pois afinal há uma ciclovia ali do lado e nada mais justo que jogar o carro em cima deles para demonstrar que deveriam estar nela.
Como bônus, essa ciclovia deveria ser um caminho que, além de seguro, fosse realmente útil, trazendo praticidade, rapidez e encurtando os deslocamentos dos ciclistas. Isso a Ciclovia Rio Pinheiros não traz e, se for deixada como está, terá sido um desperdício de dinheiro público e uma tentativa vã de mostrar serviço, que surtirá efeito contrário e pesará negativamente na época eleitoral.
Espero sinceramente que essa primeira fase seja apenas o tímido começo, e que as demais fases cheguem antes que o ônus da ciclovia se consolide como seu único legado.
Reclame, exija, seja cidadão
Pelo perigo do ônus que essa ciclovia pode trazer e para que ela não sirva apenas como cenário de propaganda eleitoral, torna-se IMPORTANTÍSSIMO que exerçamos constante pressão para que ela não seja largada do jeito que está, uma mera ciclovia de lazer. Envie cartas aos jornais, reclame aos vereadores através de e-mail, telefone ou presencialmente, entre em contato com a prefeitura, com a CET, com a Secretaria de Transportes. Se todo mundo abaixar a cabeça e ficar quieto, continuarão tratando ciclistas como marginais, como um povinho chato que insiste em atrapalhar os carros, como se não tivéssemos direitos nessa cidade.
Quem não usa o automóvel também é cidadão e merece respeito. A atual administração trata quem não utiliza o automóvel como cidadãos de segunda classe, deixando na mão quem utiliza transporte público, bicicleta ou os próprios pés como meio de deslocamento. Aos automóveis, projetos faraônicos de túneis, pontes e alargamento de avenidas. Às bicicletas, uma ciclovia de lazer que sai a fórceps. Aos usuários de ônibus, a lenta e silenciosa substituição de faixas exclusivas por faixas “preferenciais”. Aos pedestres, faixas de travessia sem pintura por meses e tempo semafórico de 12 segundos para travessia (quando há).
Saiba mais
Veja o relato do reconhecimento da pista e conheça pequenas ações de baixo custo e rápida implementação que protegeriam muito mais o ciclista do que algumas poucas e isoladas ciclovias feitas pela metade, como essa do Rio Pinheiros e mesmo a da Radial Leste, que não está terminada até hoje apesar de inúmeras e recorrentes promessas de conclusão.
E veja no vídeo abaixo o potencial de mobilidade, lazer e até turismo que existe na Ciclovia do Rio Pinheiros. É só fazer direito.
Soninha disse: “… tenho total confiança de que ninguém está tentando tapear os ciclistas, apenas fazer as coisas andarem e ir conquistando território. Senão a gente acaba caindo na armadilha do “ideal”
Eu não tenho confiança nenhuma! Novembro chegou e os outros acessos prometidos ainda estão no papel.
Ah.. mas agora não são mais necessários! Já elegeram o Alckmin!
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Luis, quando os cicloativistas viam a pista de serviço entre o trilho do trem e o rio, diziam: “Tem uma ciclovia pronta aí, porra! É só pintar o chão com uma bicicletinha e pronto”. Mas nunca é o caso de “simples faixa pintada no chão”. O que foi possível fazer rapidamente foi feito e ficou muito bom por enquanto; o que é mais demorado vai ser feito nos próximos meses. Da mesma maneira, corredores de ônibus e ciclofaixas não são só uma mão de tinta na faixa da direita… Eu também acho que tudo poderia ser mais rápido, tratado mais como prioridade, mas resolver problemas como cruzamentos e esquinas é bastante complicado, não é só pintar o chão. Sobre a megaobra na marginal: eu talvez não tivesse feito, não sei. Mas a marginal é uma artéria importante, não só para o maldito automóvel usado de maneira supérflua, mas para o transporte coletivo e de mercadorias, para a circulação de um modo geral. Uma melhoria na marginal beneficia muita gente, mesmo odiando o modelo “toda prioridade ao transporte motorizado”. E a obra afeta milhões de pessoas, então precisa mesmo ser feita com muito empenho ($ e agilidade). Mesmo custando caro, equivale a um vigésimo do que o governo está investindo em transporte sobre trilhos. (Além do que, o governo do estado é uma coisa e a prefeitura é outra. Não dá pra cobrar o estado pela CET).
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Boa tarde meus amigos,meu nome é Debora Pavani,moro na desembocadura do rio grande ou rio jurubatuba,há 200 mts da represa Billings no Distrito de Pedreira,para nós aqui,da periferia,a ciclovia foi a melhor coisa que podia acontecer em termos de oportunidade de lazer,já que nada é feito pelo poder público nesta região,e como disse a soninha,é melhor começarmos com um pouco e avançarmos do que nunca começarmos!Willian por favor,como faço para entrar em contato com a Soninha?Obrigada,meu email é deborabela@yahoo.com.br
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Ótima matéria!
Mesmo com problemas acho que a ciclovia é de fato um primeiro passo. Concordo com a Soninha, se só o que for ideal for feito, quase tudo ficaria paralisado.
Portanto, o primeiro “round” ciclovia foi vencido. Ótimo! Vamos ao segundo “round” acessos.
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Pessoal, a que horas do sábado (27) abrir-se-ão os portões da ciclovia?
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Juliano, a inauguração será ao meio dia.
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Me parece que o ponto crucial é a orientação política. O esforço monumental na execução da “Nova” Marginal Tietê contrasta com a execução da ciclovia, somadas as proibições dos caminhões e dos fretados e a liberação dos corredores de ônibus nos finais de semana, não há dúvidas sobre qual transporte é prioridade para a prefeitura.
Acho que a subprefeita Soninha comete um equivoco ao defender que “é melhor pouco do que nada”, pois isso é argumento ganho, é o mesmo que explicar que a “chuva é molhada”. Claro que todos concordam com isso. A frustração real é a percepção das prioridades da prefeitura, com as quais, acredito, a maioria da população não concorda. Me refiro a maioria “numérica” e não a maioria “econômica”.
Ciclovias e corredores de ônibus podem ser implantados com simples faixas pintadas no chão e uma boa fiscalização. Isso, para mim, é pouco. Afinal, não inclui banheiros públicos ou bicicletários, mas é melhor do que nada. Porém é até mais barato do que a ciclovia inaugurada e revelaria uma outra prioridade em relação ao transporte público.
A disposição do governo Estadual em relação ao fumo encheu a cidade de fiscais dispostos a multar e impedir a atividade comercial que desrespeitasse a lei, mas não existe um agente da CET disposto a parar um carro ou uma moticicleta por direção perigosa, muito menos obrigar a mater-se a distância mínima de um ciclista. Não existiram obras no caso da lei anti-fumo, mas houve atitude.
Não creio em má fé, mas acho que a falta de vínculo entre representante e representado, que trás a necessidade absurda de “propaganda política” antes de uma eleição, leva o representante a trabalhar em função da realidade que experimenta: o carro, o helicóptero, os seguranças, o condomínio fechado; e não da realidade dos representados.
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Olá Willian,
Como sempre, ótimo texto!
Acho que cabe aqui uma errata: “… Aos automóveis, projetos faraônicos de túneis, pontes e alargamento de avenidas.”.
Graças à impermeabilização resultante dessas obras aos carros, não seria mais apropriado “alagamento de avenidas”? 🙂
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Curto e grosso, mas nem luz tem nisso, porra ? Quando não se quer fazer e se é obrigado, acaba nisso. Sai qualquer coisa. Haja paciência com essas pessoas que se intutulam meus representantes….
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