Vereadores de São Paulo se organizam para remover ciclovias
Integrantes da base aliada do prefeito João Doria insistem em projetos de lei que dão fim aos trechos destinados aos ciclistas
Na contramão das grandes cidades que incluíram a bicicleta como foco na questão da mobilidade urbana, São Paulo enfrenta uma dura queda de braço com vereadores que querem barrar os avanços já conquistados pelos paulistanos. O atual secretário de Mobilidade e Transportes de São Paulo, Sérgio Avelleda, declarou que esta é uma gestão amiga do ciclista, mas isso não tranquiliza quem se locomove de bicicleta na cidade, já que esses opositores à mobilidade em bicicletas são da base aliada do prefeito João Doria.
Entre os nomes que fazem coro para a retirada de diversos trechos de ciclovias está o da vereadora Edir Sales (PSD), que entregou um ofício para tentar acabar com as faixas destinadas às bicicletas na Vila Prudente (assine aqui para ajudar a mantê-las). Apesar de afirmar que as ciclovias atrapalham o tráfego de veículos, defende que os espaços que elas ocupam sejam transformados, em grande parte, em áreas para estacionamento. Entenda as incoerências dessa argumentação.
Aurélio Nomura (PSDB) é outro que se posiciona contrário às estruturas e levanta bandeira contra trechos na Vila Mariana – apesar de ter participado de discussões sobre o assunto ainda em 2011 e ter se envolvido no processo da ciclovia da Eliseu de Almeida em 2013, ocasiões em que teve oportunidade de se informar melhor sobre a importância e as vantagens de estruturas como essas não só para ciclistas, mas também para o comércio.
Outros vereadores que se mostram contrários à mobilidade segura em bicicletas são Mário Covas Neto (PSDB), que quer retirar as ciclovias do centro e se incomoda principalmente com as que passam ao lado da Câmara dos Vereadores; Camilo Cristófaro (PSB), que já é velho conhecido na defesa de retrocessos à mobilidade, chama as estruturas de “cicloguaches” e conseguiu interromper a implantação da ciclovia da avenida Ricardo Jafet; e o vereador João Jorge (PSDB), que apresentou um projeto de lei que pretende rever todos os trechos de ciclovia – e, enquanto forem analisados, eles deverão ser retirados.
Enquanto isso, Avelleda está entre a cruz e a espada, já que todas essas solicitações atravessam a sua gestão. O diálogo com ciclistas já teve alguns capítulos, mas nenhum encontro foi marcado por definições.
Só onde houver demanda
No PL mais radical, João Jorge propõe que a implantação de novos trechos cicloviários sejam realizados apenas após audiência pública e apresentação de estudos de demanda. “Os estudos serão promovidos sob a coordenação da Secretaria de Transportes Metropolitanos, como disposto na própria lei, e segundo o texto da alteração proposta. A realização de estudos técnicos é antes de tudo um dever do próprio poder Executivo. Durante a gestão Haddad tais estudos técnicos ou foram negligenciados, ou foram feitos de maneira inadequada. O objetivo do PL 223/2017 é reforçar a existência desse dever, deixando expressamente estabelecida esta obrigação”, disse o vereador em entrevista exclusiva ao Vá de Bike (veja abaixo).
É fato conhecido que as ciclovias têm efeito indutor de demanda. Em São Paulo, o uso da bicicleta aumentou 66% entre 2014 e 2015, quando as estruturas começaram a ser implantadas em larga escala. Só na Rua da Consolação, a quantidade de ciclistas mais que triplicou após a implantação da ciclovia (227%).
A estrutura da Faria Lima é o exemplo mais claro: implantada onde antes não havia praticamente nenhum ciclista trafegando, hoje tem mais de 2 mil viagens diárias, sendo a mais utilizada da cidade.
E para não ficar apenas nos exemplos paulistanos, Nova York também teve um aumento espantoso no uso da bicicleta após implantar 480 km de ciclofaixas num espaço de 5 anos, além de um grande corredor de ciclovias. O então prefeito Michael Bloomberg chegou a declarar que usuários de transporte público, ciclistas e pedestres eram mais importantes que os motoristas que congestionavam a cidade, além de afirmar que as ruas “não são para os carros”.
Desperdício de dinheiro público
ciclovias foram
“desperdício de
dinheiro público”
e devem ser removidas
Entre os itens que constam no PL, a adoção de ciclorrotas é um dos pontos defendidos pelo vereador. Segundo Jorge, esta seria a opção mais comum e barata adotada por diversas cidades como Londres e NY.
“Além disso, os grandes investimentos feitos em ciclovias se mostraram como desperdício de dinheiro público, sendo mais recomendável apostar daqui pra frente em ostensivas campanhas para a educação no trânsito”, completa.
“Fina educativa” seria culpa também do ciclista
Para o vereador, a famosa “fina educativa” (quando um motorista passa perigosamente perto de um ciclista, com o objetivo de “educá-lo” a não utilizar a rua) reflete a falta de campanhas de conscientização – mas não apenas para os motoristas. “É fruto da deficiência na formação dos nossos condutores e ciclistas”, afirma João Jorge.
“O mais adequado e correto seria investir em uma melhoria na educação de trânsito. Este, inclusive, é um problema grave de ética e convivência entre as pessoas no ambiente urbano. Da mesma forma, alguns maus condutores de veículos também não respeitam as ciclofaixas e uns poucos ciclistas desrespeitam os pedestres”, aponta.
Entrevista
Confira a seguir a íntegra da entrevista com o vereador João Jorge:
Vá de Bike: No seu projeto de lei o senhor propõe que a implantação de novos trechos cicloviários sejam realizados após audiência pública e apresentação de estudos de demanda. Quem seria responsável por esse tipo de estudo? Qual é o custo estimado para essa ação?
João Jorge: Os estudos serão promovidos sob a coordenação da Secretaria de Transportes Metropolitanos como disposto na própria Lei e segundo o texto da alteração proposta. A realização de estudos técnicos é antes de tudo um dever do próprio poder Executivo. Durante a gestão Haddad tais estudos técnicos ou foram negligenciados, ou foram feitos de maneira inadequada. O objetivo do PL 223/2017 é reforçar a existência desse dever deixando expressamente estabelecida esta obrigação.
VdB: O PL prioriza os espaços compartilhados por carros e bicicletas. Em que o senhor se baseia para priorizar esse modelo de espaço cicloviário?
JJ: A adoção de ciclorrotas como alternativa de um sistema cicloviário é a opção mais comum e barata adotada por diversas cidades como Londres e NY. Além disso, os grandes investimentos feitos em ciclovias se mostraram como desperdício de dinheiro público, sendo mais recomendável apostar daqui pra frente em ostensivas campanhas para a educação no trânsito.
VdB: O senhor já pedalou na rua ou em ciclovias? Qual foi a sua sensação?
JJ: Sim, foi ótimo. Já usei muito a bicicleta para estudar e trabalhar. Aliás, é uma excelente opção de transporte, lazer e hoje se constitui num importante modal de transporte em São Paulo.
VdB: O senhor conhece/convive com ciclistas ou pessoas que usam a bicicleta como meio de transporte? O que o senhor ouve dessas pessoas?
JJ: Sim. Eu ouço muitas coisas, inclusive que pedalar faz bem à saúde e que gostariam de ciclovias mais seguras. Todas as opiniões, inclusive de pedestres, moradores de áreas afetadas pelas ciclovias e ciclofaixas, condutores de transportes públicos, taxistas e demais motoristas foram levadas em consideração na redação do PL.
“Finas educativas” seriam também
falta de formação dos ciclistas,
de acordo com o vereadorVdB: O senhor conhece o termo “fina educativa”? No seu PL, como o senhor pretende enfrentar esse tipo de ação que os ciclistas sofrem diariamente?
JJ: Conheço e isto é fruto da deficiência na formação dos nossos condutores e ciclistas. O mais adequado e correto seria investir em uma melhoria na educação de trânsito. Este, inclusive, é um problema grave de ética e convivência entre as pessoas no ambiente urbano. Da mesma forma, alguns maus condutores de veículos também não respeitam as ciclofaixas e uns poucos ciclistas desrespeitam os pedestres.
VdB: Por que o senhor quer centralizar a execução na Secretaria Municipal de Mobilidade e Transporte? Qual é o objetivo? Por que não levar em consideração os planos regionais estratégicos?
JJ: Porque a Secretaria tem maior capacidade de coordenação para a constituição de um sistema cicloviário que de fato seja paulistano, orgânico, interligando diversos bairros. É importante destacar que a atividade de coordenação deverá se dar com fortes contribuições dos cidadãos e dos demais entes da administração municipal, em especial das próprias Prefeituras Regionais.
Nova York investe em ciclovias e ciclofaixas
Por Willian Cruz
Ao contrário do que afirma o vereador na entrevista, a cidade de Nova York, nos Estados Unidos, vem ampliando as ciclovias como parte do programa Vision Zero de segurança no trânsito. “Adaptando as melhores práticas da Europa e ao redor do mundo, o DOT [Departamento de Transportes] busca dobrar o número de ciclistas ativos e tornar Nova York a melhor cidade para pedalar nos Estados Unidos. O DOT irá criar pelo menos 16 km de ciclovias segregadas a cada ano, melhorar o acesso de bicicletas às pontes e explorar uma expansão da área de pedestres e ciclistas na Brooklyn Bridge”, afirma o plano estratégico do programa.
Em países com cultura consolidada de uso da bicicleta, motoristas que ferem ou matam ciclistas são inevitavelmente punidos pelos seus crimes, enquanto no Brasil os casos de atropelamento costumam resultar em impunidade ou em punições inócuas, como entrega de cestas básicas e multa. O compartilhamento das vias depende da premissa de que o motorista respeitará a vida de quem está na bicicleta e, em tese, é o que já temos nas ruas – e que claramente não tem funcionado.
Os números nos mostram que, ao menos por aqui, ciclovias e ciclofaixas são essenciais para preservar as vidas das pessoas que se deslocam em duas rodas sem motor: as estruturas que o vereador deseja retirar reduziram as mortes de ciclistas em 60% na cidade de São Paulo. Refletindo sobre o que representa essa estatística e ponderando que muitas pessoas poderiam não estar mais entre nós se não fossem as ciclovias, torna-se muito difícil concordar com as propostas do vereador. Ciclovias protegem, diariamente, centenas de milhares de vidas que por elas trafegam.
Ajude a defender o uso da bicicleta
A Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo (Ciclocidade) possui uma série de estratégias para o legislativo, organizadas há muitos anos por um Grupo de Trabalho. O GT de acompanhamento do poder legislativo é um dos mais importantes para a construção, fiscalização e consolidação de políticas públicas para a ciclomobilidade.
Neste momento, é preciso ampliar a participação neste GT e focar nas estratégias elencadas nas reuniões de Planejamento. Essas estratégias vão desde influenciar diretamente na tramitação dos projetos de lei, através de termo de cooperação assinado com a Comissão de Trânsito e Transportes no final do ano passado, até reuniões individuais com vereadores e presença constante e massiva em audiências públicas.
Para colocar isso em prática, a Ciclocidade está precisando de ajuda. Se você quer fazer parte deste GT, deixe seus dados neste formulário. Sua participação nesse processo pode ajudar a mudar os rumos da ciclomobilidade paulistana.
Já começaram a remoção da ciclovia na rua siqueira bueno aqui na mooca. Fiquei muito triste, pois eu uso essa ciclovia. Alguém tem alguma ideia para nos mobilizarmos? Vejam o vídeo do vereador destruidor de ciclovias. https://www.youtube.com/watch?v=DC9CQ_VQzQ8
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o importante agora é saber que o mané do doria não vai fazer se quer um metro de ciclovia,mais quero saber o que ele vai fazer com a verba destinada a esse proposito,em tempos de corrupção acho que ele vai usar 0prol das suas campanhas politica,quer dizer vai desviar essa grana pois ninguem vai reclamar é tanta merda na politica que isso constara como um detalhe
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população da capital paulista,principalmente os ciclistas que fique de olho nessa gente para que na proxima elição os deixe de fora de cargos publicos ,esta combinado assim fode os ciclistas depois se fodem
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Não tem sentido gastar dinheiro removendo ciclovia. Se hoje algumas estão sub utilizadas deve se estudar o porque disso e buscar integrá-las (através de ciclovias ou ciclorrotas) com as ciclovias principais.
Mas infelizmente vejo muita gente de bicicleta não aproveitando as estruturas.
Eu pedalo sempre na Av. Dummont Villares e com frequência vejo o pessoal pedalando na faixa de ônibus (e ainda não consigo entense o pq disso…).
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aqui em Ermelino Matarazzo muitos cadeirantes e mulheres com carrinho de bebê utilizam a ciclovia de minha rua, pois as calçadas são irregulares.Dessa forma, defendo a manutenção da mesma.
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Não seria melhor defender a manutenção das calçadas?
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Absurdo o que estão fazendo apagando as ciclovias. O Brasil deveria incluir as soluções da mobilidade urbana e não destruir o que está feito. Absurdidade da gestão atual e desperdício de dinheiro público apagar as ciclovias que já estão prontas. Deveriam é aumentar a malha viária de ciclovias da cidade e não apagá-las.
Contramão.
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Oi, Tiago.
Se não conhece a cidade, melhor não opinar.
A gestão passada fez, sim, muitas ciclofaixas, mas também fez muitos quilômetros de ciclovias (com segregação física): a ciclovia da paulista, principal avenida da cidade. A expansão da ciclovia da Faria Lima, outra avenida importantíssima da cidade, que antes só tinha 2 km de ciclovia e agora possui uma ciclovia de quase 10 km integrada com a ciclovia da avenida Hélio Pellegrino, também criada pela gestão anterior. Também temos a ciclovia da Avenida Berrini, construída junto com o corredor de ônibus. Também a da Eliseu de Almeida.
E ainda outras.
Porém, a ciclovia nem sempre é a melhor solução. Para ruas menores, é muito mais eficiente em todos os sentidos fazer uma ciclofaixa (importante destacar que as ciclofaixas criadas na gestão anterior tem segregação por “tachões” ou por pequenos postes, então não é só a sinalização por pintura).
A ciclofaixa salva vidas. E sim, a tinta desgasta com o tempo, assim como a tinta das faixas de pedestres e outros tipos de sinalização de solo, como as próprias faixas dos carros. Mas isso não é motivo para não fazê-lo.
Espero ter ajudado com as informações,
Abraço!
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