Obra de ciclovia comemorada por ciclistas é suspensa em São Paulo

Gestão Dória suspendeu implantação que estava em andamento, após reclamação de vereador que declarou guerra às ciclovias. Plano cicloviário será revisto.

Acuada no canto da via e junto à mureta, em uma área da pista onde os carros já não circulam, ciclovia foi execrada por vereador e interrompida pela gestão João Dória. Foto: Willian Cruz
Acuada no canto da via e junto à mureta, em uma área da pista onde os carros já não circulam, ciclovia foi execrada por vereador e interrompida pela gestão João Dória. Foto: Willian Cruz

Conforme as fotos foram viralizando nas redes sociais, os ciclistas paulistanos começaram a comemorar, apesar da dúvida sobre a obra ser um legado da gestão anterior ou a primeira ciclovia da gestão João Dória. Mas a alegria durou pouco. Muito pouco.

Sinalizada na esquerda da Avenida Ricardo Jafet, Zona Sul de São Paulo, a estrutura seria importante para ligar ao menos três outras ciclovias, em uma avenida plana que só não é mais utilizada hoje por quem circula de bicicleta na região devido à agressividade dos motoristas e à presença constante de ônibus e caminhões.

Seria importante, porque a obra foi suspensa.

Mesmo sem retirar espaço dos carros, ciclovia foi duramente criticada e teve implantação suspensa. Foto: Willian Cruz
Mesmo sem retirar espaço dos carros, ciclovia foi duramente criticada e teve implantação suspensa. Foto: Willian Cruz

Devolvendo São Paulo aos carros

Assim que soube da sinalização de solo, o vereador Camilo Cristófaro (PSB) fez alguns vídeos expondo toda sua indignação com a implantação da estrutura, que lhe incomodou a ponto de perder as estribeiras em mais um vídeo caricato. Morador da Chácara Klabin e criador da associação de moradores do bairro, o dono de uma coleção de mais de 20 fuscas parece ter levado como ofensa pessoal uma ciclovia nessa avenida da região.

O vereador performático destilando seu ódio sobre uma ciclovia que não incomoda os motoristas em nada. Imagem: reprodução
O vereador performático destilando seu ódio sobre uma ciclovia que não incomoda os motoristas em nada. Imagem: reprodução

Disposto não só a interromper a obra como a reverter a sinalização já implantada, o vereador afirma ter entrado em contato com o prefeito João Dória e com o secretário Sérgio Avelleda que, segundo ele, não sabiam da implantação. Fato é que depois do ataque carnavalesco de Cristófaro, a obra da ciclovia foi interrompida pela gestão.

O vereador é conhecido por fazer campanha contras as ciclovias desde o início de sua implantação, com vídeos que chegaram a render diversas sátiras por parte de quem usa a bicicleta na cidade. A polêmica gerada acabou lhe rendendo votos suficientes para sua eleição a vereador, arrebanhando os eleitores que acreditam que os carros devem continuar tendo seus privilégios e que os motoristas são multados à toa.

Em dezembro, a justiça eleitoral rejeitou suas contas de campanha, requisitando que a Polícia Federal abra inquérito para apurar. A suspeita é que recursos ilícitos tenham sido incluídos em suas contas de forma fraudulenta, por meio de doações de uma doadora que não tinha condições de fazer os pagamentos, de acordo com reportagem do Estadão. Conheça seu histórico aqui.

Novas ciclovias só se empresas aceitarem pagar

Cristófaro seria apenas mais um vereador que não compreende a mobilidade de forma ampla, dando mais um de seus shows no Facebook, não fosse a predisposição da atual gestão em manter suspensa qualquer expansão ou manutenção de ciclovias até que seja definida com clareza a política a se adotar.

Joao Doria pedalada ciclistas outubro 2016 - 062 - Foto Willian Cruz
Dória sorri e posa para fotos em encontro com ciclistas, em outubro. Foto: Willian Cruz

Durante a campanha (e mesmo imediatamente após ser eleito), Dória criticou fortemente as ciclovias, afirmando que não haveria necessidade de ampliá-las e que haviam sido feitas em excesso. Chegou a dizer que ciclovias “prejudicam fortemente o comércio, prejudicam a economia, a manutenção de empregos e a oportunidade de sobrevivência dessas famílias [de comerciantes onde passam ciclovias]”. Em vários momentos comentou que as ciclovias com “pouco uso” seriam retiradas em sua gestão. Chegamos a montar um mapa mostrando que mais da metade das ciclovias corria o risco de ser retirada, de acordo com suas declarações.

Posteriormente, em encontro com ciclistas convocado pelo próprio prefeito eleito (veja vídeos), as declarações foram suavizadas. Seu posicionamento passou a ser o de que as ciclovias são importantes para a cidade e que “o não usuário tem que entender que aquilo é um equipamento também que ele precisa ajudar a preservar, mesmo não usando”. Mas reforçou que não pretende investir em novas estruturas, a não ser que empresas se interessem em financiar essa expansão em troca de publicidade. A manutenção também deve acontecer apenas com dinheiro da iniciativa privada.

Gestão vai revisar plano cicloviário

Consultamos a CET para entender se a ciclovia será continuada ou retirada. O órgão respondeu que a atual gestão está fazendo uma revisão geral do plano cicloviário e que, só depois dessa revisão, poderão decidir se a implantação será concluída ou revertida. Ou seja: a obra ficará parada por tempo indeterminado.

Reservar uma área para proteger a vida de quem circula em bicicleta parece ser uma ofensa mortal em São Paulo. Mesmo sem impactar no deslocamento dos carros. Foto: Willian Cruz
Reservar uma área para proteger a vida de quem circula em bicicleta parece ser uma ofensa mortal em São Paulo. Mesmo sem impactar os motoristas. Foto: Willian Cruz

Entretanto, ainda que apenas cerca de 1 quilômetro de asfalto tenha recebido um início tímido de pintura vermelha, mais de 5 quilômetros de avenida (somando ambos os lados do rio) já tiveram sua sinalização de solo alterada, de forma a reposicionar as faixas de rolamento para que a ciclovia possa ser encaixada na margem esquerda da via. Isso representa custo e esforço para retornar a sinalização à situação original, o que seria, isso sim, um desperdiço de recursos públicos, em contraponto à conclusão de uma estrutura que traria segurança e proteção, ainda que de forma rudimentar na visão dos críticos, a quem circula de bicicleta na região.

Implantada, essa nova ciclovia poderia conectar as estruturas existentes na Vila Mariana (pela rua Rodrigo Vieira), Ipiranga (pela rua Mont’alverne e pela Praça do Monumento) e Vila Gumercindo (rua Santa Cruz). Atualmente, todas essas ciclovias encontram-se isoladas entre si, apesar de próximas.

O Vá de Bike apurou que a gestão pretende conversar com os ciclistas antes de decidir o que fazer com a obra interrompida, além de debater o tratamento que será dado às demais ciclovias da cidade. Essa conversa se daria na próxima reunião da Câmara Temática de Bicicleta do Conselho Municipal de Transporte e Trânsito (CMTT), que ocorre nessa segunda-feira, 6 de fevereiro. Manteremos nossos leitores informados.

Íntegra da nota enviada pela CET

A CET esclarece que a ordem de serviço para a implantação da ciclovia da Avenida Ricardo Jafet foi dada em 29/12/2016, nos últimos dias da gestão passada. A ordem de serviço foi confirmada em 06/01 por um técnico da CET autorizado por um Superintendente que havia sido nomeado na gestão passada e que já foi substituído.

A referida ciclovia não foi submetida à revisão geral do plano cicloviário que está em curso na atual gestão. A continuidade ou não de sua implantação dependerá do resultado dessa revisão.

A SMT reafirma seu compromisso com a mobilidade ativa, com o incentivo ao uso da bicicleta como modal de transporte e, principalmente, com o diálogo na gestão desse plano.

A gestão da malha cicloviária, assim como todas as demais ações da Secretaria de Mobilidade e Transporte, serão precedidas de amplo diálogo e debate com todos os envolvidos.

10 comentários em “Obra de ciclovia comemorada por ciclistas é suspensa em São Paulo

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  2. Eu concordo,pois com as ciclovias teram menos acidentes, poluiçao ambiental,entre outros.
    As ciclovias seram mais eficientes para o consumidor pois ele ira economizar no combustivel e no conserto de automoveis,claro que com esse dinheiro de tintas eles poderiam investir na educaçao,saude etc.

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    1. Rafael, nenhum avanço. Segunda vez que pautamos na reunião da Câmara Temática e o governo não apresenta nenhum encaminhamento, nenhuma proposta. Na reunião de ontem a superintendente de planejamento nos disse “a paralisação foi um pedido do Prefeito e estamos aguardando um posicionamento do gabinete”. Fica, portanto, nossa indignação e continuaremos pressionando pra que ela saia do papel, finalmente. abs!

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      1. Se não houver vontade politica por parte do Dória, essa ciclovia não sai e ainda é capaz dele mandar retirar as existentes se os carrocratas e comerciantes xiitas começarem a reclamar….

        A politica do PSDB nunca foi e nunca será priorizar o modo ativo do transporte. O negocio deles é mais vias para mais carros e só.

        Os 78km miseros km de metrô em 25 anos de PSDB no Estado estão ai para mostrar a “importancia” do transporte publico para eles.

        Já o rodoviarismo…esse resolvem rapidão, vive nova marginal Tietê, entre outras…

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  3. [Comentário oculto devido a baixa votação. Clique para ler.]

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  4. Tem muitos ciclistas que usariam a bicicleta como trasporte se as condições de segurança para os ciclista fossem melhores. Isto pode se lograr oferendo aos ciclistas um canal de uso exclusivo. Os ciclistas sao questionados como se eles tivessem um poder absurdo.
    Lamentável o nível de uma discussão ir tao longe quando nossos filhos tem uma educação pauperrima. É so pintar uma faixa vermelha.
    Parabens novo prefeito,mas governar é ter visao de futuro. “Andarilho, nao tem caminho, se faz caminho ao andar.”
    No caso desse verador, sem comentarios, sobre o tema das ciclofaixas. Mas muito esperto de usar um tema que esta na midia para se publicitar. Para os

    ciclistas sem sorte pois se posicionou-se do lado contrario. Mas nao tem valor agregado para a sociedade e sim para ele se publicitar, para se dar a conhecer, simples assim.

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