Foto: Marcos Santos/USP Imagens

Redução de imposto sobre bicicletas gera polêmica no segmento

Redução da alíquota de importação de bicicletas anunciada pelo governo Bolsonaro sofre críticas de parte do setor

Comemorada pela maior parte dos ciclistas, que veem na medida uma chance de redução do preço das bikes, a redução do imposto de importação de bicicletas anunciada pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) sofreu críticas de parte do segmento.

Anunciada no Twitter do Presidente da República na noite da quarta-feira 17 de fevereiro e publicada hoje (18) no Diário Oficial da União, a resolução do Comitê-Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Gecex) reduzirá a alíquota a 20% até o final do ano.

Estabelecida em 35% desde 2011, a alíquota de imposto será baixada gradativamente ao longo deste ano, com o seguinte cronograma:

DataAlíquota
01/03/202130%
01/07/202125%
31/12/202120%

A mudança vale apenas para bicicletas em si, ou seja, já montadas. Não abrange peças e acessórios.

Bicicletas importadas são comuns no uso esportivo. Foto: Cecilia Bastos/USP Imagens(cc)

Benefícios para o setor

Conversamos com a Aliança Bike (Associação Brasileira do Setor de Bicicletas) para entender os impactos dessa mudança. A entidade representa empresas de toda a cadeia dos setores produtivo, de importação, distribuição e venda, incluindo os segmentos de eventos, ciclologística, mídia e até associações de apoio ao uso da bicicleta.

A Aliança vê a medida como “importantíssima para o mercado brasileiro de bicicletas”, citando quatro aspectos:

  1. vai reduzir preço e melhorar qualidade das bicicletas para consumidores;
  2. vai permitir mais diversidade de modelos de bicicletas, que ficaram inviabilizados com a alíquota de 35%;
  3. vai reduzir o crime por descaminho de bicicletas, vindas especialmente do Paraguai, que bateu recordes de importação de bicicletas que abastecem um mercado paralelo brasileiro. Com isso a União passará a arrecadar mais, com a redução do descaminho;
  4. colocará o Brasil mais próximo das práticas comerciais mais justas, com alíquota mais condizente em comparação com outras nações. Vale lembrar que a alíquota brasileira era a mais alta do mundo.

— Aliança Bike, em nota ao Vá de Bike

Desonerar as bicicletas completas ajuda o consumidor final, mas apenas em parte. Por isso a Aliança Bike também tem trabalhado para desonerar peças e componentes. “A associação já conseguiu a redução da TEC (Tarifa Externa Comum) de câmbios e cassetes, de 16% para 2%, que passará a valer a partir de abril”, conta Daniel Guth, Diretor Executivo da entidade, reforçando que a Aliança também está apresentando “outros 10 pleitos de componentes que não têm fabricação nacional”.

Bicicleta produzida no Brasil, na ciclovia da Avenida Paulista. Foto: Willian Cruz

Preocupação para fabricantes de Manaus

Mas a redução do imposto de importação não agradou todo mundo. Consultamos também a Abraciclo (Associação Brasileira dos Fabricantes de Motocicletas, Ciclomotores, Motonetas, Bicicletas e Similares), entidade que agrega as fabricantes instaladas no Polo Industrial de Manaus (PIM): Caloi, Houston, Oggi e Sense.

A Abraciclo diz ter recebido “com surpresa e preocupação” a notícia sobre a redução do imposto de importação de bicicletas. Afirma que as fabricantes instaladas no PIM “se desdobram para manter os empregos e a produção, diante dos impactos da pandemia e a adoção de rigorosos protocolos de segurança aos seus colaboradores e prestadores de serviços” e que a medida “vem na contramão da necessidade do País em gerar mais postos de trabalho e renda, beneficiando apenas os países asiáticos, principais produtores e exportadores de bicicletas”.

A nota enviada ao Vá de Bike afirma ainda que “a diminuição da alíquota coloca em risco empregos em todo o País, uma vez que existem centenas de empresas que montam as bicicletas através de aquisições de componentes nacionais e importados e, agora, terão concorrência direta dos produtos importados”.

“As empresas vinham negociando com o Governo Federal a necessidade de se reduzir o custo Brasil e, com isso, aumentar a competitividade, paralelamente à adoção de medidas de abertura comercial”, afirma a associação.

Opinião dos lojistas

Conversamos com três lojistas de São Paulo, que comemoraram a mudança.

Para Cleber Anderson, que comanda a Anderson Cycle Roots (antiga Anderson Bicicletas) há 29 anos, a mudança é “muito boa”, porque os brasileiros terão acesso a bicicletas melhores. “O pessoal tá descobrindo o ciclismo e os esportes da bicicleta, principalmente durante e depois dessa pandemia, e muito mais gente passou a pedalar. E o que ainda pode ser melhor é também baixar o IPI das bicicletas, tendo uma alíquota diferenciada em vez de 10%. Isso beneficiaria tanto o que é importado quanto o que é nacional.”

Leandro Valverdes, da Ciclo Urbano, lembra que a alíquota atual estava “no limite permitido pela OMC” (Organização Mundial de Comércio). “E isso em um produto cuja importação deveria estar sendo incentivada, a exemplo de tantos outros. Nestes mais de 10 anos volta e meia contávamos a piada, sem graça, que dizia que a bicicleta no Brasil paga mais imposto do que produtos ‘similares’, como armas, bebidas alcoólicas e cigarros.”

“Uma luta antiga de muita gente do setor, mas em que vale certamente destacar o trabalho capitaneado pela Aliança Bike. Agora o próximo passo é tentar mexer na tributação das bikes elétricas, que apesar de terem uma alíquota de importação menor (10%), sofrem com um IPI de 35%”, aponta Leandro. “Além, é claro, de cobrar que esta queda se reflita no preço de bicicletas importadas daqui a alguns meses.”

Gustavo Astolphi, o Guto da Pedal Urbano, também comemora a medida e diz que ela até demorou demais para acontecer. “São 11 anos que custaram muito para importadores, fabricantes fora da Zona Franca, lojistas e principalmente aos ciclistas”, afirma. “Aumentar o imposto de importação gerou um abismo no mercado nacional para todos que estavam fora da Zona Franca.”

“Também acho importantíssimo que não seja esquecido nesse momento o quanto todos os componentes relacionados a bicicleta no Brasil são caríssimos”, alerta Guto, afirmando que “tiveram aumento na época da implementação da substituição tributária e sofrem de impostos abusivos”.

“Existem diversos outros impostos que são altíssimos, como o ICMS e a própria substituição do ICMS (pago antecipadamente, antes da venda) que oneram demais todo o setor. Uma união de todo o mercado contra essas práticas traria resultados positivos para todos”, completa.

Qual sua opinião? Conta pra gente, ali embaixo nos comentários!

Imposto não seria reduzido automaticamente

Surgiu em certas redes o comentário de que a alíquota voltaria automaticamente aos 20% no final do ano, porque Lista de Exceções à Tarifa Externa Comum tem vigência até 31 de dezembro de 2021. Mas não é bem assim.

Apesar da lista atual ter validade só até o final desse ano, ela será reeditada ainda em 2021, com uma nova vigência. Nesse momento, pode haver ou não alterações. Ou seja: aquela lista enorme de alíquotas não vai simplesmente desaparecer no réveillon. Antes disso ela será substituída por outra.

Enquanto essa revisão não ocorre, alguns códigos de tributação podem ser alterados, conforme a necessidade e dentro de certos limites. Foi o que fez o Governo Federal, através da resolução do Gecex.

2 comentários em “Redução de imposto sobre bicicletas gera polêmica no segmento

  1. Reduzir o Imposto de Importação não deixa de ser importante, mas reduzir comparavelmente o IPI e principalmente o ICMS que é o grande vilão seria colocar o Brasil em par de igualdades com outros países .

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  2. Vejo com bons olhos essa redução de imposto, claro que, conforme comentário de lojistas, falta outros impostos que ainda deixa o valor das bikes muito alto. A associação brasileira é contra, como os taxistas foram contra o UBER! Não quer concorrente, melhore a qualidade sem superfaturar seu produto!

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