Fechem as janelas!
Essa semana comentou-se em toda a mídia televisiva sobre a alta concentração de ozônio no ar “em andares altos”. Na internet, encontrei apenas esta matéria da Folha, se alguém tiver link para alguma matéria da TV me passe que eu coloco aqui.
Pois bem, descobriram que um dos poluentes que os carros soltam, o dióxido de nitrogênio (NO2), reage com o oxigênio do ar, ou com o gás carbônico (não me recordo agora) e gera ozônio (O3). O ozônio é bastante importante lá na estratosfera, onde nos protege dos raios ultra-violeta e tal, mas aqui embaixo, para a gente respirar, não é um bom negócio. E o ozônio gerado aqui fica por aqui mesmo, não sobe até lá para recompor a camada. Ou seja, é mais uma porcaria que sai dos carros, dessas que ferram a vida da gente e levam criança pro hospital.
Até aí, as matérias cumpriram bem seu papel, o de informar. O problema é a desinformação no meio da informação.
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Em algumas matérias que assisti, disseram, que o ozônio se forma “nos andares altos” porque o NO2 reage mais nessa altitude. Isso é um absurdo, mesmo que ele se formasse melhor em altas altitudes, 100m de altura não fariam a menor diferença. Ele acaba se formando mais ali porque há mais luz – não por estar “mais perto” dela, mas porque na rua mesmo, lá embaixo, tem menos luz incidindo, por causa da sombra dos próprios prédios.
Mas ok, vamos considerar isso um detalhe técnico que não muda nada para o telespectador médio, desapegado a detalhes desse tipo.
O maior problema é a recomendação que vi, invariavelmente, em todas as matérias que assisti na TV: fechar as janelas.
Vejam só: temos um problema urgente: a concentração de ozônio no ar está atingindo níveis preocupantes, sobretudo “nos andares mais altos”, onde mora a classe média mais abonada. Precisamos fazer alguma coisa! O que faremos?
Em vez de recomendarem às pessoas que deixem o carro em casa, sensibilizando-as para a qualidade péssima do ar que o hábito de dirigir compulsivamente traz, falam para fecharem as janelas. “O ar lá fora é venenoso, pare de envenená-lo feche as janelas!”
Deveriam, sim, dizer às pessoas para aproveitarem o dia de rodízio para deixar o carro em casa e ir de ônibus; deviam incentivar o uso do fretado por quem mora em outra cidade; deviam pedir que as pessoas dirijam, pelo menos, só até chegar numa estação de metrô e de lá sigam seu trajeto sem poluir; deviam pedir que utilizem menos motos, que poluem muito mais que os carros e mais até que os ônibus, sugerindo que as entregas sejam feitas por bicicletas.
Mas não: que eu mesmo e os outros fechemos todos as janelas em pleno verão, porque no meu direito sagrado de dirigir ninguém toca.
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Eu acho que a discussão que tem que ser colocada logo em pauta é a seguinte: Como acabar com a dependência das economias mundiais da indústria automobilística e do petróleo?
O automóvel particular, mesmo não poluente, é uma apropriação do espaço público. Um espaço que faz muita falta para todos os cidadão, principalmente pedestres e ciclistas, nos grandes centros urbanos.
Me parece desnecessário, a essa altura, falar sobre a indústria do petróleo, a não ser para marcar o ponto de que é uma das maiores responsáveis pela ameaça a vida no planeta. Já estamos morrendo por causa disso de mil e uma formas, direta e indiretamente. Seres humanos, animais, plantas, florestas, corais… Muitas formas de vida se foram para sempre e muitas outras mais desaparecerão…
Ok, mas isso tudo é o tal do “ponto pacífico”, o lugar comum ao qual todos chegamos (ou não?). O que eu acho urgente debater (e se possível colocar logo em prática), é como substituir o petróleo e reduzir drásticamente a utilização de automóveis particulares, sem com isso colapsar a indústria, as economias nacionais e o emprego mundo afora?
Não acredito numa escala progressiva de substituições porque isso, a meu ver, se baseia na dependência de um nível do conscientização local, nacional, mundial que só vejo atingidos quando for muito tarde. Quando as coisas já estiverem muito piores do que estão agora. Não vejo o povo, o cidadão comum, acomodado, descrente, tornando-se um militante da noite para o dia. Os governos e (ou), os cidadãos, só se tornarão maciçamente conscientes a este respeito diante de uma situação tão óbvia, que a reação será quase inútil.
O “sistema”, me parece, só reage à oportunidades para ganhar dinheiro. E “nós” estamos propondo (em última análise), simplesmente a descontinuação (ou redução drástica), da produção em massa de automóveis e da exploração de petróleo.
Estas indústrias controlam uma ampla rede de influência em todas as esferas (municipal, estadual, federal), em todos os países do mundo. Em outras palavras, tem gigantesca capacidade de “sensibilizar” qualquer governo e a opinião pública. Se não houver um caminho a seguir para aqueles que detem tamanho poder (e nenhum escrúpulo, ou objetivo a não ser lucro imediato), e, literalmente dominam nosso planeta, toda ação resultará apenas em um ideal romântico nunca atingido. Isto é, não basta estar certo, é preciso apontar caminhos. Caminhos para todos, inclusive aqueles que agora figuram como “inimigos”(*).
Um abraço,
Fred
(*) – Como alguém bem lembrou esta semana (no BlueBus), em uma reflexão sobre a indústria armamentista, os “inimigos” de hoje eram os amigos de ontem:
“…Nos últimos anos, décadas, a sociedade descobriu que – na maioria das vezes, involuntariamente – alguns produtos poderiam causar efeitos colaterais nao imaginados no começo da produçao. Sim, porque ninguém pode acreditar de fato que, quando alguém resolveu pegar aquele hábito de enrolar o tabaco para produzir uma sensaçao agradável ao “pitar”, industrializar o processo e comercializar o cigarro, sabia conscientemente que estaria produzindo algo que faria mal ao indivíduo. Ninguém pode afirmar que uma empresa que produz cigarros o faz com o objetivo de gerar doença.
Quando alguém perfura um solo, acha petróleo, refina, o faz explodir e movimentar máquinas, nao quer produzir poluiçao. O início do processo pressupoe, entre outras coisas, gerar energia. É este o objetivo da indústria petrolífera e nao a poluiçao….”
Ou seja, não sabíamos que era um monstro, mas agora que sabemos, temos que descobrir como desmonta-lo (conclusão minha).
PS.: O argumento do autor é que justamente, o mesmo argumento, não se aplica à indústria de armas, cujo produto sempre teve a mesma finalidade clara, matar.
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As “dicas” de sempre… Além de se reduzirem a recomendações sem efeito, elas são bastante duvidosas. Deixar as janelas fechadas por exemplo, acho que não é uma boa. Circular o ar seria o melhor a fazer, caso se queira dar uma “dica” de prazo de validade imediato.
Abraços!
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