Motorista, cuidado: uma “fina” pode resultar em morte

Veja nesses vídeos três exemplos de *sustinhos* que poderiam ter virado tragédia. Nunca, mas NUNCA MESMO tire fina de um ciclista. Descubra por quê.

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Rafael Darrouy, o Ciclista Capixaba, publicou tempos atrás um vídeo que mostra a agressividade gratuita de um motorista intolerante. O que se vê, na verdade, é uma “fina educativa” que poderia ter acabado em morte. Mais um pouco e o vídeo deixaria de ser publicado para servir de prova em uma investigação de homicídio.

Rafael circulava em uma das avenidas de sua cidade, na faixa da direita, como manda a lei, quando um motorista buzina para que ele saia da rua. Em seguida passa perigosamente perto – mesmo havendo duas outras faixas, por onde poderia ser feita uma ultrapassagem segura. O trânsito, como sempre, para, e Rafael prossegue com sua bicicleta pela faixa da direita. Poucos segundos depois, o mesmo motorista passa tão perto que o retrovisor chega a tocar o cotovelo do colega.


Há motoristas que, acreditando que a bicicleta não tem direito de atrapalhar seu caminho, resolvem tirar uma “fina” (ou um “fino”, dependendo da região), com o objetivo de ensinar o ciclista a não circular nas ruas. A isso, chamamos de “fina educativa”. Para quem está na bicicleta, a sensação é de ter escapado por pouco da morte.

Pedimos aos amigos motoristas que nunca ameacem um ciclista ou pedestre com o carro, por mais que estejam fazendo um uso inadequado da via.

O tal do susto pode dar errado e a consequência lhe perseguirá para o resto da vida, sempre que você se lembrar do barulho, da cena, do corpo caído no chão.

O que poderia ter acontecido

Rafael demonstrou ter um domínio muito grande da bicicleta, pois conseguiu manter o equilíbrio. Também teve a sorte do toque não ter sido na ponta do guidão, mas em seu cotovelo, o que ajudou a absorver um pouco da energia do contato com a reação de sua musculatura. Por pouco a conduta irresponsável do motorista não causou sua morte.

Quando um carro (ou ônibus, caminhão, moto, etc.) esbarra na ponta do guidão, este se desloca para a frente. Se o ciclista estiver com o peso do corpo apoiado no guidão, que é a situação mais comum, é grande a chance dele se desequilibrar pela ausência do ponto de apoio, caindo na direção do carro. Se não estiver com o corpo apoiado, a situação também é de risco extremo, pois o guidão se moverá com maior facilidade e em maior ângulo: a bicicleta “escapará” do ciclista, levando-o também na direção do veículo que o tocou.

Quando o ciclista cai em direção a um carro que o tocou, há boas chances de um braço ou perna ir parar debaixo da roda traseira. Ainda que isso não aconteça, o ciclista cairá logo atrás do carro, ficando exposto na via aos outros veículos que estiverem vindo atrás. Se o veículo que esbarrou for um ônibus, caminhão ou mesmo uma SUV mais alta, há chances da roda passar por cima da cabeça ou do tronco.

É muito difícil que alguém circulando em bicicleta pela rua caia de repente, principalmente quem já está habituado a esse tipo de deslocamento. E, mesmo que isso ocorra, se o condutor do veículo motorizado estiver a uma distância adequada, o ciclista não irá parar debaixo da roda. A distância de 1,5m, exigida por lei, não é à toa.

Na próxima vez que você ler uma notícia dizendo que um ciclista morreu porque “caiu debaixo do ônibus” ou “colidiu com a lateral do veículo”, lembre-se dessa explicação.

Pedalar no cantinho teria ajudado?

A resposta é um enfático “não”. Um motorista como esse passaria perto do mesmo jeito, estando o ciclista ocupando a faixa ou conduzindo junto ao meio fio. Quando a bicicleta está trafegando muito no canto, a distância de 1,5m se torna ainda mais importante, pois o ciclista não tem área de escape.

Perceba na cena da primeira “fina” que Rafael desloca sua bicicleta para a direita, fazendo uso dessa área de escape – ainda que, talvez, por reação instintiva. Se ele estivesse perto da calçada, quando esse mesmo motorista passasse perto demais ele poderia bater o pedal ou tocar com a roda no meio fio, o que o projetaria para a calçada, causando sérios ferimentos. Perceba que, nesse caso, nem seria necessário o toque do veículo para derrubá-lo.

E se você está pensando que se o ciclista estivesse bem no cantinho o motorista não faria isso, me desculpe, mas está enganado. Quando a bicicleta está bem no canto, quase todos os carros passam perto demais, não apenas os que são conduzidos por irresponsáveis como o desse vídeo.

A bicicleta no canto deixa a faixa livre e convida o motorista a passar por ali. Afinal, o carro cabe naquele espaço e os motoristas estão acostumados a passar por entre outros veículos, pois isso faz parte da dinâmica de deslocamento do automóvel. Eles realmente não percebem o risco que isso representa para quem está numa bicicleta.

Melhor ação nesse caso

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Ao perceber que um motorista vai passar perigosamente perto, estenda a mão esquerda. Isso vai confundir o motorista, que vai tentar desviar, ou desistir da ultrapassagem buzinando atrás de você. Na pior das hipóteses, o retrovisor vai bater na sua mão, o que não irá desequilibrá-lo. Depois disso, deixe o motorista ir embora. Ele provavelmente vai fugir, com receio das consequências legais de um quase atropelamento, como fez o motorista desse vídeo.

Se você estiver num local onde os motoristas estiverem passando perto demais com uma frequência acima do aceitável, você pode “alargar” sua ocupação da faixa estendendo a mão ou posicionando o cotovelo para fora, o que evita que possíveis toques sejam no guidão. Mas se não estiver se sentindo seguro, não se arrisque: vá para a calçada, ainda que isso constitua uma infração de trânsito. É a sua vida que está em jogo.

Se optar pela calçada, saiba que você estará em um espaço que não é seu. Pedale devagar, dê a preferência para quem está a pé, pare sempre que preciso e passe o mais longe possível de idosos e crianças. O ideal mesmo é desmontar da bicicleta e empurrar, mas sabemos que isso se torna impraticável para longas distâncias.

Boletim de Ocorrência

Rafael, fico feliz por nada de mais grave ter acontecido. Mas no seu lugar, faria um boletim de ocorrência contra o motorista, por “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente” (art. 132 do Código Penal). Atenção: não é ocorrência de Trânsito, é crime mesmo, a ser denunciado em uma delegacia.

A autoridade policial tem obrigação de receber a denúncia e fazer o boletim de ocorrência. Caso se negue a fazer isso, estará cometendo crime de prevaricação (retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal – art. 319 do Código Penal). Se isso acontecer, é possível queixar-se ao Ministério Público ou à Corregedoria da Polícia Civil.

Você tem o vídeo como prova. Se não fizer nada, amanhã essa pessoa pode matar alguém – e fugir, claro, como fez nesse caso.

“Eu respeito”

Alguns motoristas que fazem isso propositalmente ainda se escondem atrás de frases como “eu também sou ciclista” e “eu respeito sim”, como nesse vídeo divulgado pelo empresário e ciclista urbano Marco Gomes:


Outro exemplo que poderia ter acabado em tragédia

O vídeo abaixo mostra um caso que ocorreu em El Salvador. Um ônibus passa buzinando e toca no ciclista, que se estatela no asfalto. Segundo a descrição do vídeo, o motorista posteriormente disse que queria apenas “assustar” o ciclista. Ele teve que pagar uma bicicleta nova e perdeu a licença para circular com seu ônibus (lá, os ônibus são de propriedade dos condutores).

Pause o vídeo aos 9 segundos e você verá como o ciclista quase foi colhido pela roda traseira, caindo a centímetros dela. Quando tocou o solo, seu braço por sorte estava apontando para a frente, senão ele o teria perdido. Por muita sorte não aconteceu nada de mais grave ao ciclista. É possível vê-lo de pé no final de vídeo, ainda que mancando pelas dores.


Ajude a tornar as ruas mais seguras, compartilhando esse texto com os amigos que dirigem.

135 comentários em “Motorista, cuidado: uma “fina” pode resultar em morte

  1. Cara, se você quiser, ganha fácil num processo em cima do motorista. você tem vários dias para registrar um B.O. Assim esse palhaço nunca mais vai por a vida de ninguém em risco.

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  2. Sou Guarda Municipal de Trânsito em Blumenau, SC , sou agente ciclista e já vivi essa experiencia algumas vezes, de ter o guidom da bike tocado por retrovisor de carro e em todas ocasiões consegui alcançar o automóvel, aborda-lo e autua-lo no Art. 201, Deixarde guardar distância lateral ao passar ou ultrapassar bicicleta, sendo que, o condutor, desatento, imprudente ou mau intencionado mesmo, ainda pode ser enquadrado simultaneamente no Art. 220 XIII, Deixar de reduzir a velocidade ao passar ou ultrapassar bicicleta. Ai vem alguém dizer que não se pode multar o automóvel por deixar de guardar distância lateral de 1,5 m ao passar pela bike e eu digo, pode sim, pois o CTB não exige que o agente de trânsito especifique a que distância o veículo passou, portanto é subjetivo e eu quando preencho a multa sempre escrevo que o veículo ao passar pelo ciclista chegou a QUASE TOCAR, ou tocar, o retrovisor automóvel no lado esquerdo ou direito do guidom da bicicleta.
    Quanto ao crime de trânsito , Art. 311. Trafegar em velocidade incompatível com a segurança nas proximidades de escolas, hospitais, estações de embarque e desembarque de passageiros, logradouros estreitos, ou onde haja grande movimentação ou concentração de pessoas, gerando perigo de dano:
    Penas – detenção, de seis meses a um ano, ou multa; seria necessário “uma grande movimentação de pessoas” para caracterizar este crime, porém lesão corporal dolosa sim, caso cause um acidente, já se fosse um passeio ciclístico sim, pois o motorista não poderia alegar não ter visto o ciclista.

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  3. Eu sou a favor de que seja feito o boletim de ocorrência contra o motorista. Vai dar dor de cabeça pro cara e ainda pode ser feito um post para que os motoristas agressivos saibam que esse tipo de crime é punido.

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  4. aliás, para quem for ameaçado por ônibus em SP, existe uma página no site da SPTrans para registrar reclamação / denúncia. http://www.sptrans.com.br/sac/solicitacoes.aspx Anote o número de matrícula do ônibus (5 digitos bem grandes pintados na lataria), a linha, o horário e o local.

    Nas duas vezes em que postei reclamação lá, me responderam uma semana ou duas mais tarde informando que os motoristas tinham sido advertidos e encaminhados para reciclagem.

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  5. concordo que o motorista está totalmente errado, 2 vezes, no primeiro vídeo. Mas acho que o ciclista foi imprudente (não que isso signifique que ele merecia a fina!). Eu NUNCA me colocaria de novo na frente de um carro que acabou de tirar uma fina de mim, na frente de um motorista cujo comportamento já é comprovadamente desrespeitoso com o ciclista. Infelizmente, na maioria das vezes também não vale a pena conversar… É reduzir e deixar o cara ir embora. Vai com deus.

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  6. Rafael Darrouy, estou puto com esse idiota que bateu o retrovisor em você. Por favor registre um BO contra esse retardado. O único jeito de educar esse tipo de gente é mostrando que essas atitudes tem suas consequencias, isso foi uma tentativa de homicídio!!! Se algo sério tivesse acontecido ele iria dizer que foi só um acidente!!! Desgraçado!!! Por favor, registre um BO, mesmo que isso dê um certo trabalho. A sociedade o agradece.

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  7. Parabens Willian pela excelente matéria. Os vídeos são assustadores, e, para piorar, um retrato perfeito do que acontece nos grandes centros urbanos em nosso país. Muitos ciclistas já se acostumaram a esse tipo de situação e aprenderam a lidar com ela, mas isso é muito perigoso. Não devemos nunca pensar que isso é normal ou aceitável, e por mais corriqueiro que seja, sempre que possível devemos acionar judicialmente estes criminosos. Atentado contra a vida nào é brincadeira e a punição severa deve servir de exemplo. Quem tiver ou não provas nas mãos, deve comparecer a delegacia para fazer o B.O. É uma questão de vida ou morte para o ciclista ameaçado e todos os outros que podem vir a sofrer este tipo de ameaça um dia.

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  8. Quando aconteceu comigo, de um imbecil tirar uma fina (enquanto pedalava em uma via calma, de bairro, de mão única na faixa da direita) tão grande que me arremessou na calçada, eu não pensei duas vezes; pedalei forte e quando encontrei de novo o carro na via tirei o capacete e dei no vidro traseiro. não recomendo que façam igual, mas esse ai vai pensar duas vezes na próxima….

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  9. Hoje aconteceu algo muito inusato comigo: Um motoboy me tirou uma fina na Avenida JK. Como se isso não bastasse, ele teve tempo para desacelerar e gesticular pedindo para que eu fosse para o canto da pista (sim, estava no meio da faixa da direita conforme a recomendação do VDB). Balancei a cabeça dizendo que não o faria isso, e por fim o motoboy fez um gesto de repreensão e depois acelerou a moto, continuando no seu caminho de cortar os carros no corredor à 80km/h (Modo de dizer, não que tenha feito isso de verdade).

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      1. Pelo street view parece não haver mesmo ciclovia. O que não mudaria, em nada, a culpa do motorista e também não justificaria, em absoluto, a intenção de derrubar o ciclista.

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  12. Olá, sou o Rafael do vídeo. Não existe ciclovia naquele ponto. O que existe ali, é uma calçada e nada mais.
    Naveguem pelo google street view e perceberão que não se trata de uma ciclovia:
    https://maps.google.com/?ll=-20.298882,-40.291943&spn=0.002307,0.004128&t=h&z=19&layer=c&cbll=-20.299066,-40.291996&panoid=0m6jeby23gYOQJRLpb53tw&cbp=12,35.62,,0,18.83

    Pedalo há anos em Vitória e posso afirmar categoricamente:

    Não há ciclovia na região, e sim, UMA CALÇADA e UM CALÇADÃO perto da praia.

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  13. Ontem de manhã, indo ao trabalho, um caminhoneiro (sim! era um veículo de umas 15 toneladas!) me buzinou duas vezes e simplesmente passou por mim gritando “Sai da rua porra!”. Vejamos: 15.000kg vs 130kg. O “passou por mim” significou o retrovisor passando logo acima da minha cabeça e o baú do caminhão a uns 5cm do meu ombro, sendo q eu já tinha recuado os aproximados 80cm q eu guardava do meiofio. Tentei ir para a calçada que estava vazia no momento, mas a bike não subiu e perdi o equilíbrio e fui ao chão. Tive alguns prejuízos na bike, mas nenhuma escoriação grave. O homicida sequer esterçou o volante no sentido contrário. Eu estava na faixa da esquerda de uma via unidirecional com 4 faixas. A mesma te uma “ciclovia” porém estreita e com calçada estreita em plena orla de Salvador. Fica muito cheio, as pessoas fazem cooper na ciclovia, e honestamente, eu prefiro não ter que importunar pedestres ou submetê-los ao risco de colisão comigo. O fato é que animal ao volante tentou me matar, e imagino que ele tenta fazer isso com qualquer pedestre ou condutor de veículo menor, nas situações onde ele se enxergue com “plenos poderes para ditar as regras dele”. Entretanto não vou sair das ruas, pois elas também são minhas, também tenho o direito de trafegar sobre elas com segurança e dignidade. Tomara que não precise morrer no exercício dos meus plenos direitos. Abraços aí pessoal e desculpa o tom de desabafo hehehe.

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