Amplie sua visão sobre o mundo

Mesmo sem perceber, pessoas habituadas a fazerem tudo de carro acabam por ter a visão de mundo (e de si mesmas) limitada, perdendo o senso de cidadania e coletividade.

Recentemente, na lista de e-mails da Bicicletada de São Paulo, o Roberto Bencz disponibilizou essa imagem intitulada “vision”, mostrando de maneira bem simples a diferença de um ciclista:

A arte está inacabada e, segundo o próprio Bencz, “é um rascunho bravo, rústico, bruto e sistemático, indômito. Joguei no grupo para ver se alguém mais talentoso que eu termina ou tem idéia melhor”. Então fica a dica para os artistas que nos lêem. O arquivo original está disponível aqui.

São poucas e cada dia menos, mas ainda existem praças em SP! Foto: Aline Cavalcante

Inspiração

A inspiração para o desenho veio a partir de um relato de descoberta de detalhes do próprio bairro, algo bem comum para nós, ciclistas e pedestres, mas inédito e surpreendente quando falamos de pessoas acostumadas ao carro.

“Minha professora de inglês me contou a história de um conhecido que só andava de carro. Um dia o carro quebrou e ele teve que ir a pé até a padaria (a uma quadra). Na volta da aventura, relatou ter visto uma árvore florida que nunca tinha visto por conta da visão limitada que tem de dentro do carro.”

Apesar do tom de brincadeira do desenho, ele nos revela um fato triste e preocupante. Muita gente não percebe, mas o hábito de fazer tudo de carro – e não conseguir nem cogitar a possibilidade de ficar um dia sem dirigir – limita a percepção de espaço, tempo e tira a sensibilidade das pessoas de notar pequenas mudanças ao seu redor.

E não só as pequenas, mas mudanças estruturais da nossa cidade tais como, árvores a menos, buracos a mais, uma praça que virou estacionamento, uma calçada que deu lugar a pista de rolamento, um terreno que virou lixão, etc.

Em Pinheiros, uma área verde virou prédio comercial, a calçada sumiu e a rua, que era tranquila, já não é mais.

Quando dizemos que a bicicleta é capaz de devolver a cidadania aos cidadãos é exatamente nesse sentido, de reaproximar as pessoas sobre as realidades delas mesmas. Afinal o que é uma cidade senão um ambiente coletivo no qual (con)vivemos e influenciamos diariamente?

Perceber as belezas de um lugar é muito mais fácil quando reduzimos a velocidade e ampliamos nossa visão de mundo. São Paulo é caótica e tem zilhões de problemas, mas isolar-se num carro, condomínio fechado ou em si mesmo não irá resolvê-los. E se nossos representantes têm outros interesses que não o bem estar coletivo, nós, cidadãos, temos o dever de saber o porquê e, principalmente, cobrar por isso.

A cidade é sua! A cidade é nossa!

Vale a leitura

Texto da Raquel Rolnik sobre a ligação entre quem financia uma campanha e as decisões de uma cidade: Financiamento de campanha: para além do champanhe em Paris

Leonardo Sakamoto, também sobre as “doações” de campanha que não são necessariamente boas para a coletividade: Se “investimento” não der retorno, deixa de ser bom?

Artigo do professor João Whitaker, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, sobre o modelo incoerente de urbanismo que vem sendo adotado em São Paulo: Hoje, nosso slogan deveria ser “São Paulo não pode morrer”

6 comentários em “Amplie sua visão sobre o mundo

  1. Mas como vocês querem que as pessoas vejam os problemas das cidades se elas não conseguem nem sequer ver os problemas de outras pessoas???
    Por favor, não me levem a mal.Não estou criticando o texto ou os comentários,mas pensem no fato que as pessoas estão a cada dia mais cegas e egoístas.Pensem no fato que, apesar e egoísta e infantil, as pessoas preferem estar presos em condomínios fechados, e “cegos” dentro de carros, pois assim podem fazer de conta que não existem.
    Vocês não acham que esse mesmo cidadão que só anda de carro não vê o noticiário?É claro que eles sabem que as cidades são um lixo.Mas é muito mais fácil fazer de conta que tá tudo certo e se trancar atrás de um volante do que correr risco de ser atropelado.Mesmo que isso lhe custe seu bom humor e sua saúde.
    Eu acho até possível mudar São Paulo e tantas outras cidades com a bike…Mas será preciso despertar coragem nas pessoas antes, coragem para correr perigo de vida ao sair de casa,coragem para ver a verdade de que a cidade não é só asfalto e avenidas, coragem para encarar o preconceito de pessoas que te acham louco por não querer um carro, coragem para admitir que se é mais feliz com uma bike e um mp3 no ouvido do que com um carro e stress na alma.

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  2. Até mais do que perceber as coisas boas, importante (embora geralmente desagradável) também é perceber as coisas ruins. Somente se precebemos que nossa cidade tem coisas ruins, ou que está piorando em algum aspecto, é que teremos vontade, iniciativa e até indignação suficientes para exigir ou mesmo operar as mudanças que julguemos necessárias.

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  3. Um texto muito bem escrito como sempre, simples, objetivo e profundo. As motoristas não sabem o que estão perdendo justamente por nunca terem experimentado essa sensação maravilhosa de andar de Bike. Estão literalmente na caverna de Platão e é por isso que devemos incentivar o aluguel e uso recreativo antes de tentar “impor” a bicicleta na cidade.

    Imagine a sensação de liberdade e inconformação que um paulista usuário de carro irá sentir ao percorrer um trecho na metade do tempo normalmente feito em horário de pico. Quer melhor propaganda sobre o uso de bike que essa ?

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