Avenida Santo Amaro. Foto: Raphael Igor/CC BY-SA 3.0

SP: Descumprindo compromisso e legislação, ciclovias ficarão de fora de parte dos corredores de ônibus

Justificativa para falta da estrutura em alguns corredores é a existência de ciclovias no entorno, mas elas não são alternativas viáveis aos eixos principais

Com tráfego intenso e agressivo, Avenida Santo Amaro continuará sem ciclovia, obrigando quem depende de seu próprio esforço a dar uma volta enorme. Foto: Simon Plestenjak (cc by-nc-nd 2.0)
Com tráfego intenso e agressivo, Avenida Santo Amaro continuará sem ciclovia, obrigando quem se desloca com seu próprio esforço a dar uma volta enorme – e sem infraestrutura segregada. Foto: Simon Plestenjak (cc by-nc-nd 2.0)

O compromisso firmado pela prefeitura de São Paulo de instalar ciclovias em todos os corredores de ônibus a serem implantados não deve sair do papel em sua totalidade. Em 2013, o prefeito Fernando Haddad (PT) havia prometido construir vias para ciclistas junto a todas as novas estruturas do transporte público. Além disso, a legislação municipal obriga há mais de 20 anos que avenidas construídas ou reformadas na cidade contem sempre com infraestrutura cicloviária – incluindo pontes, viadutos e túneis.

No entanto, três anos depois, alguns dos projetos não contemplam o meio de transporte por duas rodas sem motor. Um deles é o corredor da avenida Santo Amaro, onde é aguardada licitação para obras de requalificação entre as avenidas Juscelino Kubitschek e Bandeirantes.

De acordo com a SP Obras, o local não terá a estrutura porque a malha existente é suficiente para a demanda. “Já existem ciclovias nas seguintes vias: avenidas Brigadeiro Faria Lima, Hélio Pelegrino, Pavão até a avenida Iraí; avenida Rouxinol até a Aratãs; avenida Professor Rubens Gomes de Souza, ruas Alexandre Dumas, Fernandes Moreira, Pires de Oliveira e Maestro Jordão Bernardino de Sene; e Visconde de Taunai”, diz nota da prefeitura ao Vá de Bike.

Outros corredores sem ciclovia

Outros exemplos de descumprimento do compromisso público e da legislação municipal são o chamado Binário Santo Amaro, onde não está prevista a via para ciclistas e também no trecho entregue em fevereiro da avenida M’Boi Mirim, que faz a ligação entre a avenida Vitor Manzini e o Terminal Jardim Ângela, ambos na zona sul.

A atual gestão tinha planos de construir 150 quilômetros de corredores de ônibus, porém parte das construções não avançou por atrasos de repasses do governo federal. A capital paulista deixou de receber verba do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), prometido pela presidente Dilma Rousseff, a fundo perdido.

Ciclovias previstas

Em demais trechos de vias para o transporte público, ciclovias foram integradas nos projetos, como é o caso dos corredores Berrini e Inajar de Souza, os dois já entregues. No prolongamento do corredor da avenida Chucri Zaidan, que está em obras, uma ciclovia de 2,8 km de extensão está prevista, de acordo com a SP Obras.

O órgão da Prefeitura ainda prevê vias para ciclistas junto aos chamados “Bus Rapid Transit (BRT)”, como o caso da Radial Leste assim como seu prolongamento em forma de corredor comum, além da Perimetral Bandeirantes, Perimetral Itaim Paulista, Aricanduva, Capão Redondo/Campo Limpo/Vila Sônia, Carlos Caldeira, Guarapiranga-Guavirutuba, Agamenon-Baronesa, Belmira Marim e Líder/Itaquera.

Estes trechos somam um pouco mais de 120 quilômetros de ciclovias. A SP Obras não dá detalhes dos motivos da exclusão das vias para as bicicletas no trechos mencionados acima, mas diz que está “trabalhando ao máximo para incrementar a malha cicloviária da cidade”.

Justificativa não convence

Por Willian Cruz

Em verde, a Avenida Santo Amaro; em vermelho, as alternativas oferecidas pela SP Obras. Faz sentido?
Em verde, a Avenida Santo Amaro; em vermelho, as alternativas sugeridas pela SP Obras. Faz sentido?

A afirmação de que a Avenida Santo Amaro não precisa de ciclovia por já haver estrutura para ciclistas na região só faz sentido para quem pensa no assunto de forma rasa, argumentando que “há ciclovias demais”, sem sequer considerar sua característica de proteção à vida e facilidade de deslocamento.

E nem é necessária uma análise técnica, basta olhar o mapa. A imagem ao lado mostra, em verde, a Avenida Santo Amaro. Em vermelho, as alternativas oferecidas pela SPObras. Faz sentido? Mesmo se considerarmos como opção a ciclovia da Av. Luis Carlos Berrini, esquecida na justificativa da SPObras, há um aumento de alguns quilômetros no trajeto, dando ao ciclista o ônus de esforço físico adicional e de um aumento razoável no tempo de deslocamento.

Se a avenida não tem espaço para a ciclovia, a solução mais simples e óbvia é transformar uma das faixas hoje destinada aos automóveis em uma ciclovia bidirecional. Outra faixa de automóveis poderia ser retirada para dar espaço a uma ampliação das calçadas, ajudando a proteger e dar vazão aos pedestres, que circulam em grande número em vários trechos da avenida, principalmente pela presença do corredor de ônibus, de faculdades e empresas.

A Santo Amaro é uma via de tráfego intenso e agressivo a quem está fora dos automóveis. Ciclistas já circulam por lá, sendo expostos à possibilidade de atropelamento, sem que o poder público se preocupe em protegê-los. Outros fazem grandes desvios de rota, incluindo inevitáveis subidas, para não correr risco na avenida.

É justo fazer com que as pessoas que se deslocam usando sua própria força física aumentem seu trajeto e se esforcem em subidas desnecessárias para que quem só precisa pisar num acelerador fique com o caminho mais curto? De quem é o maior desconforto ao mudar de rota? Quem deve ser priorizado em seu deslocamento?

E por falar em prioridade, tanto o Plano Diretor Estratégico, que tem força de Lei Municipal, quanto o Plano Nacional de Mobilidade Urbana, que tem força de Lei Federal, determinam que os transportes coletivos e ativos devem ter prioridade no planejamento viário em relação ao transporte individual motorizado. Reformar a avenida sem dar espaço seguro a quem trafega de bicicleta, além de colocar cidadãos em risco direto, é um descumprimento da lei de diversas formas.

Transformar uma faixa dos automóveis em ciclovia não impediria os motoristas de passarem pela avenida, nem mesmo os colocaria em risco. Mas deixar a avenida sem ciclovia para manter a prioridade de circulação dos carros impede, na prática, que pessoas de bicicleta circulem por ali e expõe a perigo quem ainda assim o fizer. Um gestor público que decide conscientemente deixar de proteger os cidadãos que utilizam a bicicleta os coloca em risco indireto e se torna corresponsável por atropelamentos e mortes. Omissão também mata.

10 comentários em “SP: Descumprindo compromisso e legislação, ciclovias ficarão de fora de parte dos corredores de ônibus

  1. Na Santo Amaro não há espaço nem para o que já está instalado lá, quanto mais para ciclovias. Aquela via não suporta mais nada.

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  2. Uma Sugestão seria a Ver José Diniz que fica paralelo a Av. Sto. Amaro é bem mais plano e tem menas subidas

    A Radial Leste tem que a sua Ciclovia mais estendida para o centro, já que a linha 3 vermelha do metrô vive dando problemas.

    E complicado se deslocar de regiões como a do Itaim Paulista pro centro, sem ter que enfrentar muita subida.

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    1. Oloco, a Ver José Diniz comparada a Sto Amaro tem um sobe e desce absurdo, não sei onde que ela é plana! Mas, ok, poderia ser uma alternativa!

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  3. Outro descaso que merece ser abordado, é a escassez de paraciclos na Zona Sul onde eu moro, eu pedalo quase todos os dias e é muito difícil encontrar paraciclos para estacionar a bike, eles existem sim mas são poucos, fico indignado porque quase sempre acabo por prender a bike no poste mesmo, tem bastante ciclovia já por aqui mas.. onde estão os paraciclos?

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  4. Na Zona Sul, poderíamos ter umas das maiores estruturas cicloviárias da cidade, seguindo desde as avenidas Sto. Amaro, Vitor Manzini, Guarapiranga e M’boi Mirim. Não é por falta de espaço, pois em muitos trechos as avenidas foram readequadas/alargadas, onde poderiam ser implantadas as ciclovias. Nem tão pouco, por falta de demanda, pois no Largo do Socorro já foram contabilizados quase 1.000 em contagem realizada pelo Bike Zona Sul e Ciclocidade.

    Assim vamos ficando sem as esperadas ciclovias prometidas nos corredores da cidade. Lamentável!

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  5. O ruim da Av. Santo Amaro é que ela é cheia de subidas e descidas.. eu não me animaria muito se houvesse ciclovia ali.. a topografia não me deixa mentir.. prefiro dar a volta pela Berrini onde a ciclovia faz sucesso por muitos aspectos, um dos principais é o fato de ser plana em sua totalidade

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  6. Gente, OK. Está tudo correto no artigo, não discordo, até pq lei é lei e deveria ser cumprida, mas alguém pode me apresentar um projeto viável de ciclovia na Av. Santo Amaro que não inviabilize o tráfego particular de carros e que portanto não leve ao massacre político da prefeitura? Nós queremos tornar a bicicleta um veículo viável para a cidade ou queremos auto destruir as poucas conquistas que estão aí? Para mim é mais importante a interligação de ciclovias através da conversão de vagas de estacionamento e de faixas em vias largas, do que colocar uma ciclovia na Santo Amaro hoje. É mais fácil “comer pelas bordas” e esperar que o aumento de demanda gere condições políticas para implantar ciclovias nas avenidas que geram mais polêmica. Sejamos um pouco maquiavélicos… 😉

    Comentário bem votado! Thumb up 13 Thumb down 3

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