Por que o ciclista deve ocupar a faixa

Pouco compreendida, prática pode evitar acidentes até com motoristas apressados e irresponsáveis. Entenda por que ela é recomendada por órgãos de trânsito e cicloativistas.

Mantendo a extrema direita, os carros forçam passagem e colocam o ciclista em risco. Ocupando um espaço maior na pista, o motorista é obrigado a aguardar o momento certo para ultrapassar com segurança – e ainda há espaço para fuga.

Pouco compreendida pelos motoristas e mesmo por muitos ciclistas, essa prática pode evitar muitos acidentes, mesmo com os motoristas mais apressados e irresponsáveis. Nosso instinto de sobrevivência nos faz pedalar mais à direita da via, para liberarmos espaço para os carros e evitar que eles nos pressionem, mas com isso acabamos obtendo o resultado exatamente oposto: liberamos espaço para que eles nos pressionem.

Ao pedalarmos muito à direita da via, quase dentro da sarjeta (e ás vezes até dentro dela), o espaço que sobra na pista não é suficiente para fazer uma ultrapassagem segura. Mas os motoristas não percebem isso, a impressão que lhes dá é que o espaço não é o ideal mas “dá pra passar”. É fato que pouquíssimos dão a distância de um metro e meio necessária para a ultrapassagem segura: muitos vão passar entre você e o carro do lado e entre esses vários vão passar muito rente a você, com o risco de esbarrar no seu guidão ou até de te derrubar só com o susto (sim, acontece!).

E o carro que forçar essa passagem geralmente vai dar mais distância do carro que está à esquerda do que de você à direita, por dois motivos principais:

  • Visão: ele tem visão melhor do que está do lado dele, por isso tem uma noção melhor de espaço e consegue evitar melhor uma proximidade com risco de colisão.
    .
  • Sensação de perigo: o carro do lado dele desperta alguma sensação de perigo, principalmente se for um carro grande, o que o influencia inconscientemente a manter uma distância maior. Já o ciclista não desperta essa sensação na maioria dos motoristas, por seu tamanho menor.

Se você ocupar uma porção razoável da pista, o motorista vai ter que colocar pelo menos duas rodas na pista do lado (ou contrária) para poder ultrapassar, o que significa que ele não vai tentar passar entre você e outro carro. Vai fazer uma ultrapassagem mais segura, porque não haverá veículo que limite seu desvio à esquerda e ele se afastará mais.

Margem de segurança

Além de forçar os carros a ultrapassarem com segurança, passando para outra pista, também dá espaço adicional para fugir de fechadas. Ilustro essa vantagem com um exemplo que para nós, ciclistas, infelizmente é corriqueiro: um ônibus te ultrapassa e, em vez de manter a linha reta, vai avançando para a direita conforme aquelas toneladas de metal passam do seu lado, jogando você para a calçada. Se você deixou essa margem de segurança à sua direita, consegue fazer um movimento acompanhando o do ônibus para fugir dele; se não deixou espaço, corre o sério risco de se estatelar na calçada, ser prensado em um carro estacionado ou, pior, cair debaixo das rodas do ônibus.

Com a bicicleta muito rente à margem direita da pista, não há espaço de fuga. Mantendo a linha do 1/3, você mantém espaço para fugir do homicida.

Há mais uma vantagem em andar ocupando melhor a pista. Em ruas onde há carros estacionados, se em vez de andar rente a eles você se afastar mais, terá uma distância suficiente para não levar portadas dos carros parados. Eu já levei uma portada e, acredite, não é nada agradável. E se não mantivesse essa distância, já teria levado várias outras.

A quantidade de pessoas que abre a porta sem olhar é assustadora. Muitos olham e procuram um veículo grande ou um farol potente e acabam abrindo a porta sem ver uma frágil bicicleta (um motivo para usar aquela lanterna branca piscando na frente da bicicleta quando sair à noite). O maior risco de bater numa porta abrindo não é nem a colisão e nem a queda: é cair no meio da pista e um carro passar em cima de você. O risco não é pequeno, pois se você bater a ponta do guidão na porta, ele vai virar bruscamente para a direita e você vai voar para a esquerda, por cima do guidão.

Além de não ser prensado contra os carros parados, você evita as portadas.

Andar na linha do 1/3 da faixa é a melhor solução, porque é menos antipático do que andar exatamente no meio da pista. No meio da pista vão pensar “olha que folgado, acha que a rua é dele”, já na linha do um terço vão pensar “pô, podia ir mais pra lá, né?” – ou seja, parece menos uma provocação. Andar bem no meio da pista infelizmente irrita os maus motoristas, que verão você como um folgado que está tirando o “direito” deles, não alguém em seu direito de ocupar a via, e alguns desses vão te fechar após a ultrapassagem. Andar na linha do 1/3 faz eles pensarem que você está desviando de alguma coisa, que não está mantendo uma linha reta, que não sabe pedalar direito, qualquer coisa, mas não que você está ofendendo o “direito exclusivo” do automóvel sobre as ruas (alguns até vão, tem gente de todo tipo, mas serão menos).

Experimente adotar essa técnica no seu próximo trajeto e você verá que alguns motoristas podem até se irritar, mas passarão mais longe de você. As “finas” serão bem menos frequentes e, quando ocorrerem, haverá espaço para fugir. Se alguém buzinar atrás de você, o que é bem menos comum do que você pode imaginar, faça um sinal pedindo para o motorista esperar e continue no seu espaço: ele vai desistir da espera e vai te ultrapassar, dando mais distância do que se tivesse forçado a passagem com você muito no canto. Seu risco será bem menor.

Mas seja simpático: quando estiver em uma rua onde há muitos carros estacionados e aparecer um respiro maior, sem nenhum veículo ou caçamba parados, vá para a direita e deixe os mais estressados te ultrapassarem. Depois mais adiante sinalize, tenha certeza de que nenhum carro se aproxima em alta velocidade, e retorne com cuidado.

Mas e a Lei?

O que o Código de Trânsito diz sobre essa prática? Estou infringindo alguma lei?

O CTB diz que devemos utilizar o “bordo”, definindo-o apenas como “margem da pista”, sem dizer até onde vai essa margem. Portanto, não estamos infringindo nenhuma lei de trânsito. É importante considerarmos como bordo o espaço suficiente para que tenhamos segurança na condução de nosso veículo.

Por se mostrar eficiente no aumento da segurança do ciclista, a técnica de ocupar a faixa, defendida pelo Vá de Bike desde 2006, chegou a ser recomendada pela Companhia de Engenharia de Tráfego de São Paulo (CET), em rede nacional de televisão, em 2011. A recomendação também faz parte da campanha Respeito Bicicleta, da Prefeitura de São Paulo – assista aos vídeos aqui.

Dicas para o ciclista urbano
1Como se manter seguro

2Pedalando para o trabalho (vídeo)

3Não pedale na contramão

4Ocupe a faixa

5Cuidado com as portas

6O que diz o Código de Trânsito

710 dicas para os dias de chuva

8E se a empresa não tem chuveiro?

97 truques para as subidas mais difíceis

107 cuidados para pedalar de madrugada

11Medo de pedalar nas ruas?
Chame um Bike Anjo!

131 comentários em “Por que o ciclista deve ocupar a faixa

  1. Não sou ciclista, sou apenas motorista, e concordo plenamente com o artigo.
    Todos os dias os motoristas desrespeitam as leis de trânsito com a mesma desculpa nojenta: tava com pressa. Eu trabalho andando pelas ruas p dia inteiro, muita correria, mas a minha correria não pode colocar em risco a vida dos outros. Milhares de pessoas morren no trânsito brasileiro todos os anos por pura negligência. Diariamente veja pessoas invadindo o espaço do outro por pura idiotice, era só esperar passar mais um carro, podia esperar o ciclista chegar no acostamento, podia dar espaço pro pedestre, correu, correu, desrepeitou, xingou, fechou e o sinal tá fechado.
    Falta as pessoas bom senso e tolerância!
    Ciclistas: andem no meio da faixa sim!!! A vida é uma só. Se a lei não proteje com todas as letras façam valer a cidadania. O bom senso deveria vir da prática e não da obrigatoriedade da lei, se assim fosse não teríamos tantas leis contradizentes.
    Apoio e divulgo a causa!

    Comentário bem votado! Thumb up 12 Thumb down 0

    1. Andreia, obrigado pelo apoio! Se houvesse mais pessoas que dirigem pensando dessa forma, o trânsito seria melhor para todos nós: ciclistas, pedestres e até para os próprios motoristas. Um trânsito menos agressivo, mais seguro, com menos mortes e mais amor nas ruas. Obrigado!

      Thumb up 2 Thumb down 1

  2. concordo plenamente com tudo,o problema é que a cultura brasileira com relação a ciclistas no transito é osso parceiro…sou ciclista amador e também uso minha bike para ir trabalhar deixando carro e moto na garagem,a questão é que pra quem não pedala o ciclista é sempre um estorvo…os caras de carro vivem metendo a buzina na gente…cultura e educação lamentaveis nesse sentido

    Thumb up 0 Thumb down 0

  3. [Comentário oculto devido a baixa votação. Clique para ler.]

    Esse comentário não tem feito muito sucesso. Thumb up 1 Thumb down 19

    1. Pelo CTB os veículos maiores são responsáveis pela segurança dos veículos menores… ou seja, você com o seu carro é responsável por garantir a segurança de uma bicicleta (por exemnplo)… hah.. esqueci de falar: os pedestres sempre possuem a preferência absoluta, independente de “estarem certos ou não”… ou se um pedestre estiver atravessando fora da faixa você não irá reduzir e parar o seu carro ?

      Comentário bem votado! Thumb up 6 Thumb down 1

  4. Muito boa matéria. Aqui em Juiz de Fora isso é essencial, principalmente na Av. Rio Branco, que mal há espaço os dois carros, imagine para uma bicicleta e dois carros.

    Thumb up 1 Thumb down 0

  5. instintivamente já faço isto, pois já levei algumas fechadas e realmente esta tática funciona… aprendi tb com um amigo motociclista a ocupar mais ou menos o espaço de um carro nas vias, pois somente assim vc não é prensado ou jogado fora das vias…valeu pele publicação.

    Thumb up 2 Thumb down 0

  6. Primeiro: PARABENS pelo site, é praticamente minha homepage e já me ajudou MUITO pra andar de bike em sp.

    Eu tenho uma dúvida e peço ajuda a vocês ciclistas: em pontes que cruzam o rio pinheiros (no meu caso ponte do jaguaré) qual é a melhor opção? Ir com a bike pelo lado direto pedalando (é mega apertado, subida e minha bike eh dobrável e um pouco mais lenta que as outras, devido ao aro ser pequeno) ou ir pela passarela de pedestres com bike na “mão”. Teria uma alternativa menos complicada? Sempre passo um perrengue ao cruzar essa ponte. Na pista tenho medo de me machucarem e na passarela de pedestres medo de ser assaltada quando ha pouco movimento de peedstres…

    Thumb up 2 Thumb down 0

    1. É, Letícia, as pontes são um dos grandes desafios da cidade, projetadas para atender apenas a quem está em um automóvel e, pior, em forma de alça de acesso. Não há resposta simples para sua pergunta, você deve avaliar as condições de tráfego versus possibilidade de assalto na passarela no momento em que passa.

      Thumb up 2 Thumb down 1

  7. Aqui em Curitiba andar em ruas pela lateral é arriscado;
    Estava pensando em usar uma camiseta com um desenho (bordado ou serigrafado grande) nas costas – da placa de trânsito indicando a distância de ultrapassagem; Por incrível que pareça, ainda existe motoristas que não conhece essa lei e ultrapassa “colado” e reclama pelo fato de nós estarmos no meio da rua;
    Se alguém souber onde posso comprar um camiseta dessas, avise;

    Comentário bem votado! Thumb up 5 Thumb down 0

  8. [Comentário oculto devido a baixa votação. Clique para ler.]

    Esse comentário não tem feito muito sucesso. Thumb up 5 Thumb down 12

  9. Isso funciona bem. E como alguem comentou, andamos mais a direita por medo.
    Minha duvida: Nas pontes (sobre o tiete) e viadutos é proibido transitar? como proceder?

    Thumb up 0 Thumb down 0

    1. Oi, Angelo. Temos o direito de passar nas pontes também – exceto na Ponte Estaiada, cartão postal da cidade, que tem uma placa proibindo. Mas as pontes e viadutos geralmente são perigosos, por serem alças de acesso a vias de tráfego rápido como as marginais. Havendo passagem de pedestres, recomendo seguir por ela, a não ser que sua experiência lhe dê confiança para conquistar seu espaço em meio aos carros. Na dúvida, não se arrisque.

      As pontes da cidade de São Paulo são quase todas projetadas apenas para quem está em automóveis, tornando sua travessia arriscada para ciclistas e pedestres. Isso tem que mudar.

      Thumb up 4 Thumb down 1

  10. tenho muita vontade mas morro de medo de pedalar pela cidade. Moro em Bauru, motoristas muiiito mal educados. Até quando estou dirigindo sinto medo. Respeito muito quem está de Bike.

    Thumb up 2 Thumb down 0

  11. Ocupar é frequentemente necessário para aumentar a segurança. Isso só é possível em rua de baixa velocidade. EM ruas com maior velocidade, isso pode não dar certo devido a alta probabilidade de comportamento agressivo de motoristas. Eu prefiro usar nesses casos uma oscilação prévia que assusta ou sensibiliza o motorista. Provocando desaceleração do motorista e/ou afastamento do motorista quando for possível.

    Emmanuel,
    Blog VItória Sustentável
    http://vitoria-sustentavel.blogspot.com

    Thumb up 0 Thumb down 1

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *