COP28 Dubai

Apesar de praticamente ignorar a Mobilidade Ativa nos relatórios finais, a Conferência do Clima trouxe uma expectativa bastante positiva para 2024. Foto: COP28/Stuart Wilson

Sem destaque na COP28, mobilidade ativa entrará na pauta da COP29

Bicicleta e caminhada continuaram fora das decisões na COP28, mas organização da Conferência do Clima pretende dar relevância à mobilidade ativa no próximo ano

A COP28, realizada em Dubai, manteve a tendência de dar pouca atenção à mobilidade ativa em suas discussões oficiais. O tema só esteve presente graças ao esforço de organizações como Walk21, ECF e ITDP, que conduziram o assunto em eventos paralelos e em uma das sessões principais.

Apesar de sua evidente importância para a redução das emissões de carbono, a mobilidade ativa foi mais uma vez ofuscada pela ênfase contínua em promover a mobilidade elétrica como solução única para o setor de transportes.

Falta de interesse dos governos

A ausência de uma abordagem mais profunda e de uma decisão clara em prol da caminhabilidade e da ciclomobilidade, integradas à estratégia de eletrificação veicular, ressalta a falta de interesse nessas soluções por parte dos governos. As discussões e soluções continuaram favorecendo o transporte individual motorizado, indicando que a Conferência do Clima da ONU pouco avançou nesse tema em todos esses anos. Ou que continua sendo fortemente influenciada pelos interesses da indústria automobilística.

O relatório recente da PATH (Parceria para Viagens Ativas e Saúde), apresentado em um desses eventos, evidenciou a subvalorização global desses modos de transporte nas políticas e Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) dos países. O cenário destaca a urgência de incluir efetivamente a mobilidade ativa nas agendas climáticas globais.

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Relatório da PATH mostra que governos precisam levar mais a sério a mobilidade ativa. Imagem: PATH/Reprodução

Documento Final da COP28: omissão e superficialidade

Lamentavelmente, o documento final da COP28 não faz sequer uma menção de ao uso da bicicleta ou à caminhada como parte das soluções para a descarbornização dos transportes.

A única referência nos relatórios oficiais aparece na Declaração sobre Clima e Saúde, publicada em 2 de dezembro. Porém a citação é apenas superficial, incluindo a mobilidade ativa em uma lista de ações benéficas à saúde.

Reconhecemos a urgência de tomar medidas em relação às mudanças climáticas e de perceber os benefícios para a saúde decorrentes de reduções profundas, rápidas e sustentadas nas emissões de gases de efeito de estufa, incluindo transições justas, redução da poluição atmosférica, mobilidade ativa e mudanças para dietas saudáveis ​​e sustentáveis.

— COP28 UAE Declaration on Climate and Health

Mobilidade Ativa no principal debate sobre transportes

Apesar dos anos anteriores da Conferência do Clima não serem positivos para a mobilidade ativa, a COP28 trouxe sinais de mudança. Enquanto a COP26 previu um futuro com carros elétricos para todos e a COP27 ignorou solenemente a caminhada e a bicicleta, a edição deste ano trouxe otimismo para o segmento. É o que sinaliza por exemplo Jill Warren, CEO da Federação Europeia de Ciclistas (ECF). Ela diz que “a agulha está se movendo”, referindo-se a mudanças em andamento na COP.

Um dos motivos desse otimismo foi a inclusão da mobilidade ativa no principal evento de transportes da Presidência da COP28, em 6 de dezembro, com o mesmo grau de importância de outros modos de deslocamento. A caminhada e a ciclomobilidade foram representadas pela CEO da Walk21, Bronwen Thornton, como uma das oradoras da plenária. Assim como a ECF, a Walk21 integra a PATH, uma coalizão que trabalha em favor dos modos ativos de deslocamento.

Com o objetivo de alinhar os rumos das discussões, a PATH liderou uma carta de demandas aos governos e cidades participantes, unindo organizações de todo mundo. A carta, assinada também pelo Vá de Bike, esclarece a importância dos modos ativos na redução das emissões de carbono, trazendo dados de um relatório recente da PATH. Também faz recomendações e sugestões para que os governos consigam priorizem e invistam na caminhada e no uso da bicicleta.

Mas há um motivo ainda maior para o otimismo do segmento, que veremos a seguir.

Walk21 mobilidade ativa na COP28
Bronwen Thornton, da Walk21, representou a mobilidade ativa na principal discussão sobre transportes. Foto: COP28/Christopher Pike

COP29 trará a Mobilidade Ativa ao debate

O que mais despertou esperança nas organizações voltadas à mobilidade ativa foi um artigo publicado pela Climate Champions Team (CCT). A CCT é uma iniciativa da UNFCCC, órgão responsável pela organização e coordenação da COP, conferindo ao texto o status de entendimento oficial da organização da Conferência.

O artigo destaca a importância da bicicleta e da caminhada dentro do conceito “Evitar-Mudar-Melhorar (Avoid-Shift-Improve). “O foco no setor dos transportes terrestres centrou-se predominantemente no avanço da dimensão ‘Melhorar’, principalmente através da eletrificação da frota de veículos”, aponta a CCT. O texto alerta a urgência de priorizar as dimensões “Evitar” e “Mudar”, reduzindo a necessidade de viagens e facilitando a transição para meios de transporte mais sustentáveis. Além disso, reforça a necessidade de “transferir a mobilidade urbana dos carros para os pedestres, ciclistas e transportes públicos”, recomendando a implementação de mais ciclovias nas cidades e melhorias na segurança, acessibilidade e conforto para os pedestres.

O texto declara três objetivos para os transportes terrestres, sendo um deles garantir acesso conveniente a caminhada, bicicleta e transporte público. E conclui afirmando que esses objetivos servirão como guia para a comunidade global definir “avanços que moldarão o futuro dos transportes sustentáveis”.

Em resumo, o órgão organizador reconheceu que a Conferência do Clima tem atuado apenas para Melhorar o que já existe (eletrificar a frota) e que é necessário avançar muito além disso. Dessa forma, podemos esperar que as discussões da COP29 incluam Evitar viagens (sobretudo com mudanças urbanísticas) e Mudar os meios de deslocamento, promovendo uma transição para transporte público, bicicleta e caminhada.

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Organização da COP reconheceu que apenas eletrificar a frota não será suficiente. É preciso diminuir o uso do automóvel, incentivando transporte público, bicicleta e caminhada. Foto: Dianne Yee (cc)

Esforços da Federação Europeia de Ciclistas

De acordo com a ECF, a mudança de foco na COP28 foi diretamente influenciada por suas iniciativas ao longo do ano. “Durante muitos meses que antecederam a COP28, a ECF participou de consultas do Grupo Temático de Transportes da Parceria de Marrakesh para Ação Climática Global e se envolveu com a Climate Champions Team da UNFCCC, para defender um foco mais forte na bicicleta e referências mais explícitas à ciclomobilidade como uma solução para cumprir as metas do Acordo de Paris”, declara a organização.

Esse contexto enfatiza a importância de organizações e entidades de ciclistas, que representam interesses coletivos da sociedade. Um contraponto importante à influência dominante das grandes indústrias, que frequentemente revestem seus interesses particulares e econômicos com um verniz de preocupação ambiental e social.

A mudança de percepção sobre a mobilidade ativa como parte essencial das soluções para a crise climática ficou evidente com o posicionamento da CCT, indicando um cenário promissor para a COP29. Prevista para 2024 em Baku, capital do Azerbaijão, a conferência sugere uma abertura progressiva para incorporar a ciclomobilidade como componente fundamental nas futuras discussões climáticas globais.

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